A ruina grega é uma história cheia
de mentiras, desperdícios e uma enorme hipocrisia.
Rui Santos
Texto publicado no Libre Mercado por M. LLamas e amavelmente
traduzido para português pelo Jóni Coelho, que coloco aqui à disposição dos
leitores.
«A Grécia é não só
um país falido, mas também uma das economias
mais pobres e menos desenvolvidas da Europa desde há décadas. E isto,
curiosamente, seguindo os ditames da esquerda radical- posto que o Estado grego
caracterizou-se por ser um dos mais intervencionistas da Europa (estava no 100º
lugar mundial da fragilidade de fazer negócios quando começou a crise do euro)
e com um dos mais elevados níveis de gastos públicos.
A origem da tragédia grega, ao
contrário do que defendem o Syriza e o Podemos, não reside na austeridade, mas
sim no enorme e insustentável setor público. A Grécia foi o país da UE que mais
aumentou o seu gasto público real (cerca de 80% entre 1996 e 2008) e a sua
divida pública (400% superior à receita pública de 2011) desde os felizes anos
da bolha de crédito. Mas estes grandes números, sendo relevantes, traduzem-se
também em factos muito concretos, cuja realidade ocultam habilmente os partidos
como o Syriza ou o Podemos em Espanha.
Em seguida, resumem-se as dez grandes vergonhas Gregas que
a esquerda europeia se nega a reconhecer. A ruina grega é uma história cheia de
mentiras, desperdícios e uma enorme hipocrisia.
1 – Mentiram sobre o défice
público
O primeiro facto a assinalar é
que os políticos gregos ocultaram o seu défice público real
durante anos. Quando o novo governo chegou a Atenas em 2009, encontrou-se com
um perdão fiscal correspondente a 14% do PIB, em oposição aos dados oficiais de
Bruxelas que era de 3.7%.
De um dia para o outro, o
défice passou de 7000 para 30000 milhões de euros, quase quatro vezes mais.
Este manifesto embuste evidencia a enorme irresponsabilidade política dos
diferentes governos gregos.
2 – Atenas recorreu à banca
de investimento
A esquerda descarrega
constantemente contra os mercados, em geral, e a malvada banca
de investimento, em particular, mas esquecem-se que a sua admirada Grécia
recorreu aos financiamentos de Wall Street para ocultar as suas contas
desastrosas.
O anterior governo presidido
por Yorgos Papandreu reconheceu que a Grécia mentiu nas contas do défice e da
dívida para entrar no euro, oferecendo dados falsos até 2009, valendo-se, entre
outros, dos serviços da Goldman Sachs. Com isto assinala-se que o actual
Presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, dirigia as operações
da Goldman Sachs na Europa em 2002, quando a Grécia iniciou as suas operações
fraudulentas de engenharia financeira.
3 – O Estado causou a
falência da banca
Outra verdade é que, no caso
da Grécia, a falência da banca grega foi responsabilidade direta do
Estado grego, e não o contrário. As entidades bancárias foram
encarregadas da dívida pública grega durante os anos da bolha para financiar o
enorme e sumptuoso gasto de diversos governos. Por isso, a banca grega entrou
em falência quando se removeu 50% dos títulos gregos nas mãos dos credores
privados em 2011, após o acordo do 2º plano de resgate da Troika.
Posteriormente, a Europa
teve de injectar dinheiro extra para salvar os depósitos gregos. Isto é, os depositantes
gregos foram resgatados com o dinheiro dos contribuintes europeus
através da Troika, depois da insolvência de Atenas, que arrastou a banca para a
falência.
4 – Vida a correr bem, mas
com dinheiro dos outros
Durante a bolha a Grécia viveu
muito acima das suas possibilidades reais, recorrendo a uma prodigiosa dívida
pública para poder financiar esse nível intolerável de gastos. Mais de metade
da economia grega dependia, de uma ou outra forma, do maná estatal, criando
assim uma grande estrutura clientelar à base de “jobs
for the boys”, corrupção, subvenções.
Seguem alguns exemplos:
· Durante anos, e tendo um PIB per capita muito
inferior ao de Espanha, o salário mínimo grego era 50% superior.
· Durante décadas, quando um partido chegava ao
poder colocava pessoas no sector público a troco dos seus votos, acrescentando
de forma insustentável a pandilha estatal.
· O Hospital Evagelismos, um dos
principais de Atenas, por exemplo, chegou a ter 45 jardineiros para
cuidar de quatro jarras na sua entrada; alguns organismos públicos contavam com 50
condutores por carro, um antigo ministro da agricultura criou uma unidade
não contabilizada de 270 pessoas para digitalizar as fotografias das
terras públicas gregas, sem que nenhum dos contratados tivesse experiência na
fotografia digital, pois eram carteiros, cabeleireiros, agricultores e em geral
filiados no partido…
· O gasto em educação, saúde e políticas
sociais, foi de longe a que mais aumentou até ao estalar da crise da
dívida, superando os 31% do PIB em 2012.
· Além disso, a Grécia, essa grande referência da
esquerda radical, era o país da UE quemais dinheiro destinava a gastos
militares antes da crise, com uma média superior a 4% do PIB.
5 – Excesso de funcionários
e ineficiência
O emprego público é, sem
dúvida, um dos grandes paradigmas do desastre grego.
– Durante a bolha, Atenas nem
sequer sabia quantos empregados tinha; os sindicatos estimavam uns 700 mil,
enquanto o governo falava de 800 mil; mas se somarmos os contratos a termo, o
valor superou um milhão de pessoas em 2007, equivalente a 10%
da população e quase 20% da força laboral do país.
– Ganhavam em média 1350 euros
mensais, superando o salário médio existente do sector privado. Mas o relevante
era que o lucro dos funcionários públicos era muito maior: além de receberem 2
salários extra, recebiam bónus e recomendações adicionais citando todo
o tipo de desculpas, como chegar ao trabalho no tempo previsto,
apresentar-se correctamente vestido, usar o computador ou falar línguas. Os
guardas florestais, por exemplo, recebiam um bónus por trabalharem ao ar livre.
– Somando todos esses extras,
os funcionários públicos gregos chegavam a receber de média mais de 70
mil euros anuais, enquanto os alemães recebiam 50 mil euros anuais.
– Mesmo assim, os funcionários
também recebiam uma pensão vitalícia de 1000 euros mensais para
as filhas solteiras de empregados falecidos, entre muitos outros
privilégios e regalias.
– Grécia tinha quatro
vezes mais professores que a Finlândia, o país que melhores notas tinha nos
exames de PISA referentes à qualidade educativa, mas essa superabundância de
docentes só serviu para o país estar entre os piores países com pior
nível de ensino da Europa. Muitos gregos que enviavam os seus filhos
para escolas públicas, tinham que contratar professores particulares de
reforço.
– Outro dado curioso é que na Saúde
Pública a Grécia era a que mais gastava em consumos intermédios,
superando a média da UE, sem que os gregos tivessem mais doentes que os
restantes europeus. Motivo? Um dos muitos escândalos destapados durantes os
últimos anos era a tradição entre médicos e enfermeiros de sair dos hospitais
carregados com todo o tipo de material higiénico e sanitário.
6 – Empresas públicas, o
cúmulo do desperdício
No entanto, para além do
número desproporcionado de funcionários públicos, os seus salários ou a grave
ineficiência dos seus serviços era a sua superdimensionada estrutura
estatal, tendo centenas de empresas, organismos e entidades inúteis. Basta
assinalar alguns exemplos para nos apercebermos do absurdo:
· O salário médio da Renfe
[equivalente da REFER portuguesa] grega, chegou a superar os 70
mil euros anuais, incluindo profissões de baixa qualificação. A sua receita
operacional rondava os 100 milhões de euros anuais, enquanto os seus gastos
superavam os 700 milhões.
· “Há vinte anos atrás, um próspero empresário
chamado Stefanos Manos, nomeado depois ministro das finanças, sugeriu que seria
mais barato colocar todos os passageiros das linhas férreas gregas em táxis –
continua a ser verdade.”, tal como detalha Michael Lewis no seu livro:
“Boomerang: Travels in the New Third World”, onde se explica parte dos excessos
gregos cometidos durante a borbulha.
· O orçamento do metro de Atenas rondava os 500
milhões de euros anuais, e ganhava com a venda de bilhetes apenas 90 milhões.
· A Grécia também criou um comité para gerir o
Lago Kopais, mesmo estando seco desde 1930.
· Após o resgate da Troika, Atenas anunciou a
eliminação ou fusão de 75 organismos públicos, em que trabalhavam mais de 7 mil
pessoas, e que anualmente recebiam cerca de 2700 milhões de euros (uns 386 mil
euros por empregado).
7 – Reformas douradas
Até ao estalar da crise, os
gregos podiam-se reformar pouco depois dos 61 anos, recebendo cerca de 96% do
seu salário, sendo um dos sistemas de pensões mais generoso e insustentável da
UE.
Na Grécia existiam cerca de
600 categorias laborais, que alegando motivos de saúde, poderiam optar pela
reforma antecipada, estabelecida para os homens aos 55 anos e para as mulheres
aos 50 anos. E entre estes últimos beneficiados havia todo o tipo de
profissões, desde cabeleireiros até trompetistas, flautistas, cozinheiros,
massagistas e incluindo apresentadores de TV, entre outros.
Precisamente por isso, os
gregos beneficiavam da maior esperança de vida após a reforma, não por viverem
mais anos, mas por se reformaram antes. Em concreto, ao passo que a média
da OCDE era de 18.5 anos, os gregos disfrutavam de 24 anos da existência
plácida da reforma, sustentada por um crescente volume de dinheiro emprestado
em forma de dívida pública.
Além disso, o controlo sobre a
gestão das pensões era inexistente. Durante a crise, detectaram-se milhares de
familiares que recebiam reforma depois dos seus titulares terem falecido,
ou recebiam certas prestações sem terem direito a elas.
8 – Subornos e evasão
fiscal
A Grécia destaca-se também por
liderar todos os indicadores europeus de evasão fiscal. Antes da crise, um em
cada quatro trabalhadores não pagavam nada de impostos, de modo que os cofres
públicos deixavam de receber entre 15 mil a 20 mil milhões de euros ao ano.
Antes da crise, cerca de 5 mil
gregos declaravam que recebiam mais de 100 mil euros por ano – isto numa
população de quase 12 milhões. Lewis explica no seu livro que dois terços dos
médicos não pagavam um único euro em impostos, pois nos seus rendimentos
declaravam menos de 12 mil euros anuais.
Os subornos estavam na ordem
do dia. Alguns estudos lembram que os gregos gastavam cerca de 800 milhões de
euros em subornos, para evitar o pagamento de multas ou para que os
funcionários fechassem os olhos, incluindo os inspectores fiscais. Para termos
noção, o ministério das finanças despediu, há escassos anos, 70 funcionários
com um ativo imobiliário médio de cerca de 1.2 milhões de euros, quando o seu
salário não superava os 50 mil euros anuais.
Outro dado alarmante é que o
número de trabalhadores por conta própria na Grécia era dos mais elevados da
UE, não por serem especialmente empreendedores, mas pela facilidade de
ocultarem dados do Fisco. Como se isso não bastasse, em anos eleitorais, como
em 2009, a recolha de impostos baixava de forma substancial (cerca de 30% do
PIB), pois os políticos a nível local perdoavam impostos com o objectivo de
arrecadarem votos.
9 – Dívida pública
exagerada
Como consequência desta farra
de gastos e crescimento estatal, o país financiou-se emitindo dívida. A Grécia
foi o país que mais recorreu à dívida privada durante a época da bolha
financeira e com isso a sua factura anual de juros era cerca de 12% da receita
pública até ao 2º resgate (em 2011 antes do resgate, chegou aos 17%), no
entanto na Alemanha o valor era de 6%.
10 – Podem pagar, mas não
querem
Syriza e Podemos reclamam agora
um novo corte da dívida soberana, mesmo que o Estado grego se tenha endividado
voluntariamente para cometer todos os excessos descritos anteriormente – em vez
de a Grécia assumir a responsabilidade e pagar o que deve.
Mesmo que muitos digam que é
impossível, é certo, segundo o BCE, que Atenas possuiu uma enorme carteira de
ativos públicos, estimada em cerca de 300 mil milhões de euros, incluindo
empresas, infraestruturas, ações, participações, solo e todo o tipo de bens. A
Grécia também podia vender ilhas, praias, ouro, e até monumentos, se fosse
necessário, com a meta de cumprir os seus compromissos e evitar o doloroso
estigma da falência e possível saída do euro.
Não seria necessário chegar
tão longe, bastava que Atenas reduzisse o peso do Estado para metade (uns 60
mil milhões de euros) com a privatização das pensões, saúde e educação, e
vendesse 50% dos seus ativos (outros 100 mil milhões por baixo), e a sua dívida
ficaria a cerca de 70% do PIB. Além disto, unido ao compromisso do equilíbrio
das contas públicas (défice zero) e um ambicioso plano de reformas para
liberalizar a economia e baixar os impostos, poderia reduzir ainda mais o seu
endividamento a médio prazo por via do crescimento económico. A Grécia pode
pagar, só que não quer, e tudo indica que não pague.»
Rui Santos, Instituto Ludwig von Mises Portugal, 6-7-2015
Relacionados:
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos.
Se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-