quarta-feira, 22 de março de 2023

O que os cidadãos não sabem

Jason Brennam

Quando se trata de política, algumas pessoas sabem muito, a maior parte das pessoas não sabe nada, e muitas pessoas sabem menos que nada.

É possível que esteja convencido – com base em episódios vividos e em experiências pessoais – de que os votantes não sabem muito. Mas, se não estiver familiarizado com as estatísticas, há uma forte probabilidade de que lhes atribua demasiado crédito e as suas experiências pessoais sejam enganadoras.

Quando lhe pedem que pense sobre votantes não informados, provavelmente lembra-se dos seus conhecidos ou familiares mais ignorantes. No entanto, por estar a ler este livro, posso supor que tem, ou terá em breve, pelo menos uma licenciatura. Mesmo que frequente uma universidade de segunda linha, os seus colegas continuarão a constituir a elite intelectual da sua nação.

O leitor, os seus amigos, os seus familiares e conhecidos estão provavelmente pelo menos no grupo dos dez por cento mais informados do seu país.

Nos anos 40 e 50, vários investigadores da Universidade de Columbia e da Universidade do Michigan começaram a catalogar o que os cidadãos comuns sabem e não sabem sobre política. Os resultados foram deprimentes.

Como resume o politólogo Philip Converse, “As duas verdades mais simples que conheço sobre a distribuição da informação política nos eleitorados modernos são que a média +e baixa e a variância elevada.

Somin, autor de Democracy and Political Ignorance, refere: “A enorme profundidade da ignorância da maioria dos votantes individuais é chocante para muitos observadores não familiarizados com os estudos.” Na sua ampla revisão de literatura empírica sobre o conhecimento dos votantes, Somin conclui que pelo menos 35% são “totalmente ignorantes”, (realço votantes porque nem todas as pessoas votam, e as pessoas que escolhem não votar tendem a saber menos que as que escolhem votar).

O politólogo Larry Bartels observa que “a ignorância política do votante americano é uma das características mais bem documentadas da política contemporânea”.

O teórico político Jeffrey Friedman acrescenta: “O público é de longe mais ignorante que os acadêmicos ou os jornalistas observadores do público se apercebem.”

O  politólogo John Ferejohn concorda: “Nada afeta o estudioso de opinião pública e da democracia mais vigorosamente que a escassez de informação que a maioria das pessoas possui sobre política.”

Poderia escrever um livro inteiro apenas a documentar o pouco que os votantes sabem, mas, dado que muitos outros já o fizeram, apresentarei apenas alguns exemplos:

· Em anos de eleições, a maior parte dos cidadãos não consegue identificar nenhum dos candidatos do seu distrito ao Congresso.

·  Geralmente os cidadãos não sabem que partido controla o Congresso.

· Imediatamente antes da eleição presidencial de 2004, quase 70% dos cidadãos norte-americanos desconheciam que o Congresso tinha adicionado um benefício de prescrição de medicação ao Medicare, ainda que isto representasse um aumento gigante no orçamento federal e constituísse o maior novo programa de direitos desde que o presidente Lyndon Johnson iniciou a Guerra à Pobreza.

·  Na eleição presidencial intercalar de 2010, apenas 34% dos votantes sabiam que o Troubled Asset Relief Program, (Programa de Compra de Ativos Tóxicos) fora promulgado durante a administração de George W. Bush, e não na de Barak Obama. Apenas 39% sabiam que a defesa foi a maior categoria de dispêndio discricionário no orçamento federal.

· Os americanos sobrestimam muito o montante monetário despendido em ajuda externa; muitos estejam erradamente convencidos de que podemos reduzir de modo significativo o défice cortando nessa componente.

· Em 1964, apenas uma minoria dos cidadãos sabia que a União Soviética não era membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (sim, é mesmo isso: a OTAN, uma aliança criada para se opor à União Soviética).  É de salientar que tal se verificou apenas pouco tempo após a crise dos mísseis em Cuba, durante a qual os Estados Unidos quase entraram numa guerra nuclear com a URSS.

·  73% dos americanos desconhecem o que foi a Guerra Fria.

· A maior parte dos americanos não sabe, nem mesmo aproximadamente, que montantes são despendidos em segurança social ou que percentagem do orçamento federal isso representa.

· 40% dos americanos não sabem contra quem os Estados Unidos combateram na Segunda Guerra Mundial.

· Durante a eleição presidencial de 2000 nos Estados Unidos, embora um pouco mais de metade dos americanos soubessem que Al Gore era mais liberal que Bush, não pareciam compreender o significado da palavra liberal. 57% sabiam que Gore era a favor de um nível de despesa mais elevado que Bush, mas significativamente menos de metade sabiam que Gore era maior apoiante do direito ao aborto e dos programas do estado social, favorecia um nível mais elevado de ajuda aos negros, ou era mais adepto da regulamentação ambiental. Apenas 37% sabiam que o dispêndio federal direcionado à pobreza tinha aumentado ou que o crime havia diminuído nos anos 90. Em relação a estas questões, os americanos fizeram pior do que atirar uma moeda ao ar. Ocorreram resultados similares noutros anos eleitorais.

Isto é uma amostra. Poderia continuar a documentar tal ignorância ao longo de centenas de páginas. Contudo, como referi, outros já o fizeram em pormenor. Em resumo, os votantes geralmente sabem quem é o presidente, mas não sabem muito mais do que isso.

(…)

Título e Texto: Jason Brennan, in “Contra a Democracia”, Editora Gradiva, 2020, páginas 43/46.
Digitação: JP, 22-3-2023

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