domingo, 23 de abril de 2023

A verdade encurralada pela Justiça e pelo jornalismo

A verdade, para esta gente, é só uma barreira a ser destruída para seu projeto de poder

Adrilles Jorge

Um juiz tem por função descobrir a verdade para poder condenar ou absolver alguém. Um jornalista tem por função descobrir a verdade para poder condenar ou absolver alguém. Ambos devem investigar a realidade de maneira isenta e imparcial para poder alcançar um princípio de verdade. Investigando a ação da justiça e da grande mídia brasileira, não parece ser verdade que estejam no caminho da perseguição da verdade.

Vimos esta semana o chefe do GSI , gabinete de segurança institucional da Presidência cometendo um ilícito flagrante, filmado. O general Goncalves Dias facilitou e guiou a invasão dos baderneiros e vândalos que invadiram o Congresso, deixando turva a versão da Justiça oficial e da imprensa oficial de que houve um atentado exclusivamente bolsonarista contra o Estado Democrático de Direito; contra a versão oficial do governo Lula que a Presidência da República teria sido vítima de um golpe da oposição. Ora, se o GSI, comandado por Dias, braço direito de Lula entre os militares, “sombra” militar de Lula, que o apoiou nos anos de seu governo, ajudou os próprios golpistas que tentaram destituir o presidente, tem algum caroço nesse angu da verdade oficial midiática, judiciária e governista.

Importante salientar que as invasões do 8 de janeiro foram um presente para o governo. As realizações desastrosas do governo desembocaram em desastre econômico e social até agora: inflação alta, alto desemprego, alta criminalidade, invasões e crescimento pífio são algumas heranças antecipadas destes primeiros quatro meses de governo. O trunfo lulo-petista é da suposta defesa da democracia que teria sido abalada nos atos golpistas do 8 de janeiro. Trunfo este traduzido no sorriso desabrido do presidente ao caminhar, junto aos ministros do STF, pelos destroços de um Congresso depredado. 

A depredação do Congresso Nacional foi a pedra fundamental da construção de um discurso de demonização de toda a direita nacional, de toda a oposição ao governo Lula. Não só 1,4 mil pessoas foram sumariamente presas, sem julgamento, sem processo, entre elas, senhoras, idosos, deficientes, pessoas que nada depredaram, que sequer estavam lá, que foram recolhidas em frente a quartéis. Inocentes foram presos notoriamente. Mas, mais: jornalistas, influenciadores, ministro, governador, autoridades, cidadãos comuns foram indiciados tornados suspeitos e presos por “atos intelectuais terroristas” por ação difusa ou omissão. 

Qualquer um que tenha, no passado, contestado uma autoridade suprema judicial, qualquer um que tenha contestado a lisura e imparcialidade da Justiça Eleitoral nas últimas eleições, qualquer um que tenha contestado a inviolabilidade das urnas eletrônicas pode ser considerado autor intelectual da tentativa de golpe do 8 de janeiro. Você, em casa, se falou mal do Xandão ou do sistema eleitoral, tenha medo. Você se tornou um autor intelectual golpista que pode ir para a cadeia.

Fato concreto: desde o 8 de janeiro, em que invasores entraram no congresso — alguns depredando e vandalizando tudo ao redor — pessoas têm sido presas, massacradas, destruídas, a maioria sem nenhum esboço de prova ou materialidade de delito comprovado. Um comediante foi preso. Sequer estava lá. Um ex-ministro da Justiça foi preso por receber um documento que falava em reação a uma suposta Justiça Eleitoral parcial. Mil e quatrocentas pessoas foram presas e acusadas em bloco de golpismo e atentado ao Estado Democrático de Direito. 

Quem ainda não foi preso está acuado: o ex-presidente da República Jair Bolsonaro está sendo investigado por supostamente ter conspirado a favor das invasões. Por quê? Por ter querido promover maior fiscalização no processo eleitoral, por ter alimentado dúvidas do processo eleitoral, por ter um dia APÓS o 8 de janeiro, ter divulgado um vídeo que contestava a parcialidade da Justiça oficial no pleito eleitoral de 2022.

A desconfiança, até onde sabemos, bem como a crítica, são bases elementares da democracia. Agora, para esta Justiça oficial suprema, acusada de parcialidade, se transformou em ato anti-democrático. Uma subversão, uma inversão completa da ideia de democracia. Pois bem: esta mesma Justiça acusada de parcialidade até agora não prendeu um homem que se mostra num vídeo em flagrante delito conduzindo objetivamente invasores à invasão e depredação do Congresso Nacional, conduzindo objetivamente pessoas à execução de um crime, em parceria direta com criminosos.

 Mas esta Justiça — subjetivamente — percebe num governador a leniência com os invasores, suspendendo seu mandato por três meses, percebe subjetivamente um crime do ex- ministro da Justiça, por ele ter recebido um documento ou por ter estado de férias durante as invasões –, mandando-o e mantendo-o em prisão preventiva sem data de soltura.

Flávio Dino, ministro da Justiça foi avisado pela Polícia Federal das futuras invasões. Ninguém do Supremo viu crime nele. A Guarda Nacional evaporou. Lula foi para o interior de São Paulo. Ninguém viu subjetivamente nenhum crime de gente do governo em complacência com crime algum. Agora um homem de confiança de Lula é pego conduzindo criminosos. Nenhum crime visto subjetivamente por nenhum juiz o tocou ainda. Mais, pior: as imagens do flagrante delito do chefe do GSI estavam de posse da PGR há meses, e ela nada fez contra ele. 

Há quem diga que os iluministros supremos também estavam de posse destas mesmas imagens e também nada fizeram contra o general. Nada foi feito pela Justiça oficial que pudesse abalar a narrativa de que o governo Lula foi uma vítima de um golpe bolsonarista. Mas esta Justiça oficial tudo fez para constranger, perseguir, calar e prender pessoas ligadas à direita brasileira por critérios subjetivíssimos de constatação de crime em senhoras idosas que sequer estiveram no Congresso ou jornalistas e comediantes que ousaram contestar esta mesma Justiça oficial.

Diante da verdade escancarada, objetiva da realidade oficial que entra em choque com a verdade particular e subjetiva da Justiça oficial, entra a verdade desmoronada da grande mídia nacional: compactuando com a perseguição da Justiça oficial, não tem o que fazer a não ser mostrar, em caráter cristalino, as imagens do homem forte de Lula, colaborando com os criminosos. O que dizer a mídia partidária que fez campanha para Lula e tece loas para os arbítrios supremos? Uns chegaram ao patético de dizer que o homem forte de Lula era bolsonarista infiltrado; outros disseram que nada poderia fazer o chefe do GSI a não ser socializar civilizadamente com os invasores antes da polícia chegar. 

As versões, por absurdas, revelam a psique-patológica e doente no narcisista que quer adaptar a realidade à sua mentira, por pavor de ser desmentido pelos fatos. Vindo de um jornalista tentar adaptar a realidade a sua mentira traduz o antijornalismo militante em favor de uma ideologia ou de sua vaidade destruída pela realidade, pelos fatos. Vindo de um jornalista mentir e deturpar deliberadamente uma realidade percebida significa a ruína do próprio jornalismo.

Na Venezuela, o ditador Maduro inovou: colocou uma apresentadora “virtual”, uma pessoa irreal a seu lado, endossando todas as suas distorções da verdade em nome da defesa de sua ditadura. No Brasil, nem precisa: por ideologismo a maior parte da grande mídia já se transformou numa apresentadora virtual, sem consciência e vontade, que legitima uma ditadura real de uma opinião única que endossa todos os abusos de um Judiciário e de um Executivo que constroem uma verdade particular que persegue, cala, prende todo aquele que não fizer parte do seu discurso particular. A verdade, para esta gente, é só uma barreira a ser destruída para seu projeto de poder.

Título e Texto: Adrilles Jorge, Revista Oeste, 23-4-2023, 8h01

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