domingo, 9 de maio de 2021

[Aparecido rasga o verbo] Mamãe

Aparecido Raimundo de Souza

DE REPENTE VOCÊ foi embora e, no lugar da sua presença marcante, da sua alegria infinda, um vazio incômodo e imensurável veio de mudanças para ficar aqui ao meu lado, para sempre. Um vazio de proporções ilimitadas, destes que não se preenche, que não se completa, que não se consegue ver onde começa ou termina.


Tudo ao meu redor se abriu num oco medonho, como uma ferida teimosa em persistir molestando e não cicatrizar. A sua ausência, acredite, não tem médico, nem receita, tampouco bula para se ler e procurar entender se o remédio será bom ou ruim.

Qualquer clínico, por mais especialista que seja na sua área, não me dará a solução plausível para este mal medonho que me assola, me consome e me definha. A sua partida, assim, do nada, sem mais nem menos, deixou uma aniquilação intransigente, como um corpo sem vida jogado em meio do asfalto enegrecido.

Até agora, desde a sua viagem sem volta, não consegui me achar, nem enxergar um atalho salvador, por onde pudesse voltar sem imprimir delongas e reavivar a imensidão que se fez faminta dentro de meu peito demolido e laceradamente frangalhado.

Sequer deixou um adeus, um até breve, uma palavra tênue, fina e grácil que, escapasse da sua boca e viesse acalmar meus medos enfermos e combalidos, mórbidos e vacilantes.


Você se foi como uma princesa numa fascinação explodindo amenidades. Partiu do nada e se apagou como se um vento forte castigando um fraco lume bruxuleante de uma pequena vela acesa se dissipasse.

A sensação térmica que alimento até agora, dentro do meu ‘eu’ interior, a cada minuto que passa, não condiz com o que está além da minha porta da sala. Em outras palavras: aqui dentro você se fez luz divinal, fogo ad aeternum, enquanto, lá fora, o que se me assemelha extasiante e pitoresco, me entristece o rosto e me deixa finitamente limitado.

De roldão, um frio gélido cresce dentro de mim como uma brevidade folheando meus dias a serem vividos. As janelas do meu agora, se fecharam, as portas do meu oculto se entupiram de tramelas e aldravas. Me sinto, desde então, preso e atado a um retrocesso que esboça novos momentos que me levam cada vez para mais longe do meu sossego.


Acho, inclusive, que jamais voltarei a ser eu mesmo dentro de uma paz que me faça seguir de cabeça erguida. Ainda sinto o seu rosto calmo, a sua voz harmoniosa, os seus receios de partir definitivamente sem ter feito tudo o que gostaria. E eu sei que você não realizou todos os seus desejos, mesmo aqueles que pareciam de somenos importância.

Ainda agora ouço também —, veja que engraçado —, ainda neste momento sinto o seu canto baixinho, a sua paciência enquanto brinca com a Mel, a (cachorrinha que até o derradeiro suspiro esteve a seu lado) como uma amiga e companheira semelhada à um anjo de guarda e, como tal, se negava a deixa-la nos momentos mais cruciais.

Tropeço constantemente em suas saudades notadamente naquelas mais tresloucadas. Nestes momentos, caio e me levanto, volto a me sujar no pó das estradas (outras logo adiante) pelas quais careço passar todos os dias.

Entretanto, sempre com aquela sufocação branda da sua falta bárbara, a mesma que me abraçará, quem sabe (quando terminar meus dias por aqui) visando, talvez, para eu não me sentir esquecido ou rejeitado, abandonado e só, em alguma esquina qualquer deste pedaço frio de chão.


Apesar dos pesares, sigo em frente. Avanço a sonhar, deliro, por vezes, em horas alternadas, reavivando seu calor, reacendendo junto aos meus instantes aqueles que se eternizaram quando você estava ao meu lado...

Talvez, quem sabe, eu me perpetue com seu fulgor, me fazendo crer na dádiva da recompensa divina —, aquela que trará (não sei os motivos) você revivida no vigor e um amanhã que eu sei, logo despontará esfuziante.

Título, Imagens e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, do Sítio Shangri-La - ES/MG, 9-5-2021 

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