Colunista do DIÁRIO DO RIO fala sobre uma audiência acalorada sobre operações em comunidades
Jackson Vasconcelos
A Maré não está para peixe. No
dia 28, o Senador e Ministro da Justiça, Flávio Dino, governador do Maranhão
durante oito anos, compareceu à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara
dos Deputados, para uma audiência acalorada, como são as audiências entre
Ministros e oposição. Os representantes do governo bajulam e os da oposição
batem duro. Como o decoro parlamentar é do tempo das cavernas, as agressões são
deselegantes, como se viu quando os ministros do Presidente Bolsonaro
compareceram lá.
O deputado Ramagem, da oposição, destacou-se pela elegância sem perder a verve. Ele agradeceu a presença do ministro, e o arguiu com um preâmbulo necessário, que passou pelo tempo das Unidades de Polícia Pacificadora, UPPs e pelo aparato policial utilizado pelo governo da época para entrar no Complexo da Maré, um conjunto de 16 favelas. O deputado Ramagem questionou: “Se a sua visita, Ministro, teve um objetivo pacificador, vamos crer, na ordem, no amparo da lei, o senhor conseguiu a extinção do tráfico ali? Quando será? O senhor conseguiu tratar do cumprimento de centenas de mandados de prisão judiciais em aberto na localidade? Lá se concentra o maior poderio bélico ilegal nas mãos dos criminosos. O senhor conseguiu a entrega pacífica desses armamentos?”
O Ministro saiu pela tangente,
debochado e deselegante: “Eu vi um deputado. Acho que esse senhor aqui… Amagem…
Ramagem”, enquanto atrás dele o ex-deputado Wadih Damous tentava ajudar, mas o
Ministro continuou: “Amagem”, olhou para o lado e foi corrigido pelo Presidente
da Comissão… ”Ramagem…” e completou… ”Eu não entendi se o senhor está
perguntando ou afirmando. Eu posso afirmar ao senhor que eu fui convidado por
algumas entidades…” e seguiu em frente sem responder, passando a ideia de que
essa história de tráfico, armamentos ilegais e coisas tais é papo de
preconceito.
A gente sabe que não é.
As comunidades no Rio de
Janeiro têm leis próprias impostas por criminosos, porque eles possuem armas e
as polícias e a Justiça já estão vencidas por antecipação. É uma situação grave
a ponto de ter desmoralizado as UPPs, as Forças Armadas e todos os governos do
estado e federal. A ponto também de deixarem fora da gestão do Prefeito do Rio,
uma parte considerável do território carioca.
A situação só não é pior,
porque a “banda boa” das comunidades está em maioria e por si mesma tem se
virado como pode. Há trabalhadores, há empreendedores, uma economia
pujante…existe gente do bem sacrificada pela presença do crime armado. O nível
de organização das pessoas de bem produz dados sobre a vida nas comunidades. No
Complexo da Maré existe a “Redes da Maré”, que publica, periodicamente, um
boletim sobre segurança pública. Ele está na sétima edição: “Direito à
Segurança Pública na Maré 2022”. Eis alguns dados (2022): Vamos lá:
1.
27 operações policiais ocorreram nas 17
favelas.
2.
8 confrontos entre grupos armados.
3.
39 mortes causadas por armas de fogo
4.
283 violações de direitos
5.
15 dias de atividades suspensas nas escolas
6.
19 dias sem atividades de saúde.
7.
Das 27 mortes em operações policiais ocorridas
nas 16 favelas da Maré, 24 tiveram indícios de execução e em nenhuma delas foi
identificada perícia dentro dos parâmetros normativos.
8.
O ano de 2022 apresentou o maior número de
mortes em operações policiais dos últimos três anos, com aumento de 145% em
comparação ao ano anterior.
O Boletim tem 24 páginas de
informações e dados e acredite-se ou não nos números, a situação identificada
pela própria comunidade mostra que o deputado Alexandre Ramagem sabe o que diz
quando se refere ao Complexo da Maré, enquanto o Ministro da Justiça tenta
passar a imagem de que nada, rigorosamente nada, nas informações do Boletim é
verdade e que as reclamações do deputado são rabugices
preconceituosas.
Deixo o julgamento com
vocês.
Título e Texto: Jackson
Vasconcelos, Diário do Rio, 29-3-2023
Maré: a favela de todas as facções armadas que a polícia ainda não conseguiu tomar
Exclusivo: vídeos mostram criminosos andando armados no Complexo da Maré, no Rio
Operação da PM termina com dois mortos e fecha cinco unidades de saúde no Complexo da Maré, Rio
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não aceitamos/não publicamos comentários anônimos.
Se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-