Percival Puggina
Se a ideia, há dois anos, foi evitar crise
institucional, agora estamos em plena crise e já se viu qual poder se abasteceu
da omissão do Parlamento
O Supremo Tribunal Federal, como poder de Estado, exerce função política. É assim na teoria e tem sido assim na prática. Ao longo do tempo, o que se observa são certas variações em sua interferência para definir o que seja interesse público. Pode-se afirmar que a Suprema Corte, como tal, historicamente, observou seus devidos limites.
Assim foi, até ser tomada por
petistas e serem, os não petistas capturados pelo ativismo e pela rejeição ao
conservadorismo e ao liberalismo. Pois não é que quando tudo estava certinho,
bem combinado, hegemonizado entre marxistas e fabianos, 57 milhões de eleitores
entenderam a tramoia, viram para onde se perdia o barco e disseram –
"Basta!"?
A partir daí o STF deixou de ser um dos poderes políticos para se tornar o mais político dos poderes de Estado e, por óbvio, o pior de todos. O pior no mais amplo sentido. Sem unção popular, monocrático em muitas decisões, maleficamente corporativo (tomado por aquele corporativismo que subscreve sandices para não deixar mal um companheiro). Capaz de usar o poder para constranger a opinião pública, a opinião parlamentar e o jornalismo divergente. Sempre pronto a usar mão leve para soltar criminosos e mão pesada para manter preso quem os desagrada pessoalmente (também no absolutismo monárquico o maior crime era o de lesa-majestade). E fiquemos, prudentemente, por aqui, posto que a imaginação, quando trabalha sobre fatos não esclarecidos, pode incorrer em mau juízo.
A situação do Supremo se
agrava porque, de hábito e cultura do próprio poder, seus integrantes têm o ego
diariamente untado por mesuras e reverências servis e até a divergência,
recebida com enfado (só falta um lencinho perfumado sob o nariz), vem enrolada
em vênias e escusas. Por vezes parece faltar, apenas, o apelante se retirar
curvado, dando passos em marcha ré perante tais fulgurações.
Corresponde aos senhores
senadores (são 81) pôr fim a esses abusos de poder. Reitero o que já escrevi
antes: não é ao impessoal Senado, mas aos senadores individualmente que se deve
clamar pela solução desse problema. É de seu querer que tudo pende. E aí o
bicho pega. Um terço de laranjas podres estraga o cesto inteiro. Vinte e seis,
nenhum petista, assinaram a Lava Toga em 2019 (1). Vinte e cinco perderam a
liberdade de abanar a cauda porque estão sob investigação, ou respondem
processo ou são réus perante o STF. O terço final se revela solidário aos
colegas encrencados. Os primeiros já sabem o que tem que ser feito. Os segundos
jamais o farão. É dos terceiros, dos que poderiam agir e não agem, que pode e
deve ser extraída posição para fazer andar a Lava Toga ou os abundantes pedidos
de impeachment de ministros do Supremo pendentes na Câmara Alta da República.
Se a ideia, há dois anos, foi evitar crise institucional, agora estamos
em plena crise e já se viu qual poder se abasteceu da omissão do Parlamento.
Fora os que já se mostraram
convencidos da necessidade de agir, de defender as instituições dos que
sequestram seus poderes, todos os demais precisam ser conscientizados pelos
cidadãos de onde vivem, ou aonde quer que vão, da responsabilidade que têm
sobre os ombros e do caráter imperdoável de suas omissões. Se não ouvirem o
grito das ruas, ouvirão a vaia das urnas.
O valor de um senador não se
mede em verbas conquistadas, mas por coragem cívica e política, especialmente
nos momentos cruciais, em que a nação se sente abandonada por instituições que
surfam onde os eleitores soçobram.
(1)
Eram 27, mas o senador Elmano Férrer (PI) retirou a assinatura e o
pedido foi arquivado por insuficiência de apoio. Lista dos 27 aqui e
notícia do arquivamento final, aqui.
Título e Texto: Percival
Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto
Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e
Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor
de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e
Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante
do grupo Pensar+.
Conservadores e Liberais puggina.org, 14-3-2021
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