quarta-feira, 2 de março de 2022

Ucrânia e dissidência de opinião

Telmo Azevedo Fernandes

A invasão ilegal e criminosa da Ucrânia por parte de Putin revelou não só a coragem do Presidente Zelensky, como agregou grande parte do mundo em torno da única posição que uma pessoa decente pode tomar em relação a este conflito, que é a de condenação absoluta da agressão perpetrada pelo presidente da oligarquia russa e de solidariedade total para com o povo ucraniano.

A partir daqui a gestão política da crise, e em especial as respostas que os países da NATO devem dar à situação, não é evidente, nem trivial, nem isenta de discussão ou crítica.

Todavia, dos decisores políticos e em grande parte da opinião pública nacional, parece haver tendência para cometer de novo um dos principais erros cometidos durante a agora temporariamente defunta pandemia de covid, que é o de considerar imoral qualquer opinião divergente, desonesto propor ações alternativas ou escandalosa qualquer dúvida ou cepticismo que se possa ter em relação às narrativas do governo ou discurso dos inúmeros especialistas que dão opinião nas televisões e redes sociais com o mesmo tipo de certezas e bazófia dos epidemiologistas da DGS.

Um recente sinal da continuação desta mentalidade tacanha e fascistoide foi o anúncio feito pela presidente da comissão europeia de que os governos irão proibir o acesso na Europa aos meios de comunicação social controlados pelo Estado russo e que os governos europeus vão desenvolver ferramentas para banir aquilo que considerem desinformação e propaganda russas.

Ora: não há puros nem santos, nem na Rússia nem na Ucrânia. E, que eu saiba, a comissão europeia não recebeu a graça da unção divina de ser zelador e definidor do que é a Verdade, una e completa.

A barbaridade desumana de Putin não isenta as populações e a opinião pública em geral da responsabilidade de analisar criticamente as opções e decisões políticas que afetam ou podem afetar direta ou indiretamente os países e, em particular, as suas famílias. Como aliás não autoriza a comissão europeia nem nenhum governo a tratar os seus cidadãos como burros, crianças ou incapazes.

Os nossos interesses e sobretudo os nossos valores civilizacionais, especialmente em cenários de confronto envolvendo potências nucleares e líderes sem escrúpulos, não se defendem nem compadecem com reações epidérmicas sinalizadoras de virtude, manifestações de suposta superioridade moral e muito menos com exibição de valentias expondo terceiros aos seus riscos.

Ponderar as consequências das ações e ter humildade de reconhecer que nem tudo se pode antecipar não é tibieza, mas apenas poderá fortalecer e tornar mais robustas as decisões que se venham a tomar. É respeitar quem está a morrer e quem pode ser vítima.

Se nos insurgimos contra uma clara violação do direito internacional e da democracia com a invasão russa da Ucrânia, não é esquecendo os princípios de tolerância democrática e convivência com a pluralidade e dissidência de opinião no nosso país que ganharemos a guerra.

O meu vídeo de hoje, aqui:

Título, Texto e Vídeo: Telmo Azevedo Fernandes, Blasfémias, 2-3-2022

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