Carlos Lúcio Gontijo
O que falta mesmo neste
momento, na comunidade mundial, é solidariedade, pois ninguém quer sair de sua
zona de conforto. Tornou-se comum o pleno exercício do cada um por si, segundo
os preceitos do decantado individualismo pregado até como forma de se
encontrar, reduzindo a existência do ser humano ao insano narcisismo de se
contemplar o tempo todo, como se a felicidade não passasse de mera busca em se
ver em tudo, menos no outro (é claro!), uma vez que o outro não conta e
incomoda, a não ser que esteja bem distante ou, melhor enfatizando, em uma sala
de bate-papo virtual qualquer, sob a proteção da falta de olho no olho.
No mês de abril lançamos o
romance “Quando a vez é do mar” em Belo Horizonte, em período inapropriado para
uma de nossas maiores amigas, à qual conhecemos quando trabalhávamos no jornal Hoje em Dia, em 1989. Ela (psicóloga e
jornalista) passou a cuidar da revisão de nossos livros, dando-nos
tranquilidade, principalmente em relação ao enredo dos romances, pois é atenta
observadora de nomes e do tempo em que se dá a narrativa literária.
Chegamos a imaginar que nossa
querida revisora não se faria presente à noite de autógrafos, pois tinha todos
os motivos para não fazê-lo, ainda mais habitando uma capital como Belo
Horizonte, onde sair de casa é mesmo complicado diante do trânsito sempre
engarrafado e a violência agindo em todos os lugares e esquinas. Nossa amiga
enfrentava o tratamento de um câncer, começava a perder os cabelos e sentia a
agudez do mal-estar provocado por todos os demais efeitos colaterais advindos
da severa medicação. Não era mesmo para se aventurar sair às 19 horas de casa
para marcar presença em lançamento de livro!
Todavia, para nossa surpresa,
foi ela uma das primeiras pessoas a adentrar a sede da Associação Mineira de
Imprensa. Entrou na fila, fez questão de comprar um livro, ainda que
quiséssemos presenteá-la com um exemplar, num singelo agradecimento pelo
carinho em relação ao nosso trabalho literário, entregando-se à revisão de
nossos livros sem jamais nos cobrar por seu empenho profissional, materializando
com seu gesto a sua compreensão no tocante à nossa luta como autor
independente.
Berenicy nos abraçou, deu-nos
um beijo na face e disse-nos baixinho: “Estou aqui de peruca e tudo, mas não
podia deixar de vir!” E foi-se embora, derramando nas dependências da AMI o seu
rastro de amizade verdadeira e, ao mesmo tempo, passando-nos a lição de que em
todo e qualquer evento o que conta mesmo são as presenças, independentemente de
quantas somem, cabendo-nos o discernimento de não permitir que os ausentes
tenham o poder de empanar a visão e o calor físico dos que saem da comodidade
de seus lares para prestigiar os que ousam promover encontros, no caso o
lançamento de um livro, produto muitas vezes desprovido de valor num ambiente
cultural tão adverso, onde os apelos para o grotesco se avolumam em todos os
grandes meios de comunicação.
Sob esse entendimento,
deslocar-me-ei em breve até a cidade de Teresina, no Piauí, onde o jornalista e
professor universitário Magnus Martins Pinheiro nos prepara uma sessão de
autógrafos na segunda quinzena do mês de agosto próximo. Estaremos lá imbuídos
da certeza que, fora do mundo dos corruptos que transitam nos corredores de
nossos poderes carcomidos tanto pelos maus quanto pelo silêncio dos que se
dizem bons, ainda existe esperança vigorosa no seio de nossa gente humilde e
laboriosa, ou mesmo em atitudes como a concretizada por nossa amiga Berenicy,
provando-nos o acerto da afirmação do padre Antônio Vieira: “O homem é suas
ações e mais nada”.
Título e Texto: Carlos Lúcio Gontijo, Poeta, escritor e
jornalista, 13-7-2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-