sábado, 19 de março de 2022

O patriotismo seletivo dos Democratas

Os conservadores querem defender o Ocidente justamente pelo que ele representa para o mundo: conservar o legado ocidental de liberdade

Rodrigo Constantino

São os democratas mais esquerdistas e radicais que, normalmente, gostam de queimar bandeiras norte-americanas. Foram eles que demonizaram a América quando o governo Bush invadiu o Iraque, quase tomando o partido do inimigo. São eles que apoiam atletas milionários da NFL que resolvem se ajoelhar durante o Hino Nacional, em protesto contra a nação. O Project 1619 partiu de jornalistas do “liberal” The New York Times para “reescrever a história” da América como um rastro de racismo e opressão. Enfim, vem da esquerda democrata certo ódio aos Estados Unidos e ao que o país representa para o mundo: um farol da liberdade e o ícone do individualismo.

Não obstante, descobrimos vários patriotas extremados dentre os democratas agora nessa invasão da Ucrânia pela Rússia. Gente como Whoopi Goldberg [foto], que já saiu do “castigo” de duas semanas após chamar o Holocausto de “coisa entre brancos”, tem pedido até a prisão de quem não está demonizando a Rússia ou oferecendo apoio irrestrito ao governo Biden em suas medidas solidárias ao governo ucraniano. Comentaristas democratas querem ver Tucker Carlson, da Fox News, atrás das grades por traição, e insinuam que ele pode ser um agente de desinformação bancado por Putin. É tudo bem estranho! 

Afinal, os Estados Unidos nem sequer estão diretamente no conflito. Os ucranianos queriam até mais: demandam caças pela Polônia, que o governo Biden tem se recusado a enviar para não provocar demais o Kremlin. Alguns conservadores apontam para a existência de laboratórios químicos espalhados pela Ucrânia que teriam financiamento norte-americano para estudos com ganhos de função, e senadores como Mitt Romney, o mais democrata dos republicanos, chegaram a chamar essa preocupação de irresponsável e antipatriótica nesse momento. Oi?

É perfeitamente compreensível discordar do ponto de vista de Tucker Carlson [foto] nessa guerra. Eu também acho que ele tem “passado pano” demais para a agressão russa, no afã de denunciar o globalismo ocidental. Muitos “conservadores” acreditaram mesmo que Putin era um deles e que estaria desafiando o decadente Ocidente dominado pelo “progressismo”, para resgatar valores perdidos. Balela, claro! Putin explora o cristianismo ortodoxo do povo russo e joga para a plateia, mas na prática quer usar mercenários árabes para matar cristãos ucranianos, que alimentam o sonho de ser europeu e defender sua soberania nacional. 

Putin é o oposto do que o conservadorismo ocidental representa, com sua defesa rigorosa das liberdades individuais, do império das leis, do Estado de Direito, da sacralidade da propriedade privada e da liberdade de expressão. Putin é um autocrata imperialista, um invasor, alguém que cala na marra a mídia. Os conservadores têm todo direito de apontar para a destruição de valores ocidentais pela esquerda “progressista”, mas Putin não é a solução, nem de perto.

Daí a chamar Tucker Carlson de traidor ou agente russo vai uma longa distância! Por que, então, os democratas estão tão zelosos de um falso patriotismo repentino, demandando irrestrito apoio às políticas do governo Biden na Ucrânia? Só há uma explicação plausível: a mentira do tal conluio russo com Trump, que a esquerda martelou por dois anos, movendo mundos e fundos para tentar provar, em vão, sua tese conspiratória. Ou seja, os democratas estão tentando resgatar uma narrativa furada de que os republicanos são aliados de Putin, e com isso manchar sua reputação em ano eleitoral.

Só isso explica gente que cospe tanto na trajetória norte-americana virar, da noite para o dia, um patriota tão fanático a ponto de clamar pela prisão dos “dissidentes” que não estão apoiando incondicionalmente uma oposição ferrenha contra a Rússia de Putin. Obama foi aquele que disse que acreditava na excepcionalidade da América, como também na da Grécia, da Itália etc. Ou seja, se todos são especiais, então ninguém o é. Obama queria mudar “fundamentalmente” a América. Isso é coisa de quem ama? Desejar alterar a essência da coisa amada? E são os democratas, agora, que exigem a russofobia geral, caso contrário não passam de espiões infiltrados pela antiga KGB? Seria isso o “macarthismo do bem”?

Talvez esses democratas “patriotas” devessem ler o que um conservador de verdade, como Dennis Prager [foto], pensa sobre o assunto. Prager escreveu uma coluna em que questiona qual o interesse para a América nessa guerra. Na esquerda, “interesse da América” já é algo considerado essencialmente um termo chauvinista, nacionalista e até fascista, diz o autor. Se a esquerda estivesse preocupada com o que é do interesse dos Estados Unidos, não defenderia — e, sob o presidente Joe Biden, implementaria – fronteiras abertas. Não é do interesse da América permitir que milhões de pessoas entrem ilegalmente nos Estados Unidos. 

Se a esquerda estivesse preocupada com o que é do interesse dos Estados Unidos, não defenderia — e, sob Biden, implementaria — políticas para transformar a América de um país independente de energia em um país dependente de energia. Se a esquerda estivesse preocupada com o que é do interesse da América, ela não defenderia mentir para sua juventude dizendo-lhes que a América é sistematicamente racista, que foi fundada em 1619, que lutou contra a Revolução para preservar a escravidão e que os “pais fundadores” eram imorais e racistas. Não defenderia a redução de recursos dos departamentos de polícia. Não teria defendido privar as crianças da educação por dois anos por conta da pandemia. Prager conclui: “A esquerda em todos os lugares despreza a América. E a esquerda norte-americana não é exceção. A maioria dos liberais ama a América, mas vota na esquerda. Então, o amor deles é irrelevante”.

Não é uma defesa de enviar tropas para lutar na Ucrânia, mas, sim, um chamado ao que importa aqui: defender os valores ocidentais

Mas Prager também condena os conservadores isolacionistas que olham apenas para interesses materiais dos Estados Unidos e, portanto, pregam o afastamento do assunto Ucrânia. Prager também repudia quem poupa críticas a Putin, apesar de isso ser uma pequena minoria na direita. Ele abomina a narrativa de que a Otan “provocou” a Rússia com a possibilidade de entrada da Ucrânia, lembrando que o país tem todo direito de desejar e pleitear isso.

Se um ditador russo pode invadir e dizimar outro país em um ato de agressão não provocada e isso não é do interesse dos Estados Unidos, que tal a China invadir Taiwan, ou o Irã lançar armas nucleares contra Israel, ou a Coreia do Norte fazer isso contra a Coreia do Sul? Por que Taiwan, Israel ou Coreia do Sul são mais “do interesse da América” do que a Ucrânia? Prager faz essas perguntas para lembrar que aquilo em jogo é bem mais profundo do que “interesses materiais” dos norte-americanos; é o papel da América como xerife do mundo livre!

Prager apoiou a noção de “América Primeiro”, slogan de Trump. Mas, como conservador, ele não acredita em “América Apenas”. Pelas mesmas razões, ele acredita em “minha família em primeiro lugar”, mas não em “apenas minha família”. Não é uma defesa de enviar tropas para lutar na Ucrânia, mas, sim, um chamado ao que importa aqui: defender os valores ocidentais: “Não devemos enviar tropas da Otan para a Ucrânia, mas devemos permitir que a Polônia forneça caças à Ucrânia. De qualquer forma, por que isso é diferente de fornecermos à Ucrânia armas antitanque e antiaéreas? Se a Rússia ter armas nucleares nos impede até de permitir que um terceiro país envie jatos para a Ucrânia, a lição é simples e clara: se você quer paralisar o Ocidente, desenvolva (ou roube) armas nucleares. Então você pode destruir qualquer país que você escolher”.

Como fica claro, conservadores querem defender o Ocidente justamente pelo que ele representa para o mundo, tendo a América como seu grande líder. Eles querem conservar o legado ocidental de liberdade. Já a postura contraditória da esquerda democrata mostra que seu “patriotismo” é seletivo e oportunista, uma vez que o objetivo é demonizar a direita “pró-Rússia”, um tanto imaginária, não defender realmente esses valores ocidentais. Até porque a esquerda cospe neles diariamente…

Título e Texto: Rodrigo Constantino, revista Oeste, nº 104, 18-3-2022

Um comentário:

  1. Edgard de Araújo Salles Junior19 de março de 2022 às 22:06

    Prezado Consta, creio que nessa guerra não há mocinhos. Kennan, ainda nos anos 90, e Mearsheimer, recentemente advertiram para o perigo do expansionismo da Otan. A Ucrânia foi parte da Rússia desde o século XVI! Imaginar que a Otan vá estacionar tropas e mísseis lá é loucura!
    Imaginem uma base militar russa ou chinesa no México…
    A Rússia nunca foi inimiga do Ocidente – só a Urss – e essa política desastrada a jogou nos braços da China.
    Assistam aos vídeos do Mearsheimer no YouTube.

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