sábado, 24 de julho de 2021

Viva o “distanciamento social”!

Prometo comportar-me como a maioria dos cidadãos nas partes civilizadas do mundo onde a vacinação vai adiantada e serve para levarmos uma vida normal e não o simulacro de vida que o governo quer impor


Alberto Gonçalves

Passaram nesta sexta-feira quatorze dias após a segunda dose da vacina da Pfizer, que tomei porque quis e não porque, com bons ou maus modos, me mandaram tomar. Segundo os estudos disponíveis, nos quais por enquanto acredito, estou entre 64% e 96% protegido contra a infecção, mais protegido ainda contra a possibilidade de infectar alguém, e praticamente imune a qualquer versão grave da doença. Se adicionar o critério da idade, isto significa que para mim a Covid acabou, e que o risco existente, já antes baixo, é hoje tão ínfimo que seria patético preocupar-me com o assunto.

Na verdade, tirando os quinze dias iniciais, em que até encomendei um oxímetro, nunca me preocupei muito, se é que me preocupei de todo. Jamais usei máscara na rua ou em restaurantes. Deixei de despejar aquela gosma nas mãos quando, para aí há um ano, se descobriu que a propagação do vírus através das superfícies é assaz nula. E em momento nenhum moderei o convívio com familiares e amigos, todos felizmente saudáveis quanto à Covid e principalmente quanto à doideira que o medo da Covid suscita. Se, à imagem do que sucedeu a muitos, alguém próximo tivesse enlouquecido com o pânico espalhado pelos noticiários, é óbvio que não lhe imporia a minha presença – e de certeza que essa alminha não voltaria a impor-me a dela (lido mal com chalupas).

Daqui em diante, prometo comportar-me como se comporta a maioria dos cidadãos nas partes civilizadas do mundo, onde a vacinação vai adiantada e serve para levarmos uma vida normal e não o simulacro de vida que um governo antidemocrático deseja que levemos. Não espero voltar a tapar a cara da grotesca maneira que, de 2019 para trás, era exclusiva de assaltantes, fanáticos religiosos ou turistas asiáticos. Se, no interior de um estabelecimento, tentarem converter-me ao farrapo nas fuças, agradeço a cortesia e venho embora. Também não tenciono começar agora a cumprir, ou sequer conhecer, as “regras” de horários e circulação, que não respeitei na medida em que as “autoridades” em questão não são susceptíveis da mínima respeitabilidade. Seria tão absurdo acatar o folclore legislativo e ilegal destes governantes quanto pagar multas por excesso de velocidade num país em que um carro a 200 km/h mata um desgraçado e o ministro não sai do carro, não sai do governo e não entra na cadeia.

Por fim, não pedi e, salvo talvez para utilização em aeroportos, não pedirei o famoso “certificado digital”. Era o que faltava ter de fazer prova do meu estado de saúde a funcionários da restauração, da hotelaria e do que calhar. De facto, os tempos mudaram. Há quase 40 anos, face a idêntico nevoeiro sobre as fontes de contágio, os receios “sociais” perante a SIDA não eram menores do que os receios sanitários: metade dos esforços consistiam em garantir que ninguém seria discriminado. Em 2021, o empenho na discriminação é assumido e anunciado. Em ditaduras ou lugares a caminho de o serem, é celebrado. Embora eu não veja televisão, juraram-me que há criaturas em “debates” a propor a interdição de espaços públicos a quem não apresentar o repulsivo “certificado” – e não são imediatamente detidas por incitação ao ódio ou loucura perigosa. Não por acaso, são os mesmos tarados que, à revelia da ciência e em nome do que chamam “ciência”, acham as vacinas insuficientes para o “alívio” das restrições. Inchados de fé, os inquisidores não se atormentam com a realidade e o bom senso.

É por causa de gente assim – e por causa de gente assim abundar por aí – que o fim da Covid, doravante uma doença endémica no meio de inúmeras outras, não significa o fim do horror que a histeria da Covid revelou. Não falo das benesses proporcionadas ao poder, leia-se o aproveitamento do PS para implantar uma protoditadura enquanto os anjinhos se distraíam com uma pandemia sem precedentes desde a anterior. Falo dos meus compatriotas. Não sou um fervoroso crente na bondade humana, e por definição na bondade dos portugueses. Porém, nem eu suspeitava de tamanha quantidade de gente indigna, e de tamanha concentração de indignidade. A Covid não se limitou a trazer à superfície a prodigiosa ignorância que por aí vai, uma primitiva incapacidade de interpretar dados simples, de estabelecer relações de causa e consequência, de permitir que a dúvida perturbe a cegueira das convicções. A Covid também mostrou que uma assustadora percentagem dos sujeitos com que nos cruzamos na rua acumulam as piores características disponíveis à espécie.

Bem para lá da Covid, custará partilhar a existência com multidões de delatores, ressabiados, prepotentes, retardados, invejosos, servis, lorpas, fascistas, socialistas e o camandro. No entanto, é disto que o país está cheio. É isto que elege os adversários da liberdade que temos por políticos. É com isto que somos forçados a lidar nas minúcias diárias. Pensando melhor, sou capaz de adoptar indefinidamente uma das “recomendações” da DGS. O “distanciamento social” é uma expressão horrenda, mas uma prática saudável em sítios infectos.

Título e Texto: Alberto Gonçalves, Observador, 24-7-2021

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