terça-feira, 3 de agosto de 2021

[Aparecido rasga o verbo] Quem sai aos seus não degenera

Aparecido Raimundo de Souza

O PEQUENO E ESPERTO DAVI
, nesta manhã, quando vai à padaria, com seu pai, vê exposta, na banca de jornais de seu Gusmão, na pracinha perto do prédio onde moram, a capa de uma revista masculina com a fotografia de uma famosa atriz global segurando uma camisinha. Com a ingenuidade dos seus cinco anos, chega para o pai e pede que compre, para ele, um exemplar a fim de guardar em casa, argumentando que, quando o pipi dele ficar grande, já terá uma ao alcance das mãos. O pai estaca os passos, franze o cenho e tenta desconversar, mas o garoto parece disposto a não arredar pé do seu propósito. O pai olha para o filho, muito sério e explica que o tal objeto da publicação ali pendurado só servirá para quando ele ficar um pouco maior.
— O senhor quer dizer, quando eu ficar ‘mais grande?’.
— Sim.
— Mas eu já sou grande.
— Tem que ser maior ainda.
— Mais?
— Pelo menos um pouquinho...

O fedelho, todavia, não dá tréguas. Insiste.
— Pai, meu pipi já é velho.
Risos.
— Que história é esta de pipi velho?
— Ele já cresce...
— Não estou entendendo.
— Pai, o seu pipi não cresce?

O pai fica branco e se engasga, sem argumento.
— Sim.
— Então?
— O meu também.
— Me explica isto direitinho.

— Toda vez que a tia Eleonora, a minha babá, me dá banho, para eu ir para a escola, ele fica...
—... Ele fica?
— O senhor sabe...
— Não, pelo visto seu pai não sabe. Está mais por fora que umbigo de vedete.
Mais Risos.
— Pai, umbigo de quê?
— Não me enrola, mocinho. Vá direto ao ponto. Quando a tia Eleonora, a sua babá, lhe dá banho o que é que acontece?
— Meu pipi fica duro...

O pai se queda, completamente atônito.
— Duro?
— É pai.
Sem saber o que explicar para o pequeno, o sujeito permanece em silêncio, o queixo caído, meio que apatetado, de cara grudada no chão.
— Quer dizer que toda vez que a sua tia Eleonora lhe dá banho seu pipi fica duro?

— De novo, pai? Sim senhor, fica.
— E como é que ela faz para que ele fique... duro?!
— Ela não faz nada. Só ensaboa e lava, depois enxuga, ora!
— Eu sei que ela lava, ensaboa e enxuga. Mas somente por estes simples gestos ele cresce, digo endurece?

— Ela também esfrega, de cima para baixo, de baixo para cima, de um jeito gostoso...
— De um jeito gostoso? Meu filho, como é este jeito gostoso.
— O senhor sabe...
— Não, não sei.

O guri, muito sério, os olhinhos ávidos, encara o pai e manda a cartada definitiva.
— Ela faz igual quando a mamãe sai para trabalhar e o senhor se tranca com a tia Eleonora no banheiro da empregada lá de casa para tomar banho...
A criatura, nesta altura, além de pasma e sem saída, ou melhor, sem saber realmente o que dizer ao seu filho, retorna com a indagação, tentando ganhar tempo.
— Meu Deus, filho! O que é que a sua tia Eleonora faz?
— Ué. Ela dá banho no seu pipi.
— Quem lhe disse isto? Não minta. Me conta a verdade.

— Tá eu conto. O senhor promete me dar a revista que eu quero de presente, não brigar comigo, nem contar para a tia Eleonora, e nem para a mamãe?
O pai, assustadíssimo e, mais que isto, terrivelmente amedrontado, o coração aos saltos, faz que sim com a cabeça.
— Jura?
— Juro.
— Eu espiei...
— Espiou?
— É, pai!
— Espiou com ordens de quem?
— De ninguém.
— Santo Deus, Davi. Como fez isto?

— Assim, pai... eu espero a dona Nanci, nossa empregada, sair para vim aqui na padaria. Então eu boto uma cadeira encostada na porta do banheiro e espio o senhor e a tia Eleonora pelo buraquinho da fechadura.

Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, de Tóquio, no Japão. 3-8-2021

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