sábado, 27 de março de 2021

Operação Lava Lula

A batata do ex-juiz começou a assar. Ele não sabia com quem estava se metendo. Subestimou a confluência pródiga de capa preta e imprensa marrom


Guilherme Fiuza

A Lava Jato é uma operação suspeita, decidiu o STF — em votação na Segunda Turma. Não sabemos nada sobre essa turma. Mas sabemos que tem turma que é braba. Quem cresceu andando pelas ruas e atravessando territórios urbanos sabe que diante de certas turmas é melhor mudar de calçada. E dependendo do gueto nem adianta. Eles vão pegar a vítima onde ela estiver.

Também não adianta ser juiz e ter liderado o combate à delinquência no poder. Quando a turma é braba mesmo não está nem aí para currículos. Todos são iguais perante o gueto — tem pau e pedra para todo mundo. No início ficavam xingando o juiz de longe. Aí o juiz deixou de ser juiz e foi para Brasília. Movimento arriscado para quem não domina o universo das gangues.

De cara o ex-juiz foi roubado. Os ladrões levaram uma grande quantidade de mensagens privadas dele, em comunicações telefônicas com seus parceiros de força-tarefa. A polícia até pegou os ladrões, mas os mandantes do roubo jamais foram identificados. O fato é que a muamba foi parar nas mãos de uma turma braba — e aí virou festa. Roubado é mais gostoso, como se diz no gueto.

Com ajuda do jornalismo de viela, foi montada uma ópera do malandro otário — que transformou essa muamba em relíquia. Uma obra-prima para transmutar o maior ladrão do país em vítima inocente dos homens da lei. A batata do ex-juiz começou a assar. Ele não sabia com quem estava se metendo. Subestimou a confluência pródiga de capa preta e imprensa marrom.

E ainda resolveu dar uma pirueta circense em pleno território das gangues de Brasília, montando um show político para tentar agradar a mesma imprensa marrom que queria o seu escalpo. Ou seja: um trouxa (foi a leitura imediata dos parasitas de todas as turmas locais).

Assim é a vida. Um astronauta capaz de chefiar uma missão espacial pode se tornar um desastre chefiando uma reunião de condomínio. Ainda mais se achar que a quilometragem do seu foguete é credencial para hipnotizar os vizinhos da assembleia. Esse astronauta é um lunático — concluíram as aves de rapina. E foram para cima dele com gosto de sangue na boca.

Três anos antes o então juiz tinha prendido o então ladrão — que ainda não era condecorado como ladrão inocente, tanto que a Justiça confirmou a sentença em três instâncias. Na ocasião nenhuma turma xingou o juiz, pelo menos não ostensivamente. Ao contrário: os defensores do ladrão tentaram em vão um habeas corpus preventivo — expressão que no mundo das gangues quer dizer não toca nele senão te pego lá fora. Ninguém afiançou a pele do delinquente e valeu o escrito pelo juiz: cana.

Se o processo era perfeito e as provas estavam todas lá, suficiente e solidamente, reconhecidas até na Corte máxima, e não se sucedeu nada que tivesse o condão de revogar o passado, como podem ter trocado de lugar o juiz e o ladrão?

Mistério. No momento só há um caminho realmente concreto para elucidá-lo: sigam o dinheiro. Quem encomendou a muamba? De onde veio a montanha de dinheiro vivo — quase R$100 mil — encontrada com os delinquentes presos por roubar mensagens privadas do juiz? Quem contratou os ladrõezinhos que trabalharam em favor do ladrãozão e seus simpatizantes mais ou menos graduados?

O que não mudou, com toda certeza, nesses três anos foi o desejo de justiça da população. Ela transbordou as ruas quando viu a ameaça de desviarem o ladrãozão do caminho do xadrez. E não vai negar fogo para exigir punição aos mentores da operação Lava Lula.

Título e Texto: Guilherme Fiuza, revista Oeste, nº 53, 26-3-2021

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