Humberto Pinho da Silva
Estava mergulhado em fofa poltrona cor de palha,
assistindo a movimentada novela, daquelas que são produzidas para inculcarem
nefastas ideologias e fomentar a malfadada Nova Moral, quando assaltou-me um
sono imperioso.
Enfastiado, peguei na "Vida de Frei Bartolomeu dos Mártires", de Frei Luís de Sousa, livro que repousava esquecido sobre o regaço, para possível releitura.
Abri-o ao acaso, folheei-o, e deparo com a
seguinte texto, que despertou a indolência preguiceira:
"Dura jurisdição, por não dizer
tirania, exercita hoje muitos pais, sobre as condições e natureza dos filhos.
Em nascendo, já fazem a um clérigo, a outro frade, a outro soldado; de
espreitar a inclinação e jeito que cada um tem para as cousas, não há tratar.
Assim fica mal letrado o que fora bom sapateiro, e não é bom soldado o que fora
um religioso”, Livro
1, Cap. II.
Esse parecer fez-me recordar senhora, com dois
filhos, que visitava a casa de meu pai, logo lhes talhou o destino: um seria
doutor, outro, padre.
Se o médico foi excelente clínico, o padre, não
digo que fosse mau sacerdote, mas ordenou-se sem vocação. Duvido que fosse
feliz.
Ouço, por vezes, mães asseverarem rijamente:
"Quero que meu filho seja o que eu nunca fui!", como se o filho não
tenha o direito incontestável de escolher livremente a vocação e o destino.
Conheci, também, no Porto, costureirinha que casou com pequeno industrial. Eram pais de garotinha esperta e inteligente. Certo dia alguém lhe recomendou que durante as férias escolares colocasse a menina a trabalhar na empresa, para melhor conhecer a fábrica, que um dia seria sua.
Abespinhou-se indignada, declarando quase irada:
"Minha filha não tem necessidade de trabalhar. Será doutora!"
Cai bem aqui, igualmente, o que escutei quando era
rapazote, a senhora de fartos bens: que a filha havia de casar com um médico,
porque dinheiro já o tinha, faltava-lhe ter médico na família!...
No tempo que corre, frequentam a Universidade
muitos jovens, porque seus pais exercem a tirania (para usar o termo de Frei
Luís de Sousa,) para saciarem o prazer de terem filho doutor.
Aconselhem a criança, mostrem-lhe a vantagem de
prosseguirem nos estudos, mas deixem-na escolher livremente a profissão. Caso
contrário, teremos médicos que seriam excelentes advogados e professores que
seriam ótimos agrónomos.
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva,
março de 2023
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