Lídia Paralta Gomes
Imagino que coabitar com Sérgio Conceição no mesmo campeonato seja mais ou menos como ter um tipo atrás de nós no trânsito constantemente a apitar. É um permanente zumbido, uma desconcentração que ao mesmo tempo nos obriga a chamar pela concentração, em suma, uma chatice dos diabos. A comparação não parece a mais abonatória, não creio ele se importe com isso, mas arranjemos outra imagem, esta até tirada do contexto desportivo, do senso comum que invade o balneário. Ter Sérgio Conceição como rival é um pouco como ver o nosso clube contratar um jogador raçudo para a nossa posição: ele até pode não jogar melhor que nós, mas obriga-nos a trabalhar mais, a ficarmos espertos, a não falharmos nem sequer num treino para não perdermos a titularidade. Nem sequer com 10 pontos de vantagem.
Roger Schmidt, que já devia ter uma ideia disso mesmo, agora já olha para o lado. A sete jogos do final do campeonato, o FC Porto continua a sete pontos, o Benfica mantém-se como imenso favorito ao título, mas Conceição tem esse condão de instalar o caos, a dúvida. Na fase mais importante para os encarnados, a derrota na Luz por 2-1, uma derrota feia pelo impotente que pareceu a equipa, sem reação ou criatividade para contrariar a pressão, a posse e a superioridade mental do FC Porto, aparece antes do jogo com o Inter para a Liga dos Campeões. Fantasmas pairantes no balneário, sementes de incerteza, seria tudo o que Schmidt gostaria de evitar, para mais quando não é líquido que os italianos sejam favoritos ou tenham a obrigação do que quer que seja só pelo facto de serem isso mesmo, italianos - quem já viu o Benfica e o Inter a jogar esta época saberá que os encarnados podem muito bem ganhar e chegar a uma histórica meia-final e que lhes será cobrado isso mesmo.
Mas agora os jogadores
encarnados entrarão em campo com o agridoce da ambiguidade a invadir-lhes a
língua, sabendo-se tão perto da glória mas ainda à distância de um
descalabro. Obra de Sérgio, o homem que em 37 jogos com Benfica e Sporting
venceu 20, que recuperou sete pontos de desvantagem em 2019/20 para o
Benfica (em abono da verdade, na época anterior tinha acontecido o contrário),
que foi sempre uma ameaça para o Sporting campeão nacional de 2020/21, que
contraria o unanimismo, que combate o que parece feito. De falta de
competitividade e competência a preparar os grandes jogos ninguém o pode
acusar.
Para o Benfica, uma vitória
frente ao Inter amanhã (11/4) na Luz (20h, TVI/Eleven 1) tornou-se agora também
uma espécie de chá de camomila para a veia: é preciso estancar o efeito
Conceição, que, para mais, tem um calendário bem mais simpático que o Benfica
até ao final da época. A equipa de Schmidt ainda recebe o SC Braga e vai a
Alvalade. Conceição, alimentado por essa firmeza tão distintiva, mesmo ficando
em 2.º retirará seguramente pelo menos o adocicado gostinho de ter provocado o medo cénico, a mini balbúrdia, uma pequena anarquia.
Título e Texto: Lídia
Paralta Gomes, Tribuna Expresso, 10-4-2023
Contra previsões, prognósticos, diagnósticos, apostas e despachos, FC Porto venceu o Benfica por 2 a 1
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-