Olavo de Carvalho
O caso do Dicionário
crítico do pensamento da direita, que lembrei no artigo “Devotos de um
vigarista”, é somente a figura mais extrema, caricatural e grotesca que o
fenômeno assume no Terceiro Mundo, mas ignorar o pensamento do adversário e
tampar os ouvidos às objeções são hábitos gerais e infalíveis da
intelectualidade esquerdista em toda parte.
Em Thinkers of the New Left
(Harlow Longman, 1985), onde examina os principais expoentes de uma escola de
pensamento que ainda é a mais influente na esquerda hoje em dia, Roger Scruton
observa que nenhum deles jamais deu o menor sinal de querer responder às
críticas feitas à teoria marxista por Max Weber, Werner Sombart, F. W.
Maitland, Raymond Aron, W. H. Mattlock, Böhm-Bawerk, Popper, Hayek ou von
Mises.
Poderia acrescentar Eric Voegelin,
Cornelio Fabro, Rosenstock-Huessy, Norman Cohn, Dietrich von Hildebrand, Alain
Besançon e uma infinidade de outros autores merecidamente tidos também como
clássicos.
No Brasil você não verá nenhum
marxista discutindo as objeções de Gilberto Freyre, Mário Ferreira dos Santos,
J. O. De Meira Penna, Paulo Mercadante, Antonio Paim, Orlando Tambosi, Ricardo
Velez Rodriguez, Gustavo Corção, João Camilo de Oliveira Torres, José Guilherme
Merquior.
O marxismo universitário vive
e prospera de ignorar a cultura universal das ideias e sonegá-la aos
estudantes. Ao mesmo tempo, infunde neles a impressão sedutora e enganosa de
que, por terem lido os autores aprovados pelo Partido, são muito cultos. Trata-se
da forma mais extrema e radical de incultura organizada, da ignorância
obrigatória, da burrice prepotente e intolerante.
Enquanto os anticomunistas de
todos os matizes não cessam de analisar e refutar o marxismo, escrevendo
milhares de livros a respeito, os marxistas fogem sistematicamente ao debate.
Quando não se contentam em baixar sobre os adversários a mais pesada cortina do silêncio, dedicam-se a difamá-los pelas costas, inventando a respeito as histórias mais escabrosas, tratando-os como criminosos, colocando-os em “listas de inimigos” e cumprindo à risca a regra de Lenin: não discutir com o contestador, mas destruí-lo politicamente, socialmente e, se possível, fisicamente.
Que maior prova se poderia
exigir de que essas pessoas, que se atribuem o monopólio de todas as virtudes,
são as mais perversas, malignas e desprezíveis que já infestaram a profissão
intelectual?
A ascensão da escória marxista
ao primeiro plano da vida nacional foi e é a causa principal ou única da
destruição da cultura superior e do sistema educacional no Brasil.
Com ares de escândalo e
indignação, a Folha noticia a descoberta de um plano do governo militar,
concebido pelo ministro Alfredo Buzaid nos anos 1970, para refrear a
infiltração comunista nas universidades e órgãos de mídia. O plano não foi
levado a efeito, tanto que a era dos militares foi o período de maior
prosperidade da indústria do livro esquerdista no Brasil e a época da conquista
da mídia pelos comunistas.
Mas o jornal do sr. Frias não
perdoa nem a simples ideia. Que horror, que coisa mais tirânica, mais nazista,
pensar em impedir o acesso dos comunistas a todas as cátedras, a todas as
páginas de jornais, a todos os megafones!
O que o sr. Frias e seus
empregados fingem ignorar é que aquilo que a ditadura quis fazer e não fez é
exatamente o que os comunistas já fizeram e que já está em plena vigência neste
país, com uma amplitude e uma rigidez que ultrapassa tudo o que os militares
pudessem ter sonhado em matéria de controle hegemônico dos canais de
comunicação e ensino.
As gerações mais novas, que
não conheceram o Brasil dos anos 1950-1960, já nasceram dentro dessa atmosfera,
que lhes parece normal, e não notam a diferença.
Mas um simples detalhe basta
para mostrar o que aconteceu: o ponto de vista cristão-conservador, que era
oficialmente o do Estadão, do Globo e parcialmente da própria Folha
naquela época, está totalmente excluído, proibido e criminalizado em toda a
mídia.
Os editoriais escritos pelos
srs. Roberto Marinho e Júlio de Mesquita Filho jamais poderiam ser publicados,
hoje, nos próprios jornais que esses homens fundaram, onde o máximo que se
permite, num espacinho minoritário, é um pouco de liberalismo chocho e
inofensivo, quando não a pura crítica de esquerda a algum desmando ou patifaria
mais vistosa do governo petista.
Se até essa oposição mole e
parcial é hoje abertamente condenada como “extremismo de direita”, é notório
que a medida geral de aferição mudou, e quem a mudou foi a própria mídia.
E se jornais e canais de TV
dão alguma cobertura à srta. Yoani Sanchez, é precisamente porque esta é
anticastrista sem ser anticomunista e suas críticas ao governo cubano são
brandas e autocensuradas em comparação com as de outros dissidentes, que contam
a história inteira. Estes jamais aparecerão em O Globo ou na Folha.
E alguém é capaz de imaginar, hoje em dia, uma novela da Globo defendendo os
valores cristãos que eram tão caros ao sr. Roberto Marinho?
Por que uma simples intenção
não realizada do governo militar deveria ser considerada mais repugnante e
assustadora do que o fato consumado, a mesmíssima intenção realizada em muito
maior escala pela esquerda triunfante e dominadora, senhora absoluta das
páginas da própria Folha?
A simples redação dessa mesma notícia já não revela a inversão de critérios, imposta como norma universal e inquestionável que só loucos e extremistas ousariam contestar? O sr. Frias não sabe ler o seu próprio jornal? Não enxerga que ele mesmo foi, em pessoa, um dos artífices do plano do ministro Buzaid realizado com signo oposto?
Título e Texto: Olavo de Carvalho, Diário do Comércio, 11 de março de 2013, in “o mínimo que você precisa saber para não ser um idiota”, páginas 314/316Digitação: JP, 5-1-2021
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