quarta-feira, 22 de julho de 2015

A culpa não é do Tsipras. Nem do Varoufakis

Rui A.
Não se trata de um rebate de consciência pelas malvadezas que tenho vindo a escrever sobre as duas personagens do título. Tão pouco de uma adesão às velhas teorias sociológicas e criminais muito em voga nas décadas de 1960 e 70, segundo as quais a culpa do crime era mais da sociedade (de todos nós) do que dos infelizes dos criminosos que não tínhamos sabido educar.

A questão é outra. Trata-se do facto da «geração Tsipras», à qual pertencem os dois malandrins gregos, ter crescido numa cultura europeia segundo a qual não era necessário haver responsabilidade para que o sucesso e o sossego estivessem garantidos. Na verdade, depois de terem sido fundadas nos bons e sãos princípios liberais da liberdade de comércio que conduz à paz, cedo as Comunidades Europeias assumiram uma deriva «social», segundo a qual lhes competiria a criação de um «modelo social europeu» fundado na convicção de que essas organizações supranacionais, e mais tarde a União, se bastariam a si mesmas para trazerem prosperidade, alegria e felicidade aos povos que as compunham.

A partir da década de 70, as Comunidades, não se bastando com o sucesso do Mercado Comum (ainda em construção, note-se), protegeram o ambiente, o emprego, a saúde, os direitos dos trabalhadores, dos cidadãos europeus, em suma, a felicidade. Para isso, despejaram dinheiro a rodos sobre os estados membro, muito do qual para os estados que agora se encontram em crise, como Portugal e a Grécia. Infelizmente, o Pacto de Estabilidade e Crescimento só viria mais tarde. Quando os estragos já eram imensos.

Em 1963, Barry Goldwater (força aí com as rosnadelas, ó camaradas), escrevia: «O Socialismo através do Assistencialismo cria um perigo muito maior para a liberdade do que o Socialismo através da Nacionalização, precisamente porque é mais difícil de combater. Os males da Nacionalização são evidentes por si próprios e imediatos. Os do Assistencialismo são velados e tendem a ser adiados.

As pessoas são capazes de compreender as consequências da entrega da propriedade da indústria siderúrgica, digamos, ao Estado; e é possível contar que se oponham a tal proposta. Mas aumente o governo a contribuição para o programa de “Assistência Pública” e nós, no máximo, resmungaremos contra as despesas governamentais excessivas. O efeito do Assistencialismo sobre a liberdade será sentido mais tarde – após os seus beneficiários se terem tornado as suas vítimas, após a dependência em relação ao governo se ter tornado servidão e ser tarde de mais para abrir as portas da prisão. (…) É possível que um homem não compreenda imediatamente, ou nunca compreenda, o dano assim causado ao seu carácter. De facto, este é um dos grandes males do Assistencialismo – transformar o indivíduo de um ser espiritual digno, industrioso, auto-confiante, numa criatura animal dependente sem o saber.».

Foi isto que sucedeu na Grécia de Tsipras e Varoufakis. E é por isto, também, que eles reclamam, indignados, por acharem que nada precisam de fazer para manterem o «greek way of life», reclamando a «solidariedade europeia» que subitamente lhes começou a faltar como eles a percebiam. Também eles, à sua medida, são vítimas do assistencialismo de décadas que recaiu sobre a União Europeia. E o Varoufakis até escreve livros sobre o assunto. É um teórico da coisa, que não consegue entender por que raio a coisa que ele teorizou está agora a falhar.
Título e Texto: Rui A., Blasfémias, 21-7-2015

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