Leonardo Desideri
Na última terça-feira (14), completou três anos o inquérito das fake news (4781), marco da mão de ferro do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a liberdade de expressão no Brasil. Ainda em andamento, essa investigação e os inquéritos que dela derivaram são um labirinto jurídico com diversos desdobramentos, zonas secretas e armadilhas semânticas, sem nenhum desfecho à vista.
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Alexandre de Moraes, foto: Carlos Alves Moura/STF |
Na lista das investigações do
STF que, desde março de 2019, ameaçam impor freios à livre manifestação no
Brasil estão o chamado inquérito dos "atos antidemocráticos" (4828),
arquivado em julho de 2021 para abrir espaço ao inquérito das milícias digitais
(4874); o inquérito dos "atos ilegais e antidemocráticos"
relacionados ao 7 de setembro de 2021 (4879); o inquérito que alega investigar
a propagação de notícias falsas sobre a Covid-19 (4888); e o mais recente
deles, que busca a "responsabilidade intelectual" dos atos do dia 8
de janeiro (4921).
Os últimos quatro mencionados,
assim como o inquérito das fake news, continuam em andamento. Na definição dos
escopos desses inquéritos, há insistência no uso de termos indefinidos que
podem dar vazão ao arbítrio do juiz, como "fake news", "atos
antidemocráticos" e "responsabilidade intelectual".
Advogados de investigados
ressentem a falta de acesso à íntegra dos autos dos inquéritos – conforme
noticiou a Gazeta do Povo em diversas ocasiões, eles relatam só ter acesso a
partes dos autos, apresentadas de forma desconexa. Por lei, o acesso à íntegra
dos autos é prerrogativa de advogados de defesa, conforme garantem o artigo 133
da Constituição e o artigo sétimo do Estatuto da Advocacia.
Relator
de todos os inquéritos mencionados, o ministro do STF Alexandre de Moraes garante que os pedidos dos advogados já foram
atendidos. Em novembro de 2022, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB), Beto Simonetti, enviou ofício a Moraes pedindo a liberação do
acesso integral aos autos para os advogados dos investigados nos inquéritos
4781 e 4874.
Alessandro Chiarottino, professor de Direito Constitucional e doutor em Direito pela USP, explica que, embora certa restrição na publicidade de inquéritos seja justificável, é imprescindível que ao menos os advogados de defesa tenham acesso integral a todos os autos da investigação. "É verdade que o inquérito tem uma natureza diferente do processo. O processo está submetido ao princípio da publicidade de uma forma ampla, o que não acontece com o inquérito, em que há um procedimento investigativo. Agora, o advogado precisa, sim, ter acesso", ressalta.
O especialista destaca ainda
os problemas de origem do inquérito das fake news e seus desdobramentos, como a
controversa aplicação do artigo 43 do regimento interno do STF, a violação ao
sistema acusatório e a falta de tipificação no Código Penal de algumas das
matérias investigadas – explicados com detalhes neste artigo da colunista da
Gazeta do Povo Thaméa Danelon. "Essas contradições, que são múltiplas,
acabam levando realmente a uma confusão e até a certo constrangimento da classe
jurídica", diz.
Marcelo Rocha Monteiro, procurador de Justiça do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), também afirma que o inquérito das fake news é "ilegal já na origem". "No que chamamos de sistema acusatório, adotado pela Constituição de 1988, o Judiciário não pode exercer a função investigatória, que é própria da polícia. Isso porque a investigação antecede o processo, e o juiz não pode iniciar sua atuação no processo já com uma ideia preconcebida dos fatos que vai julgar ao final do processo", diz.
Prorrogação
"ad infinitum" das investigações gera preocupação
Segundo a Folha de S.Paulo,
integrantes do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) apostam que o ministro
Alexandre de Moraes manterá o inquérito das fake news aberto pelo menos até que
Augusto Aras, atual procurador-geral da República, deixe o cargo, o que deve
ocorrer em setembro. A avaliação é de que Aras seria simpático a apoiadores de
Bolsonaro e poderia arquivar conclusões do inquérito sem oferecer denúncias. O
PGR, no entanto, já contrariou essa tendência diversas vezes.
Para juristas consultados pela
Gazeta do Povo, a prorrogação das investigações por anos a fio não é ilegal em
si mesma, mas é pouco usual, e se torna grave diante das inconstitucionalidades
dos inquéritos. Um dos problemas da demora na conclusão das investigações pode
ser o envolvimento excessivo do investigador no caso, a ponto de que ele
consolide uma opinião durante esse tempo.
Segundo Rocha Monteiro, isso
se agrava pelo fato de que o investigador, no caso dos inquéritos do STF, é o próprio
juiz, que terá uma visão formada sobre o caso antes mesmo do começo do
processo. "É evidente que aquele que passa dias – ou meses, às vezes mais
de um ano – investigando um fato ao longo de um inquérito vai
inevitavelmente formar uma opinião sobre esse fato ao final da investigação –
ou seja, antes de o processo se iniciar", afirma.
Para Chiarottino, a
prorrogação sem limites dos inquéritos pode acabar evidenciando ainda mais as
suas inconstitucionalidades, à medida que as controvérsias políticas que
motivaram as investigações se tornem um tema do passado.
"Todos esses inquéritos
foram iniciados e avançaram em um momento de grande polarização, de grande
turbulência política, no qual o Judiciário claramente escolheu um lado. No
momento atual, o STF não tem mais aquela função de defesa de um lado contra o
outro. Agora, quando a situação política está mais serena, porque o líder da
oposição está fora do país, devem ficar mais evidentes os absurdos, as
incorreções, as ilegalidades e as inconstitucionalidades desses
inquéritos", observa.
Quais
são os inquéritos do STF relacionados à liberdade de expressão e quem é
investigado
Inquérito das fake news (nº
4781). Relator: Alexandre de Moraes.
Aberto em março de 2019. Em andamento. Sigiloso. Alguns dos investigados:
Abraham Weintraub; Allan Lopes dos Santos; Bernardo Pires Kuster; Edgard Gomes
Corona; Edson Pires Salomão; Eduardo Fabris Portella; Enzo Leonardo Suzi
Momenti; Jair Bolsonaro; Luciano Hang; Marcelo Stachin; Marcos Dominguez
Bellizia; Otavio Oscar Fakhoury; Paulo Gonçalves Bezerra; Rafael Moreno;
Reynaldo Bianchi Junior; Roberto Jefferson; Rodrigo Barbosa Ribeiro; Sara
Fernanda Giromini; Winston Rodrigues Lima.
Inquérito dos "atos
antidemocráticos" (nº 4828). Relator:
Alexandre de Moraes. Aberto em abril de 2020. Arquivado em julho de
2021. Alguns dos investigados: Adilson Nelson Dini; Alessandra da Silva
Ribeiro; Aline Sleutjes; Allan Lopes dos Santos; Alberto Junio da Silva; Arolde
de Oliveira; Beatriz Kicis Torrents de Sordi; Camila Abdo Leite do Amaral
Calvo; Carla Zambelli Salgado; Caroline Rodrigues de Toni; Daniel Lucio da
Silveira; Elieser Girao Monteiro Filho; Emerson Teixeira de Andrade; Ernani
Fernandes Barbosa-Neto; Evandro de Araujo Paula; Fernando Lisboa da Conceição;
Geraldo Junior do Amaral; Jose Luiz Bonito; Luis Felipe Belmonte dos Santos;
Marcelo Frazao de Almeida; Marilza Gomes Eustáquio Shibata; Oswaldo Eustaquio
Filho; Otavio Oscar Fakhoury; Otoni Moura de Paulo Junior; Sandra Mara Volf
Pedro Eustáquio; Sara Fernanda Giromini; Sergio Ferreira de Lima Junior; Thais
Raposo do Amaral Pinto Chaves; Valter Cesar Silva Oliveira; Walter Luiz Bifulco
Scigliano.
Inquérito das milícias
digitais (nº 4874). Relator: Alexandre de Moraes.
Aberto em julho de 2021. Público. Em andamento. Alguns dos investigados:
Afrânio Barreira Filho; Allan Lopes dos Santos; Fábio Wajngarten; Ivan Wrobel;
Jair Bolsonaro; Luciano Hang; Marco Aurélio Raymundo; Oswaldo Eustàquio; Otavio
Oscar Fakhoury; Sara Fernanda Giromini.
Inquérito do 7 de setembro
(nº 4879). Relator: Alexandre de Moraes.
Aberto em agosto de 2021. Sigiloso. Em andamento. Alguns dos investigados:
Alexandre Urbano Raitz Petersen; Anderson Torres; Antônio Galvan; Bruno
Henrique Semczeszm; Eduardo Oliveira Araújo; Fábio Augusto Vieira; Ibaneis
Rocha; Juliano da Silva Martins; Otoni Moura de Paulo Junior; Sérgio Reis;
Turíbio Torres; Wellington Macedo de Souza; Zé Trovão.
Inquérito das falas sobre a
Covid-19 (nº 4888). Relator: Alexandre de Moraes.
Aberto em dezembro de 2021. Público. Em andamento. Alguns dos investigados:
Jair Bolsonaro; Mauro Cesar Barbosa Cid; Victor Neves Feitosa Campos.
Inquérito da
"responsabilidade intelectual" dos atos do dia 8/1 (nº 4921). Relator: Alexandre de Moraes. Aberto em 13 de
janeiro de 2023. Em andamento. Sob segredo de Justiça. Investigado conhecido:
Jair Bolsonaro. Observação: o inquérito corre em sigilo e não está claro se há
outros investigados pela "autoria intelectual" dos atos do dia 8/1
além do ex-presidente Bolsonaro.
Título e Texto: Leonardo
Desideri, Gazeta do Povo, 17-3-2023, 21h
Não sei porquê, me lembrei da capa do jornal português "Público"...
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Jornalismo ou Canalhice?
Divulgue a canalhice
FOTO LEGENDADA DO MI"SI"NISTRO ALEXONGAGUE DE MORRAES ACIMA:
ResponderExcluir- Ver essa desgraça logo cedo e melhor dar de cara com o Diabo. Pelo menos o Capeta não mostra a cara.
Aparecido Raimundo de Souza
de Vila Velha ES