O comissário europeu Carlos Moedas apoiou o
‘desconvite’ a Marine Le Pen para falar em Portugal, dizendo que «o Web Summit
é a abertura ao mundo, logo todos aqueles que acreditam num mundo fechado não
têm lugar».
José António Saraiva
O jovem comissário não se
apercebeu certamente da contradição em que caiu.
Se a Web Summit é ‘a abertura
ao mundo’, lá deviam caber todas as opiniões, mesmo as hostis ao establishment.
Ora, ao censurar Le Pen, a Web
Summit mostrou só estar aberta a determinadas opiniões, excluindo outras.
É, portanto, um acontecimento
fechado e não aberto, ao contrário do que disse Moedas.
Carlos Moedas [foto] é uma figura
curiosa. Tem emprego em Bruxelas mas
está constantemente em Portugal.
Se calhar, só vai a Bruxelas
buscar as… moedas, e a sua aposta principal é na política portuguesa.
Aliás, chega a parecer um
ministro deste Governo, tantas são as vezes que o vemos ao lado de António
Costa em eventos pelo país fora.
Não é suposto nas democracias
haver liberdade de opinião, cabendo aos cidadãos fazer as suas escolhas – e não
a uma qualquer comissão de censura prévia?
Até porque, a haver essa
comissão, quem a constituiria?
Quem escolheria as pessoas com
e sem direito a falar?
Carlos Moedas, por exemplo,
achar-se-ia habilitado a fazer parte dessa comissão?
E se, em vez de Marine Le Pen,
a WebSummit tivesse convidado o inglês Jeremy Corbyn, qual seria a sua posição?
Concordaria? Discordaria?
O facto de Corbyn ser de
extrema-esquerda mudaria as coisas?
E na mesma linha, pergunto: o
que seria (será) mais desestabilizador para Portugal – um discurso de Marine Le
Pen na WebSummit ou a campanha feita todos os dias pelo Bloco de Esquerda no
país inteiro?
Não é verdade que o BE também
tem um discurso antieuropeu, defendendo que Portugal não devia sujeitar-se à
tirania de Bruxelas (e, até, não devia pagar a dívida)?
Não é verdade que o BE tem uma
agenda que apela à desobediência nas fábricas e à agitação nas ruas, tendo
chegado durante o tempo da troika a apoiar a insubordinação dos agentes da
Polícia que tentaram invadir o Parlamento?
Não é verdade que o BE refuta
certos valores civilizacionais, como o respeito pela vida, ao defender o aborto
e a eutanásia?
Não é verdade que o BE quer
reescrever a nossa História, apelando, por exemplo, a que tenhamos vergonha dos
Descobrimentos?
E não será isto mais
desagregador do que um discurso de meia hora num recinto fechado, por muito
incisivo que fosse?
O BE acusa Le Pen de ser
‘fascista’, achando por isso legítimo proibi-la de falar.
Mas por que razão os
comunistas podem falar mas os fascistas não?
O que os diferencia?
Em 1980, ainda com os ecos da
revolução de 25 de Abril em fundo, Sá Carneiro interrogava-se: «Que motivo há
para a Constituição proibir os partidos fascistas, mas admitir o Partido
Comunista?».
Que superioridade moral tem a
extrema-esquerda sobre os fascistas?
No BE e no PCP há muita gente
que apoiou (e se calhar ainda apoia) Estaline e Mao Tsé-Tung; ora, os dois
juntos carregam muito mais cadáveres às costas do que Hitler e Mussolini.
É certo que não queremos um
Governo fascista.
Mas quem quer em Portugal um
Governo do Bloco de Esquerda?
Diz-se que um Governo fascista
acabaria com as liberdades.
Mas um Governo do BE faria o
quê? Defendê-las-ia?
Pelo apoio à proibição da
vinda de Le Pen à WebSummit, temos a resposta.
Resumindo, podemos dizer que,
nem no respeito pela liberdade, nem no respeito pelas referências históricas,
nem no respeito pelos nossos princípios civilizacionais, há qualquer
superioridade moral da extrema-esquerda portuguesa em relação a Le Pen.
Mas então, por que motivo
Catarina Martins aparece todos os dias nas TVs a discursar, a dizer o que quer,
a fazer a sua propaganda – e Le Pen não pôde fazer sequer um discurso num
evento pontual?
Nenhum homem livre deveria ter
ficado indiferente perante o que aconteceu.
Ora Carlos Moedas não só o
aceitou como foi mais longe e disse que era muito bem feito.
E acrescentou ter «desprezo»
por Le Pen – o que não é muito elegante, sendo ele comissário europeu e tendo
sido ela candidata às eleições francesas, conquistando um terço dos votos,
devendo ainda candidatar-se às próximas eleições europeias.
Ou acha Moedas que a França
também deveria proibir Le Pen de se candidatar?
E, já agora, quererá Moedas um
dia impedir-me de escrever, considerando que pessoas como eu, que defendem a
liberdade de opinião de políticos como Le Pen, não devem ter voz na comunicação
social?
Título e Texto: José António Saraiva, SOL, 26-8-2018
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