Aparecido Raimundo de Souza
Como assim, duplos? Haroldo entende que o que a Zuleica Barrabás possui é dela e dele. E o que é dele, só pertence à ele. Por assim, o que trouxe da vida de solteiro para o ajuntamento das escovas, cuecas e calcinhas só diz respeito a ele. Zuleica Barrabás discorda. Veementemente bate o pé. E com razão, já que lhe assiste por inteira. A comunhão se firmou na linha da união universal. Tal modalidade, entre eles, por ser universal, deverá ser dividida em partes iguais.
É o que manda a lei. Impondo a sua vontade, o Haroldo peleja para que o “tudo” dela (e nela) deva ser dele. Notadamente, na hora da horizontal. Ou melhor, nas bobices do rala e rola. Haroldo quer possuir a mulher de todas as maneiras e manter com ela relações repulsivas e esdrúxulas. Em outras palavras, Haroldo quer andar e desandar pela via secundária. Zuleica Barrabás não concorda em liberar tal desvão. Afinal de contas, seu marido teria, por princípio, respeitar essa vontade que, acima de qualquer condição, careceria ser soberana.
Qual o quê! Haroldo insiste em furar o couro dos dois lados. Toda noite, na hora do pega pra capar, uma discussão acirrada toma forma e o quarto de dormir, local que deveria ser um refúgio de paz e tranquilidade, vira uma arena de guerra. É ai, nesse lapso temporal, que o Catecúmeno entra em cena. O sujeito é um negro parrudo e forte como um touro. Além de trocentas qualidades, desfruta, abaixo do umbigo de um instrumento de trabalho que não deixa margens à dúvidas.
Zuleica Barrabás o conheceu quase no mesmo tempo em que seus olhos verdes claros se encontraram com os castanhos de Haroldo. Aliás, ambos, Haroldo e Catecúmeno, amigos de fé, sempre foram brothers inseparáveis. Apesar desses particulares, o Haroldo levou a melhor e desposou a Zuleica. A jovem senhorita, com algumas economias que guardara, montou uma lanchonete num ponto considerado estratégico, cujo nome, por escolha de amigos, se tornou na famosa e aclamada “Lanchonete Sabores da Zuleica.”
Haroldo, além de sócio, passou à condição de marido. Catecúmeno, obviamente, foi relegado à segundo plano. Em outros dizeres: o estepe. Sócio da Zuleica, ou ainda melhor explicado. Seu amante. Diletante, à sustentação da verdade, com restrições. Restrições? Fácil o entendimento. Ao Haroldo o (marido) o consumo dos prazeres se fazia perfeito, com exceção da cerca proibida. Mesmo trilho, o Catecúmeno se esbaldaria das delícias, exceto, claro, da fruta principal.
Nessas cores de cinquenta tons distintos, os benfazejos da árvore interditada cabiam somente ao Haroldo, e, o oposto, ou seja, o vedado e desejado, ela daria, como deu, de presente, à Catecúmeno. Com esse acordo onde somente ele sabia rezar as cláusulas, nas horas em que se avistava com a sua donzela, o Haroldo fazia com que a sua lindeza fosse à loucura e alcançasse os píncaros da neurastenia desenfreada. Catecúmeno não. Às suas assanhas, o Catecúmeno pintava o diabo de amarelo e rosa, manuseando, com destreza, à popa obscura que lhe coubera por “totalmente desproibido.””
Nessa via de mãos duplas, a criatura jamais tentara vencer a barreira imposta pela safadinha. O varão se contentava com o que lhe fora reservado, sem brigas, sem caras feias, sem nariz retorcido. Na concepção de Zuleica, como ela não se dava na totalidade ao Haroldo, e reservava o “não me toque” ao amante, entendia que, por conta disso, não traia o marido. Catecúmeno, na mesma direção, se esbaldava comendo a outra fruta da apetitosa e, com isso, nem carecia perder tempo com o menu principal. Aliás, Catecúmeno adorava entrar com tudo no túnel escondidinho de Zuleica, o que o fazia, na prática, se sentir o macho mais que satisfeito e realizado do mundo.
Catecúmeno, por conta desse pormenor, sabia de tudo. O amante sempre sabe de tudo. O Haroldo, o adversante, não. Catecúmeno desempenhava o papel do chifrudo consciente, ao passo que o Haroldo, o do galhudo conformado, sem saber que o era, com todas as letras. Da traição da sua mulher, sequer imaginava. Com o passar do tempo, acabou se convencendo que a sua querida e adorável companheira não queria lhe dar os fundilhos, por questões ideológicas ligadas à religião que professava. Era crente fervorosa.
O pastor vivia alertando: “Ao seu esposo, tudo é permitido, menos o rio de águas turvas.”. Nessa linha, o rio de Zuleica que fosse para os quintos. Afinal, ele tinha toda a parte deliciosa do corpo da sua fogosa metade. O tal rio de águas turvas, por conta, deixou de ser algo que ele realmente quisesse brigar para que lhe fosse liberado. Um outro detalhe: Haroldo não imaginava, nem em sonho, que o bagageiro da sua pessoinha mais querida dançava dia sim, dia não, num remar de barco formoso.
Desconhecia que as bandas do norte da sua amada Zuleica haviam sido capturadas pela esperteza de Catecúmeno, de forma aprazível e elegante. Para Haroldo, Catecúmeno não ia além de um amigo de longos anos que a Zuleica colocara como sócia no estabelecimento. Fazia uma diferença colossal o empenho de Catecúmeno nas coisas ligadas à sociedade. Afora esse detalhezinho sem importância, jamais passou pela sua cabeça que o dotadão e excelente bombador “velejava” o mar oculto e revolto daquela maravilhosa que ele escolhera para envelhecer a seu lado.
A bagunça legalizada entre Zuleica e Haroldo, versos Zuleide e Catecúmeno, ficou mais de oito anos sem vir à tona. Como nada errado dura para sempre, belo dia, o que deveria permanecer no alheio, veio à dança. Bailou legal. Haroldo flagrou os amantes quando a sua mãe faleceu por morte natural. Em decorrência desse evento, Haroldo tirou uma semana para se dedicar aos funerais da sua genitora que morava em Salvador. A esposa não podia lhe acompanhar, uma vez que a lanchonete cada vez com lucros mais elegantes, saltava às vistas e aos esbugalhos de todos.
Passo paralelo, Zuleica não podia se ausentar, apesar de Catecúmeno ser um homem extremamente honesto até dizer chega. Não havia, contudo, como o Haroldo e a Zuleica saírem em viagem (ainda que pelo carimbo da “força maior”) nessa altura em que o espaço deslanchava e se fazia, cada vez mais popular e superlotado. Haroldo se viu obrigado a seguir viagem sozinho. Por motivos até agora não totalmente esclarecidos, o chavelhudo, voltou em três dias e se fez confinante sem nenhum tipo de aviso.
O fraudado pisou em seu apartamento no momento em que Zuleica (fora das cercanias da lanchonete) liberava o poço de águas profundas, naquela posição de Napoleão quando perdeu à guerra, o balde de Catecúmeno totalmente escancarado descendo e voltando repletado. Para piorar à hora amarga, a sua Zuleica gemendo e berrando, se assemelhava a Anitta cantando “Envolver.” Haroldo, coitado, chegou no instante em que o Catecúmeno, totalmente embrenhado dentro da sua prestimosa, gritava, eufórico: “Seguraaaaa peãoooo...”.
Catecúmeno se fez ligeiro num salto espetacular, desconectando a armadura, pingando suor para tudo quanto era lado:
— Que é isso, filho de uma rapariga sem mãe?
Zuleica, a pecadora, também saltou da raia. Em vão. Levou dois tiros no rosto. Catecúmeno, logo em seguida, caiu por sobre o corpo dela, pesado, duro, trespassado pela morte que lhe chegou aos estertores, disparada por balas certeiras que lhe estouraram em mil pedacinhos, os miolos.
Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, de Sertãozinho, interior de São Paulo. 12-4-2022
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