É a tal postura leninista. Essa mesma
imprensa tem levado a sério uma CPI comandada por um senador acusado de desviar
quase R$ 300 milhões, e relatada por Renan Calheiros
Rodrigo Constantino
Acompanhei de perto todo o governo Trump aqui dos Estados Unidos. Já estudava sobre política norte-americana faz tempo, e por isso sabia da crescente radicalização da esquerda democrata. Mas o que se viu durante os anos Trump foi sem precedentes. O establishment democrata jogou qualquer resquício de apreço pelas instituições fora, pois era preciso se livrar da “terrível ameaça autoritária”. E fez isso com a cumplicidade da mídia mainstream, que odeia Trump.
Claro que podem existir
fatores distintos que aproximaram pessoas bem diferentes numa mesma cruzada.
Alguns partiram para o ataque por questões ideológicas, outros por disputa de
poder, e um terceiro grupo pode ter agido por aspectos mais estéticos mesmo,
uma ojeriza irracional ao “homem laranja” com cabelo estranho. Criaram até a
expressão “Trump Derangement Syndrome” para explicar a patologia. O fato
é que estavam todos unidos num único propósito: derrubar Trump. E, para tanto,
não mediram esforços.
Eis aí a raiz do principal
problema: a velha máxima leninista de que os “nobres fins” justificam quaisquer
meios. Segura da necessidade de colocar Trump para escanteio, essa turma não se
preocupou em usar os instrumentos menos republicanos nessa caçada. Trump era a
real ameaça às instituições, repetiam com cinismo ou convicção, enquanto
rasgavam as próprias instituições que alegavam defender. Nesses quatro anos, a
democracia norte-americana se enfraqueceu, sem falar do tecido social
esgarçado. E o maior culpado não foi Trump, mas sim seus adversários, seus
inimigos.
Antonin Scalia foi o primeiro
“justice” (o termo usado para os magistrados da Suprema Corte americana)
de origem italiana, apontado por Ronald Reagan em 1986. Era um conservador
originalista, ou seja, levava muito a sério a intenção dos “pais fundadores” ao
legarem a Constituição como espinha dorsal da lei no país que criaram, em vez
de considerarem o documento um “organismo vivo” a ser moldado pelo modismo do
momento, ou pela “voz das ruas”.
Scalia considerava de fundamental importância o “rule of law”, um Estado de Direito em que todos devem responder às mesmas regras. Ele citava em seus discursos um trecho de O Homem Que Não Vendeu a Sua Alma, filme de Robert Bolt sobre Thomas More, em que o santo justifica o benefício legal até para o diabo. A passagem é memorável, pois More faz uma defesa incrível do império das leis dos homens, lembrando que não é Deus para julgar acima delas, e que atalhos ilegais para punir quem se sabe ser uma pessoa ruim põem em risco o próprio arcabouço que protege os inocentes:
“Oh? E quando a última lei
caísse, e o Diabo se virasse para você — onde você se esconderia, Roper, as
leis estando todas abaixo? Este país está enraizado com leis de costa a costa —
as leis do homem, não as de Deus — e, se você as derrubar — e você é o homem
certo para isso —, você realmente acha que poderia ficar de pé contra os ventos
que soprariam então? Sim, eu daria ao Diabo o benefício da lei, para minha
própria segurança”.
Um juiz que nunca decide
contra suas vontades e desejos não é um bom juiz
A grande diferença entre um
juiz como Scalia e ativistas togados é que Scalia tinha a humildade de não se
julgar Deus, um legislador “ungido” ou “iluminado”. Seu papel era fazer valer
as leis, a Constituição, preservando seu espírito. Para mudar alguma coisa
essencial há o devido processo constitucional, as emendas, e isso cabe ao
Legislativo. Um juiz que nunca decide contra suas vontades e desejos não é um
bom juiz, pois ele não está ali para impor sua visão de mundo.
Que inveja de um povo que teve
alguém como Scalia como ministro da Suprema Corte! Compará-lo aos pigmeus
morais que ocupam nosso STF é compreender o abismo institucional que separa os
Estados Unidos do Brasil. Em nosso país, ministros (que nunca foram juízes)
indicados por uma quadrilha criminosa agem como políticos, ativistas,
militantes, adversários do governo federal, tudo, menos juízes. Parecem
dispostos a rasgar a Constituição em pedaços para proteger aliados e perseguir
inimigos. Atuam com incrível frequência ao arrepio das leis, isso numa Corte
constitucional que deveria ser a guardiã de nossa Carta Magna.
Diante de tantos abusos de
poder, boa parte da nossa imprensa se cala, finge haver uma normalidade
institucional em curso ou até aplaude o puro arbítrio desses ministros. Tudo
porque o alvo é Bolsonaro, e eles detestam o presidente, ou defendem interesses
obscuros. Um desses “jornalistas” chegou ao ápice de, elogiando uma decisão
esdrúxula do ministro Barroso de incluir o presidente no inquérito ilegal
de fake news, chamado de “inquérito do fim do mundo” por um colega
supremo, afirmar: “O voto não salva uma democracia. O que salva uma democracia
é sua capacidade de expurgar golpistas. É preciso afastar Jair Bolsonaro do
Palácio do Planalto e torná-lo inelegível”.
É a tal postura leninista.
Essa mesma imprensa tem levado a sério uma CPI circense comandada por um
senador lulista acusado de desviar quase R$ 300 milhões, e relatada por Renan
Calheiros, recordista de inquéritos por corrupção. Nesta semana Renan, num
embate direto, disse a seguinte pérola: “Eu sou o relator, eu produzo a
prova!”. Mas nossos jornalistas tentam levar até Renan Calheiros a sério, pois
serve como instrumento contra Bolsonaro, que seria ainda pior, mais “perverso”.
A turma nunca checa as premissas: estão cegos por ódio ou interesses, e vale
até fazer pacto com o Diabo para tirar Bolsonaro de lá.
“Quando a imprensa passa a
operar como mero repassador de notas explicativas das instituições estatais,
não é mais imprensa. Trata-se de órgão de propaganda do regime”, constatou
Leandro Ruschel. Nesta quarta tivemos a denúncia gravíssima, com provas, feita
pelo presidente Bolsonaro, da invasão do TSE por um hacker, o que
derruba a narrativa de “urna inviolável”. Qual foi a postura da imprensa?
Tentar abafar o caso! Ruschel comentou: “Jornalistas estariam, neste momento,
em busca de mais detalhes e informações sobre o ataque hacker. Em
vez disso, estão operando para defender o sistema. Não são jornalistas, mas sim
militantes políticos, atuando de forma coordenada para mentir e defender
o establishment”.
É um jeito muito estranho de
lutar para preservar nossas instituições e democracia. Não descarto a hipótese
de que muitos estejam convencidos sinceramente do perigo que Bolsonaro
representaria para nossa democracia, em que pese serem incapazes de apresentar
as evidências ou indícios. Até aí é uma questão mais ideológica ou subjetiva, e
todos têm direito à sua opinião. Mas não têm direito aos seus próprios fatos!
Estes são objetivos, independem de nossa vontade. E os fatos mostram claramente
que é o próprio STF, em conluio com boa parte da imprensa, que atenta contra
nossas instituições. O principal problema é se convencer de que esses “desvios”
são necessários para o “bem geral”, para um “fim nobre”, para uma “causa
maior”. Vão “salvar” nossa democracia destruindo-a…
Título e Texto: Rodrigo
Constantino, revista Oeste, nº 72, 6-8-2021
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