Alberto Gonçalves
Com a greve a decorrer, o dr. Costa
imaginou que ficaria bem no papel de Churchill, a decidir os destinos da Terra
a partir dos “war rooms”. Imaginou mal.
1. Não tenho grande
simpatia pelo ato da greve, nem grande compreensão pelo respectivo princípio.
Se uma pessoa não se sente devidamente recompensada no “seu” emprego, é livre
de procurar outro. Até porque, delírios marxistas e legislativos à parte, o
“seu” emprego depende do interesse do empregador, seja este público (valha a
verdade, o empregador público está sempre interessadíssimo) ou privado. Dito
isto (também não tenho grande estima pela expressão “dito isto”), não comento
as razões dos motoristas de camiões com combustível, dos sindicatos dos
motoristas e dos patrões dos motoristas. Apenas informo que detesto gengibre, e
que nem por isso sonho em prender as criaturas que o produzem (aquilo produz-se
ou nasce feito?).
2. Com semanas de
avanço, um secretário de Estado qualquer já apelava ao abastecimento dos carros
e ao pânico geral. Ao antecipar a possibilidade de greve, o governo conseguiu
antecipar os efeitos da dita: dois ou três dias antes da data marcada já havia
postos sem combustível. O socialismo não é só má-fé, saque, corrupção,
dissimulação e demagogia: em situações sérias, também exibe uma considerável
dose de incompetência. Para o ano, desculpem a analogia e o agouro, o PS vai
prevenir os fogos através da terraplanagem das florestas.
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Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa |
4. Cada uma no seu
estilo próprio, as reações dos partidos à crise dos combustíveis foram um
mimo. A extrema-esquerda provou pela enésima vez na História o gigantesco
embuste do seu “humanismo”. O PCP, aflito com a perda de protagonismo a que a
aliança parlamentar o forçou (hoje a CGTP é um gatinho amestrado, e não tarda o
sr. Arménio tem de procurar – o diabo seja cego, surdo e mudo – trabalho), já
aparece a condenar greves de forma explícita. O BE, com a vasta hipocrisia a
que nos habituou, finge levemente discordar da requisição civil para concordar
com o PS e apelar à concórdia universal – ou, como disse a dona Catarina durante
os incêndios de 2017, “que venha a chuva”, para o BE escapar entre os pingos. O
CDS, coerente com o CDS remoto (o actual não se sabe o que é), aproveitou para
recomendar uma revisão da lei da greve que ninguém aprovaria. E o PSD
aproveitou para não dizer nada, ou quase nada. Parece que o dr. Rio, ou alguém
por ele, avisou que o PSD não se mete em polémicas. Este PSD, acrescento, não
se mete sequer em políticas. Talvez a nova direcção tenha decidido transformar
o partido num centro de reflexão, onde se pensa o sentido da existência e as
melancias sem sementes. Não sei. Sei que, a continuar a pairar acima da suja
realidade, o PSD arrisca-se, a partir de outubro, a deixar de ser visto sem
ajuda de um telescópio.
5. O prof. Marcelo
falou em três ocasiões sobre a greve. Da primeira, esclareceu que atesta o
depósito após cada viagem. Da segunda, ameaçou os motoristas com a ira popular.
Da terceira, tipicamente de cuecas na praia, garantiu que não faria
comentários. Eu tinha alguns comentários a fazer. Infelizmente, o artigo 328 do Código Penal promete cadeia para quem injuriar o presidente da República.
Dado que o prof. Marcelo é o presidente desta república, opto pelo silêncio.
6. Os “media”
serventuários do poder procederam à glorificação do governo, à condenação dos
grevistas e à destruição de carácter do porta-voz do sindicato (“é de
desconfiar muito de quem confia na liderança do advogado Pardal Henriques”,
escreveu o diretor de um falecido diário, conhecido por confiar na liderança
do eng. Sócrates e, hoje, na do dr. Costa). O Observador descobriu que o
porta-voz dos patrões dos motoristas é um moço de recados de PS, que lhe
retribui com nomeações e “fundos” públicos.
7. O caminho para a
Venezuela, anunciado em finais de 2015, não se faz de um dia para o outro.
Conforme reza um cliché “poético”, tão repulsivo que quem o repete devia ser
flagelado com um varapau, o caminho faz-se caminhando. E as longas caminhadas
de socialistas e comunistas já mostram avanços notáveis. Para já, dois
motoristas foram notificados (ou detidos?) pelo crime de desobediência, e a
tropa viu-se convocada a tomar partido e auxiliar empresas privadas. É uma
amostra do que acontece quando o socialismo do dr. Costa pressente sarilhos e
passeia autoridade. É natural que nos estados democráticos o Estado tenha o
monopólio da violência. Não é natural nem democrático que o PS tenha o
monopólio do Estado.
Título e Texto: Alberto
Gonçalves, Observador,
17-8-2019
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