Posso estar muito
enganado, mas parece-me que temos em Portugal um excesso de opinião e um grande
défice de informação, falamos de muita coisa, e não sabemos nada. Mas temos muita
opinião.
Temos telejornais infindáveis, que acabam por dar todos as mesmas notícias, enviando apressadamente para o terreno jovens jornalistas verdes e carregados de boas intenções, mas com falta de experiência e segurança, para ir ao sítio certo, na hora certa, colocar as questões certas às pessoas certas. Assistimos a verdadeiras maratonas de jornalistas a correr atrás uns dos outros, numa espécie de histeria coletiva, pois o que move as redacções é o pânico de deixar a concorrência ficar com a notícia da primeira página. Infelizmente, nesta corrida parece que chegam todos à meta ao mesmo tempo.
E é por isso que mudamos e
mudamos de canal, e parece que estamos sempre a ver o mesmo. E isto durante
horas e horas. Há um fogo em Oliveira da Serra e lá vai a habitual procissão de
carros, câmeras e repórteres, fazer as mesmas perguntas e mostrar as mesmas
imagens. E isto durante horas e horas, dando a entender que enquanto houver
fumo, continua a haver notícia.
Mas não tem necessariamente de
ser assim. Existe “caça” para todos, não podem é ir todos atrás das mesmas
lebres. Para haver boa comunicação social são precisos patrões com dinheiro e
jornalistas com coragem e talento.
Infelizmente, nem uns nem
outros abundam neste jardim à beira-mar plantado. Não há publicidade porque a
circulação é minúscula, a circulação é minúscula porque a qualidade é miserável
e a qualidade é miserável porque não há dinheiro, e voltamos outra vez ao
princípio. Aqui temos a verdadeira da pescadinha de rabo na boca. E é por isso
que a nossa imprensa usa e abusa dos chamados artigos de opinião, que são na
sua esmagadora maioria gratuitos.
Tirando meia dúzia de oráculos com créditos firmados e uma legião de seguidores, todos os outros, incluindo a minha pessoa, escrevem de borla, contentando-se com ver o seu nome impresso no jornal. É uma espécie de pastilha elástica para o ego.
E depois, venha alguém que
pague o papel, dono do jornal, claro. Informação bem dada, clara, comestível,
com infografia simples e elucidativa, retratando a situação numa perspectiva de
“ontem-hoje-amanhã” custa caro.
“Esta casta de cabeças pensantes alimenta-se a si própria, ora com
elogios gordurosos e desnecessários, ora com insultos ligeiramente venenosos e
rasteirinhos”
Façam essa experiência.
Comprem o “Público”, o “DN”, o “Expresso”, o “Sol Nascente” e vejam a pouca
informação e a quantidade de artigos de opinião que vão encontrar. É
assustador. Mais de metade dessas opiniões são irrelevantes, e muitas vezes
completamente desinteressantes. Não acrescentam, não perturbam, não ferem, não
assustam, não provocam, apenas adormecem. E como se não bastasse, esta casta de
cabeças pensantes alimenta-se a si própria, ora com elogios gordurosos e
desnecessários, ora com os insultos ligeiramente venenosos e rasteirinhos.
Em comum têm o facto de irem
todos a correr ao quiosque comprar o jornal, assim que ele sai, achando que com
a sua opinião vão mudar o mundo. Que maravilha, somos famosos e importantes.
Mas o mundo continua igual e o sol continua a nascer e a pôr-se no mesmo ponto
cardeal. Mas que grande ilusão.
Se morrermos hoje, depois de
amanhã, ninguém se lembra de nós. Como dizia alguém há muitos anos: “o jornal
de hoje embrulha o peixe de amanhã”. Os artigos de opinião, esses, nem precisam
de ser embrulhados para serem esquecidos.
E como não convém cobrar por
algo de que gostamos e queremos fazer, a coisa lá vai andando. Não quero ser má-língua,
mas custa-me a crer que seja caso único.
Individual ou coletivamente,
na rádio ou televisão passa-se o mesmo. Arranja-se um tema simpático ou
polêmico, põe-se meia dúzia de carolas a dar sentenças, alguém grava e põe no
ar e depois chama-se a esta conversa de café, debate público, mesa-redonda ou
qualquer outro nome sonante. Os participantes saem do estúdio com a sensação do
dever cumprido, o povo vai para a cama a pensar que o deixaram espreitar para
dentro do poder e os patrões alegram-se com o tilintar de mais algumas
moedinhas no fundo dos bolsos, fruto de uma audiência que supostamente se
mantém fiel.
Jornalistas com espírito de
curiosidade, que saibam “meter o focinho onde não são chamados”, que juntem
factos e contem histórias bem contadas, não abundam e por isso são pagos a peso
de ouro.
Tudo isto se passa em Portugal e lá fora, com a desvantagem de que muito
provavelmente o pedreiro irlandês chega a casa, abre uma Guiness, vê um
telejornal de dez minutos seguido de uma boa reportagem, que explica de forma
clara, isenta e fundamentada, algo do que se passou nesses dez minutos.
Nós temos telejornais de duas
horas, que nos deixam impotentes, revoltados e frustrados.
E assim, alegre e
inconscientemente lá vamos jogando na terceira divisão cultural da Europa,
alimentados pelos golos do CR7 e pelos “selfies” do professor Marcelo.
Precisamos de uma revolução
cultural “de alto a baixo”, se possível com um canal público que não se
preocupe com as audiências, mas que esteja genuinamente empenhado na
recuperação do tempo perdido.
Título e Texto: Otto Czernin, o
Diabo, nº 2317, 28-5-2021
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