Jonah Goldberg
A resposta reside no fato de
que o fascismo nasceu de um ‘momento fascista’ da civilização ocidental, quando
uma coalizão de intelectuais com denominações variadas – progressistas,
comunistas, socialistas, e assim por diante – acreditou que a era da democracia
liberal estava chegando ao fim.
Estava na hora de o homem
deixar de lado os anacronismos – lei natural, religião tradicional, liberdade
constitucional, capitalismo e coisas assim – e assumir a responsabilidade de
refazer o mundo à sua própria imagem. Havia muito que Deus estava morto, e já
passava da hora de o homem assumir Seu lugar.
Mussolini, um intelectual
socialista durante toda a vida, era um guerreiro nessa cruzada, e seu fascismo,
uma doutrina que ele criou a partir do mesmo material intelectual que Lenin e
Trotsky usaram para criar as suas, foi um grande salto na direção da era da
“experimentação” que varreria para longe todos os velhos dogmas e inauguraria
uma nova época.
Isso era, em todos os aspectos
significativos, um projeto de esquerda tal como entendemos o termo hoje, e
assim era compreendido por Mussolini e também por seus admiradores e
detratores.
Com frequência, ele declarava
que o século XIX havia sido o século do liberalismo e que o século XX seria “o
século do fascismo”. Somente examinando sua vida e seu legado é que podemos ver
em que medida estava certo – e o quanto à esquerda se encontrava.
ΦΦΦΦ
Benito Amilcare Andrea
Mussolini recebeu seu nome em homenagem a três heróis revolucionários. Benito –
um nome espanhol, diferente do seu equivalente italiano, Benedetto – foi
inspirado por Benito Juárez, o revolucionário mexicano que virou presidente e
que não apenas derrubou o imperador Maximiliano, mas o mandou executar. Os
outros dois nomes foram inspirados por hoje esquecidos heróis do
anarquismo-socialismo, Amilcare Cipriani e Andrea Costa.
O pai de Mussolini,
Alessandro, era um ferreiro e um socialista ardente com inclinação anarquista.
Foi membro da Primeira Internacional, ao lado de Marx e Engels, e serviu no
conselho socialista local. “O coração e a mente de Alessandro estavam sempre
cheios e pulsantes de teorias socialistas”, registrou Mussolini. “Suas intensas
simpatias misturavam-se a doutrinas e causas socialistas. Ele as discutia à
noite com os amigos, e seus olhos enchiam-se de luz.” Em outras noites, o pai
de Mussolini lia para ele passagens de O
capital. Quando as pessoas da aldeia traziam os seus cavalos para ferrar na
oficina de Alessandro, parte do pagamento era ouvir o ferreiro despejar suas
teorias socialistas. Mussolini era um congênito agitador das massas. Aos 10
anos, o jovem Benito liderou um protesto contra sua escola por servir comida de
má qualidade. No curso secundário, designava-se socialista, e aos 18 anos, quando
trabalhava como professor substituto, tornou-se secretário de uma organização
socialista e começou sua carreira como jornalista esquerdista.
Não há dúvida de que Mussolini
herdou o ódio de seu pai pela religião tradicional, especialmente pela Igreja
católica. (Seu irmão Arnaldo recebeu o nome em homenagem a Arnaldo de Brescia,
um monge medieval executado em 1155 que era venerado como herói local por ter
se rebelado contra a riqueza e os abusos da Igreja.) Quando Mussolini tinha 10
anos, os padres da sua escola tinham de arrastá-lo para a missa aos chutes e
berros. Mais tarde, como estudante ativista na Suíça, granjeou fama por
regularmente ofender devotos cristãos. Ele gostava, particularmente, de
ridicularizar Jesus, descrevendo-o como um “judeu ignorante” e afirmando que,
em comparação com Buda, era um pigmeu. Um de seus truques prediletos era
desafiar Deus publicamente para que o fulminasse com a morte – se Ele
existisse.
Retornando à Itália como um
emergente jornalista socialista, repetidamente acusava os padres de torpeza
moral, denunciava a Igreja das mais variadas maneiras e chegou mesmo a escrever
um romance popular com cenas de violência sexual chamado Claudia Particella, a amante do cardeal, recheado de insinuações
sexuais.
O desprezo nietzschiano de
Mussolini pela “moralidade escrava” do cristianismo era tão apaixonado que ele
tomou providências para expulsar os cristãos de todos os postos que ocupavam no
socialismo italiano. Em 1910, por exemplo, num congresso socialista em Forli,
ele apresentou e defendeu uma resolução segunda a qual a fé católica – ou
qualquer outra denominação monoteísta – era incompatível com o socialismo,
estabelecendo que qualquer socialista que praticasse uma religião ou mesmo a
tolerasse em seus filhos deveria ser expulso do partido.
Mussolini exigia que os membros do partido renunciassem ao casamento religioso, ao batismo e a todos os outros rituais cristãos. Em 1913, escreveu outro livro contra a Igreja chamado Jan Hus, o honesto, contando a vida de Jan Hus, o herege nacionalista tcheco. Pode-se dizer que ali estavam as sementes do futuro fascismo de Mussolini.
Mussolini exigia que os membros do partido renunciassem ao casamento religioso, ao batismo e a todos os outros rituais cristãos. Em 1913, escreveu outro livro contra a Igreja chamado Jan Hus, o honesto, contando a vida de Jan Hus, o herege nacionalista tcheco. Pode-se dizer que ali estavam as sementes do futuro fascismo de Mussolini.
O segundo grande tema na vida
de Mussolini foi sexo. Aos 17 anos, em 1900, no mesmo ano em que se afiliou ao
Partido Socialista, perdeu a virgindade com uma prostituta mais velha “que
vertia gordura de porco por todas as partes de seu corpo”. Ela cobrou cinquenta
centavos. Aos 18 anos, teve um caso com uma mulher cujo marido estava ausente,
no serviço militar. Disse ele: “Eu a acostumei ao meu amor exclusivo e
tirânico: ela me obedecia cegamente e me deixava dispor dela da forma que eu
quisesse.” Gabando-se de ter tido cento e sessenta e nove amantes ao longo de
sua carreira sexual, Mussolini também era, pelos padrões contemporâneos, um
tipo de estuprador.”
De fato, ele foi um dos
primeiros símbolos sexuais modernos, preparando o caminho para a deificação
sexual de Che Guevara. A celebração propagandística do regime italiano em torno
de sua “masculinidade” tem rendido mil seminários acadêmicos. Inúmeros
intelectuais celebraram Mussolini como o representante ideal da nova era.
Prezzolini escreveu sobre ele: “Este homem é um homem, e destaca-se ainda mais num mundo de meias figuras e
consciências tão descartáveis como gomas-elásticas usadas.”
Leda Rafanelli, uma
intelectual anarquista (que mais tarde dormiu com Mussolini), escreveu depois
de ouvi-lo falar pela primeira vez: “Benito Mussolini... é o socialista dos
tempos heroicos. Ele sente, ele ainda acredita, com um entusiasmo cheio de
virilidade e força. Ele é um Homem.”
Mussolini cultivava a
impressão de ser casado com todas as mulheres italianas. O investimento se
provou rentável quando a Itália sofreu sanções por causa da invasão da Etiópia
e Mussolini pediu aos italianos que doassem seu ouro para o Estado. Milhões
enviaram suas alianças de casamento, duzentas e cinquenta mil mulheres somente
em Roma.
Tampouco eram imunes a seu
charme as senhoras da alta sociedade. Clementine Churchill havia ficado
bastante seduzida por aqueles “belos olhos castanho-dourados, penetrantes”
quando o encontrou em 1926. Ela ficou encantada quando ganhou dele uma foto
autografada como lembrança. Lady Ivy Chamberlain, por sua vez, guardava sua
braçadeira do Partido Fascista como recordação.
Em 1902, quando flertava com
as esposas de outros homens, devia dinheiro, enfurecia as autoridades locais e
estava se aproximando da idade de alistamento, Mussolini achou que seria sábio
fugir da Itália para a Suíça, que era, na época, a Casablanca europeia para
radicais socialistas e agitadores.
Ele tinha duas liras na
carteira quando chegou, e, conforme escreveu a um amigo, o único metal que
soava em seu bolso era um medalhão com a efígie de Karl Marx. Lá (na Suíça) ele se misturou com a previsível
multidão de bolchevistas, socialistas e anarquistas, inclusive intelectuais como
Angelica Balabanoff, filha de aristocratas ucranianos e velha amiga de Lenin.
Mussolini e Angelica foram amigos durante décadas, até que ela se tornou a
secretária do Comintern e ele virou um apóstata socialista, ou seja, um
facista.
Título e Texto: Jonah Goldberg, in “Fascismo de esquerda – a história secreta do esquerdismo
americano”, Editora Record, 2009, páginas 41 a 49.
Digitação: JP, agosto de 2018
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