sábado, 19 de março de 2022

3 anos de “fake news”: o STF não é o judiciário

Na semana em que o inquérito inconstitucional completa seu terceiro aniversário, discurso de desembargador viraliza e expõe profunda divergência entre a Magistratura e o STF

Caio Coppolla

Nesta semana, congratulei o Ministro Alexandre de Moraes pelo aniversário do seu “filho”, celebrado dia 14 de março:

— Ministro, o Brasil acompanha assombrado a sua desenvoltura ao cuidar sozinho dessa criança adoecida, que apesar de todos os problemas de saúde não para de crescer e dar trabalho.

Por isso, doutor, meus parabéns! Parabéns pelo aniversário do seu menino. Eu mal consigo imaginar seu orgulho como pai… O seu orgulho como pai do “inquérito das fake news” — o seu filho, que acaba de completar 3 anos.

Sabemos que o “pai biológico” é o Ministro Dias Toffoli, mas, como ensina a sabedoria popular, pai é quem cria. E foi o senhor que acompanhou tudo desde o comecinho: as primeiras ordens judiciais pra excluir aqueles perfis chatos das redes sociais; a primeira matéria censurada na imprensa — qual era mesmo o título da reportagem que o senhor mandou tirar do ar? Ah, “O amigo do amigo do meu pai”.

Ministro, não se aflija, o senhor foi um pai muito presente. Estava lá desde as primeiras brincadeiras de cala-boca-não-morreu, acompanhou toda a fase de buscas e apreensões — como ele adorava fuçar a vida alheia atrás de alguma coisa, não é?

E a primeira palavra, o senhor se recorda? “Cumpra-se” — quem vai falar que ele não puxou o pai? Lembra daquela vez que ele não conseguia entender de jeito nenhum o que era flagrante permanente?

— O que é isso, papai? Eu nunca vi nada parecido… — uma graça!

Além de presente, o senhor tem sido um pai muito protetor, Ministro, do tipo “pai coruja”: ninguém consegue chegar perto do seu filho, ninguém sabe nada dele, nenhuma informação. Mas o pouco que a gente acompanha aqui de fora é de partir o coração: ele dando os primeiros passos com o senhor segurando a mãozinha trêmula dele é fofo demais — e nós sabemos o que se passa na cabeça de um pai, Ministro; é natural que o senhor também tivesse as suas dúvidas e incertezas sobre o futuro:

— Será que vai dar pra prender um jornalista?

— Será que vai dar pra prender um parlamentar?… Os amiguinhos dele vão aceitar?

Mas mesmo nos momentos mais difíceis o senhor estava lá, impassível ao lado da sua criação, do seu legado, do seu filho. Impossível esquecer a tentativa de tirá-lo do senhor à força; quando aquela moça procuradora exigiu a guarda do seu filho, alegando que ela tinha direito de participar da sua criação, que esse era o devido processo legal — ainda bem que senhor não dá a menor bola pra esse tipo de coisa.

E quer saber? O senhor está certo, doutor! Vai ligar para o que as pessoas pensam?! Ainda mais essa gente maldosa, que acha que pode sair por aí criticando o senhor e as decisões do seu Tribunal — quem eles pensam que são? Donos do país?! Não passam de meros eleitores.

A propósito, Ministro, falando nisso, não sei se o senhor reparou, mas olha que coincidência: faz 1 ano que mais de 2 milhões e 700 mil brasileiros subscreveram aquele abaixo-assinado pedindo pro Congresso Nacional analisar o pedido de impeachment em seu desfavor. Imagina um absurdo desses! Impedir um pai tão zeloso, como o senhor, de continuar cuidando do próprio filho — este país está de ponta-cabeça.

Tenha certeza de que o Brasil inteiro sabe quem é o paizão orgulhoso do inquérito das fake news

Ainda bem que aquele rapaz do Senado, o Pacheco, é seu amigo e engavetou essa história toda. Eu até tentei mandar uma mensagem de agradecimento em seu nome, Ministro, mas algo grave deve ter acontecido, porque as redes sociais do Pacheco estão todas bloqueadas. Acho que é caso de avisá-lo, deve ter um monte de gente que quer elogiar o trabalho do Senador, mas não consegue acesso a ele.

Mas me perdoe a digressão, Ministro Alexandre de Moraes. Sei que o que realmente importa agora é marcar essa data, o 14 de março, em homenagem ao senhor e ao seu rebento. Essa data que, sem querer, passou batida pela grande imprensa — como andam distraídos os jornalistas nesses últimos tempos…

Mais uma vez, parabéns pelo aniversário de 3 anos do seu filho, Ministro! Tenha certeza de que o Brasil inteiro sabe quem é o paizão orgulhoso do inquérito das fake news.

Um voto divergente

Também nesta semana, viralizou nas redes o discurso contundente do desembargador Fernando Carioni ao deixar a presidência do TRE de Santa Catarina. Embora o magistrado tenha — elegantemente — omitido seus destinatários, sua crítica tem endereço certo:

“Precisamos repensar a Justiça Eleitoral. Precisamos definir a sua finalidade, inclusive à vista da diminuição de suas competências legais. Precisamos servir com responsabilidade e em estrita observância à Constituição, a da República e tão somente”.

“Juízes não são eleitos. Quando eles usurpam as funções das autoridades eleitas, estão na verdade fraudando a democracia representativa e o voto popular. Mas os juízes em tribunais ativistas não estão nem aí para o voto da maioria da população. Aliás, eles gostam de ser contramajoritários, outro discurso enganador do ativismo judicial. O tribunal ativista não quer aplicar a lei e sim impor sua visão de mundo, suas convicções ideológicas sobre aborto, drogas, segurança pública, algemas e até sobre urnas eletrônicas. Se a lei não coincide com essas convicções, pior para a Lei”.

A pertinência das observações do desembargador dispensa comentários; a ausência de repercussão desta fala entre os órgãos do consórcio de imprensa também. Mas, ainda que a divulgação da mensagem esteja aquém da sua acuidade e relevância, as colocações do doutor Fernando Carioni expõem profunda — mas ainda velada — divergência entre a Magistratura e a atual composição do Supremo Tribunal Federal, símbolo máximo do ativismo judicial e do atropelo constitucional no país. Que o exemplo corajoso do desembargador, pioneiro em seu protesto, seja seguido por outros meritíssimos, cujas vozes não podem mais calar sob pena de consentir.

Título e Texto: Caio Coppolla, revista Oeste, nº 104, 18-3-2022


Caio Coppolla é comentarista político e apresentador do Boletim do Coppolla,  na TV Jovem Pan News e na Rádio Jovem Pan

Um comentário:

  1. Leandro Ruschel
    @leandroruschel

    Qual seria a reação da militância de redação se o presidente decretasse banimento de um jornal que fosse crítico a ele?

    Mandasse prender um jornalista critico seu e fechasse rede social que se negasse a deletar o perfil desse jornalista?

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