domingo, 7 de março de 2021

A falsa dicotomia entre lucro e vida

Toda a retórica de nossos 'intelectuais' contra o capitalismo não serve para salvar uma única vida


Rodrigo Constantino

O fiasco do lockdown nessa pandemia serviu para mostrar como a dicotomia entre saúde e economia é falsa, já que uma depende da outra. Quem mandava todos ficarem em casa pois o foco era a vida, sendo que na economia pensaríamos depois, estava apenas sendo demagogo e sensacionalista. Se não há economia com mortos, tampouco há saúde com uma legião de desempregados. O equilíbrio é o segredo.

Da mesma forma, a demagogia falou mais alto na hora das vacinas. O esquerdista é aquele que olha a existência de um bem ou serviço e, sem compreender como sua produção foi possível, exige uma distribuição mais igualitária. Ou seja, é um mestre em fazer caridade com o esforço alheio, é um profeta do passado, um Maquiavel às avessas que, para salvar cem hoje, condena à morte mil amanhã. Os ataques aos laboratórios capazes de criar as vacinas em tempo recorde comprovam isso.

O empreendedor é aquele atento tanto às necessidades do mercado como às oportunidades existentes. Ganhar dinheiro entregando aquilo que o consumidor deseja ou de que necessita não é crime nem algo imoral. Ao contrário: é o que permite o constante avanço e progresso material. Demonizar quem ganhou dinheiro na pandemia por fornecer produtos úteis para conter o estrago do vírus, portanto, é condenar à morte mais gente, por pura ideologia ou inveja.

Vejamos alguns exemplos. A Stevanato Group conseguiu um contrato para fornecer entre 100 milhões e 2 bilhões de frascos para envazar vacinas contra a covid-19. O controlador da empresa, Sergio Stevanato, viu seu patrimônio líquido subir para US$ 1,8 bilhão. Ele deve ser culpado por isso ou deveríamos ser gratos pelo serviço prestado?

Na bolsa de valores da Malásia, um fabricante de luvas de vários tipos, incluindo as hospitalares, a Top Glove Corporation, teve o valor de mercado multiplicado em seis vezes entre 31 de dezembro de 2019 e agosto de 2020. Seu “pecado” foi produzir itens fundamentais para a segurança dos médicos na linha de frente da batalha contra o vírus.

No encerramento do pregão da Nasdaq do último dia de 2019, cada ação da Medpace valia US$ 84,06. Em 2020, a empresa começou a fornecer testes para detectar a covid-19. No começo de março deste ano, esses mesmos papéis valiam o dobro, e a revista Forbes estimava que August Troendle, fundador e CEO da companhia, já estava com o patrimônio pessoal líquido de US$ 1,3 bilhão. Quantas vidas foram salvas com mais testes disponíveis?

As ações do laboratório Moderna, um dos desenvolvedores de uma vacina experimental contra a covid-19, tiveram uma valorização ainda maior na Nasdaq. No final de 2019, antes de a China revelar a gravidade do coronavírus para o mundo, cada ação da farmacêutica fechou cotada abaixo de US$ 20. Meses depois, já valia mais de US$ 150. A Forbes estimou que a fortuna do fundador da Moderna, Stéphane Bancel, tinha ultrapassado US$ 4 bilhões.

Outra produtora de vacinas que ganhou fama e se valorizou na pandemia foi a BioNTech. As ações da empresa na Nasdaq encerraram 2019 cotadas a US$ 33,88. Em 2020, a companhia anunciou um contrato com a Pfizer para desenvolver uma vacina contra a covid-19. As ações valem hoje mais de US$ 100. A Forbes estimou a fortuna do fundador e CEO da BioNTech, Uğur Şahin, em US$ 4,2 bilhões.

No Brasil, o grupo Dasa já realizou, pelo menos, 3 milhões de testes para detectar a covid-19. Em 31 de dezembro de 2019, cada ação da empresa valia R$ 57,71 na B3. Recentemente, havia ultrapassado os R$ 150. De acordo com a revista Forbes, em fevereiro deste ano, a matriarca da família que controla a companhia, Dulce Pugliese de Godoy Bueno, tinha o patrimônio líquido de US$ 3,5 bilhões, e seu filho, Pedro de Godoy Bueno, de US$ 1,1 bilhão.

Há prêmios para quem entrega soluções. Esse mecanismo de incentivos é fundamental

Por que esse enriquecimento deveria nos incomodar, se foi graças a ele que vidas foram salvas? O professor da Harvard Michael Sandel, em seus livros Justiça O Que o Dinheiro Não Compra, provoca a reflexão acerca de ganhos extraordinários em emergências. O professor pode entender de ética e dilemas morais, mas não parece entender muito de economia. Ele abre seu livro mais famoso com esta questão hipotética: uma tempestade deixa arrasada uma cidade inteira, e os preços dos produtos básicos para a sobrevivência explodem. É justo cobrar o que for possível nessas circunstâncias emergenciais, ou o governo deve intervir para impor um comportamento mais “virtuoso” aos cidadãos?

Não resta dúvida de que a excessiva mercantilização da vida traz graves problemas sociais, e os livros servem para pensarmos nesses limites éticos. Mas, no caso particular de tragédias, o preço de mercado dispara por um motivo específico, e isso serve justamente para alertar todos os agentes econômicos sobre a nova realidade. Como recursos são escassos, esses preços mais altos sinalizam a necessidade de realocação dos recursos, o que pode justamente salvar vidas!

No exemplo concreto da pandemia, as luvas serão produzidas no lugar de outros itens supérfluos, os insumos necessários serão canalizados para testes e vacinas experimentais, em vez de acabarem em produtos de relevância secundária, e por aí vai. Há um prêmio para quem conseguir entregar soluções, e esse mecanismo de incentivos é fundamental. O esquerdista é aquele que atua no ambiente utópico de abundância, ignorando a escassez e, portanto, o próprio problema econômico, que é sobre alocação eficiente de recursos limitados.

Quem entende o funcionamento da economia, por sua vez, não vai condenar os lucros “excessivos” em situações de emergência, por compreender que são tais ganhos que permitem o foco dos empreendedores na solução desses problemas urgentes. Mas sabemos também que sempre haverá um espaço para a demagogia no mercado de ideias. Não é novidade, e o guru da esquerda, Noam Chomsky, chegou a escrever um livro cujo título já explora a falsa dicotomia: O Lucro ou as Pessoas? A resposta certa seria: o lucro, para salvar as pessoas!

Muitos criticam o lucro como motivador. Gostariam que a humanidade fosse movida somente pelo altruísmo. São românticos bem-intencionados. De boas intenções, porém, o inferno está cheio. Os países socialistas, que seguiram essa receita, acabaram na miséria e na escravidão, praticamente sem nenhuma contribuição relevante à medicina. A despeito da propaganda, o fato é que a medicina cubana é um lixo, principalmente para os pobres (todos aqueles distantes do poder). A União Soviética colocou o Sputnik em órbita, mas faltava papel higiênico nas prateleiras e nenhum remédio importante veio desse regime.

Enquanto isso, laboratórios capitalistas em busca do lucro fornecem mais e melhores remédios no mercado. Pfizer, Merck, Eli Lilly, Roche, Sanofi, Novartis, Bayer, Schering-Plough, AstraZeneca e tantos outros, investindo bilhões na busca de medicamentos inovadores, são responsáveis por uma qualidade de vida melhor da população. Toda a retórica de nossos “intelectuais” contra o capitalismo não serve para salvar uma única vida. Por outro lado, as dezenas de bilhões de dólares que os laboratórios capitalistas destinam para pesquisas todo ano já salvaram milhões de vidas. E vão continuar salvando mais ainda, se os socialistas não criarem obstáculos em demasia.

O mundo seria um lugar muito melhor se houvesse menos hipocrisia e mais laboratórios em busca de lucro.

Título e Texto: Rodrigo Constantino, revista Oeste, nº 50, 5-3-2021

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