Não esperem revelações, não
sei quanto ganha Silva Lopes [foto] de reforma. Sei apenas que ele foi Governador
do Banco de Portugal e ministro das Finanças. Foi sempre um homem mais para a
esquerda do que para direita, e por volta de 2002 (ou até talvez antes)
começou a alertar que íamos no caminho do abismo. Ontem, apesar dos seus mais
de 80 anos, com a lucidez que falta a tanta gente, afirmou o seguinte: custa-me
ir contra a minha classe de reformados, mas as pensões de reforma mais altas
têm de ser cortadas, não podemos viver à custa das gerações mais novas. E
acrescentou: "Eu sou pensionista, quem me dera a mim que não toquem nas
reformas, mas tocam, vão tocar e eu acho muito bem. Não há outro remédio. A geração grisalha não pode asfixiar a geração nova como tem feito até aqui".
Silva Lopes é dos raros
casos de desprendimento nas elites portuguesas (compare-se com Cavaco, que
preferiu a reforma ao salário de Presidente). É um exemplo. Porque ele sabe
bem que a situação é insustentável. O mesmo sabe Victor Baptista, um quadro do
Partido Socialista, que hoje num artigo no 'Público' escreve: "Nos
últimos anos, o sistema é continuamente deficitário (...) este ano serão
transferidos do OE mais de mil milhões de euros para o pagamento das pensões e
reformas". Victor Baptista apresenta uma proposta de se taxar não
apenas os trabalhadores das empresas, mas também a maquinaria e equipamentos.
Eu sei que estes exemplos de
honestidade intelectual escasseiam. Deve ser por isso que ouvimos tantos
indignados a reclamar que o dinheiro das pensões corresponde ao que descontaram.
Mas, significativamente, isso não é bem assim. Basicamente há dois sistemas de
segurança social: no de capitalização puro, o dinheiro é de facto de quem o
descontou, uma vez que a poupança é transformada em renda. Mas num sistema
de repartição, que é aquele que Portugal sempre teve, os reformados não têm
necessidade de ter qualquer poupança prévia. Carlos Pereira da Silva,
professor Catedrático do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG),
escrevia em 2006 (há sete anos, muito antes desta trapalhada toda), que "neste
caso não existe titularização dos direitos formados. Tudo depende do papel do
Estado e das maiorias que o Governam. O risco é essencialmente político".
O nosso sistema é o de repartição porque a classe política portuguesa bloqueou sempre, mas sempre, qualquer reforma de fundo da segurança social. O esforço - meritório - feito por Vieira da Silva veio ajudar a remendar, mas não pôde consertar. Baseava-se em taxas de crescimento da Economia que não se verificaram nem se vão verificar. Recordo que no primeiro trimestre deste ano (leia-se hoje o Financial Times) a Alemanha cresceu uns ridículos 0,1% e a França entrou (pela quarta vez desde 2008) em recessão.
O nosso sistema é o de repartição porque a classe política portuguesa bloqueou sempre, mas sempre, qualquer reforma de fundo da segurança social. O esforço - meritório - feito por Vieira da Silva veio ajudar a remendar, mas não pôde consertar. Baseava-se em taxas de crescimento da Economia que não se verificaram nem se vão verificar. Recordo que no primeiro trimestre deste ano (leia-se hoje o Financial Times) a Alemanha cresceu uns ridículos 0,1% e a França entrou (pela quarta vez desde 2008) em recessão.
Este é o problema que temos. O
imobilismo nas pensões e reformas, por muito que custe à APRE e ao dr. Pinhal
faz-se - como diz Silva Lopes, um dos homens mais estruturalmente sérios com
que me cruzei - à custa das gerações dos nossos filhos netos. Nós, os
grisalhos, temos de escolher. Ou entramos na conspiração (como bem lhe chamou
Ribeiro Mendes, que foi secretário de Estado da Segurança Social de Guterres e
tem alertado para a insustentabilidade do sistema) e queremos apenas salvar-nos
a nós mesmo. Ou compreendemos que tem de haver solidariedade intergeracional
e abdicamos de parte do que temos. É esta a questão. Toda a restante
conversa é baixa política.
Título e Texto (e grifos): Henrique Monteiro, Expresso,
15-05-2013
Caro Dr. Henrique Monteiro. Em primeiro lugar, certamente, o Dr. Silva Lopes não necessitará que o defenda, face aos elevados proventos que, na maior parte, à custa da politica tem arrecadado. Por outro, a alteração do Sistam de Capitalização pelo Sistema da Repartição para o cálculo da pensões foi efectuado no antes de 1974. Prevaleceu o Sistema de Repartição e, certamente (não o Senhor que ainda é muito novo, mas está pelos vistos "preocupado", foi imposto pelos dirigentes politicos, mas com a convicção de que o Estado é uma pessoa de bem. Como podemos ter confiança se temos, comentadores como o Senhor, que navegam conforme entendem.
ResponderExcluirMorreu ao final desta tarde de quinta-feira, 2 de abril de 2015, José Silva Lopes, antigo ministro das Finanças e ex-governador do Banco de Portugal. Tinha 82 anos e estava internado no hospital de Santa Maria, em Lisboa, desde o final de fevereiro.
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