Moiani Matondo
Manuel Benedito Diogo é um
cidadão angolano. A Halliburton é uma gigantesca empresa norte-americana do ramo dos petróleos que opera em Angola. Entre os seus mais preeminentes dirigentes encontrava-se o
antigo vice-presidente dos Estados Unidos, Dick Cheney.
Diogo era funcionário da
Halliburton em Angola desde 2006, exercendo as funções de supervisor de
controlo de material. Devido ao exercício das suas funções, Manuel Diogo
contraiu uma grave doença profissional que lhe acarretou uma incapacidade
permanente para o trabalho em 100%. De facto, devido à exposição aos riscos no
local de trabalho, análises médicas preliminares realizadas no início de setembro
de 2007 acusaram a presença no organismo do trabalhador de elevado teor de
metais pesados, nomeadamente cobalto 60 e cádmio.
Tendo contraído a doença no
exercício da sua atividade profissional, a verdade é que a empresa americana
abandonou o funcionário à sua sorte. Desde pelo menos 2008, este vive um
martírio para se tratar e obter alguma compensação pelo mal que lhe foi feito.
A história Manuel Diogo
demonstra duas situações graves. De um lado, temos a justiça angolana, incapaz
de fazer valer os direitos dos seus cidadãos. Começam a ser muitas as histórias
que relatamos, seja de cidadãos angolanos, seja de cidadãos estrangeiros, que
recorrem à justiça angolana, mas não obtêm resposta em tempo útil, ou, quando a
obtêm, não conseguem executá-la. Do outro lado, temos uma empresa multinacional
que, aparentemente, atua como as antigas companhias concessionárias dos tempos
coloniais, em total desrespeito pelos trabalhadores locais.
O certo é que, devido à atuação
incorreta da Halliburton e à falta de atuação da justiça angolana, temos um
homem a sofrer prolongadamente sem qualquer apoio relevante.
Depois de cair doente, Manuel
Diogo recorreu às autoridades angolanas, e foi aconselhado pelo Ministério
Público junto da sala do Trabalho do Tribunal Provincial a contatar os serviços
criminais para mover um processo-crime por «exposição a substâncias tóxicas ou
asfixiantes e radioativas no local de trabalho», por grave negligência, p. e
p.», nos termos do § único do art. 353.º do Código Penal.
Ainda em 2008, foi movido o
processo criminal N7870/08-02. Da investigação efetuada pelos serviços da
Procuradoria-Geral da República, comprovou-se que Diogo não tinha sido
devidamente formado, e que a empresa não providenciara os meios de proteção
adequados (como denso-metro, capacete, bata de proteção contra raios gama e
beta…). O processo foi enviado para o Tribunal Provincial de Luanda em 2009,
mas o procurador responsável recusou-se a fazer a acusação, alegando que tal
seria da competência exclusiva da Sala de Trabalho de Luanda. Embora Diogo
tenha realizado uma acusação particular, o facto significativo é que até hoje
não existiu qualquer avanço no procedimento.
Isto é, entre 2009 e 2018 o
processo-crime ficou parado. Portanto, não houve qualquer justiça para Manuel
Diogo. Obviamente, é de estranhar a forma como um processo é parado e não tem
sequência durante nove anos. Tal facto, por si só, deveria merecer uma
investigação criminal. Há uma clara denegação de justiça que tem de ser
imputada aos responsáveis.
Pelo meio, a Halliburton
enviou uma proposta de acordo no valor de USD 130.000 (cento e trinta mil dólares),
que aliás não teve seguimento. Aparentemente, houve movimentos por parte das
autoridades norte-americanas para eventualmente enquadrarem alguns atos da
Halliburton na lei dos EUA, a qual pune a corrupção em países estrangeiros,
tendo, em 2010, um oficial da Embaixada americana em Luanda (William T. Noone)
intervindo para procurar elementos de prova para tal iniciativa. No entanto,
também nesta frente não houve desenvolvimentos.
A isto acresce que ao nível
cível, embora existam decisões claras dos tribunais, ordenando o pagamento de
salários que Diogo deixou de receber desde Fevereiro de 2007 e o pagamento da
assistência médica e tratamentos devidos (Acórdão do Tribunal Supremo de 16 de
Julho 2014, processo n.º 116 -1730/11, relatado pela juíza-conselheira Teresa
Buta), e sentença executória de 12 de Julho de 2016 (1.ª secção, Sala de
Trabalho, Tribunal Provincial de Luanda, processo n.º 452/14 -A por apenso ao
106/8-A), o bizarro é que a Halliburton não paga nem é sujeita a coação
executiva, porque aparentemente não possui valores nas suas contas bancárias
domiciliadas em Angola, menos ainda quaisquer cativos (património imobiliária, cativos
financeiro ou qualquer título de propriedade automóvel).
Obviamente, é estranho que uma
empresa multinacional que atua em Angola não tenha bens nem património para
serem executados.
Além de tudo, uma empresa com
a responsabilidade social global da Halliburton não deve furtar-se a pagar a um
funcionário que é vítima de doença provocada por ela própria.
Parece que, no passado, a
Halliburton usava um testa-de-ferro chamado Vicente Manuel para pagar os
salários dos seus trabalhadores… uma forma surpreendente de atuar que deve
violar todas as regras contabilísticas internacionais.
A consequência desta história
é que a Halliburton não cumpre os seus deveres legais, e Manuel Diogo está
condenado a viver na indigência, sem tratamento adequado, incapaz de trabalhar,
fruto da inoperância da justiça angolana e do comportamento violentador da
dignidade humana adoptado pela empresa norte-americana.
Título, Imagem e Texto: Moiani Matondo, Maka Angola, 25-8-2018
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