Ou: Uma OAB covarde vai à
Justiça contra Fidelix; uma OAB corajosa iria à Justiça contra Dilma Rousseff.
Ou: De Gays e cabeças cortadas
Reinaldo Azevedo
Imaginem se, um dia, se
votasse uma lei no Brasil ou em qualquer parte do mundo proibindo as pessoas de
ser imbecis e de dizer imbecilidades. Quanto tempo vocês acham que demoraria
para que se chegasse a uma tirania das mais odiosas? Levy Fidelix (PRTB), o
eterno candidato do aerotrem, disse uma porção de sandices sobre
homossexualidade no debate da Record? Disse. É a única tolice que afirmou nessa
campanha? Não! Justiça se faça, ele nem chega a ser o campeão das asnices —
Luciana Genro, do PSOL, vence essa disputa com todos os pés nas costas, num
confronto acirrado com Eduardo Jorge, do PV. A maior de todas, ainda que dita
em solo estrangeiro, é a de Dilma Rousseff: pregou a negociação com terroristas
que cortam cabeças e praticam fuzilamentos e estupros em massa.
Muito bem. No debate da
emissora, Luciana perguntou a Fidelix por que defensores da família se recusam
a reconhecer como família um casal do mesmo sexo. O homem do PRTB afirmou o que
segue no vídeo:
Trata-se de um apanhado de
bobagens? Não resta a menor dúvida. Mas há crime? Ora, tenham a santa
paciência! Tanto os demais debatedores não entenderam assim que ninguém reagiu
— nem a própria Luciana. Na democracia, reitero, existe espaço para as opiniões
idiotas. Leiam o que disse Fidelix Reproduzo aspas:
– “dois iguais não fazem filho”;.
– “aparelho excretor não reproduz”;
– “como é que pode um pai de família, um avô, ficar aqui, escorado (?), com medo de perder voto? Prefiro não ter esses votos, mas ser um pai, um avô, que tem vergonha na cara, que instrua seu filho, que instrua seu neto.”
– “eu vi agora o papa, o Santo Padre, expurgar, fez muito bem, do Vaticano um pedófilo”.
– “que façam um bom proveito se quiserem fazer de continuar como estão, mas eu, presidente da República, não vou estimular. Se está na lei, que fique como está, mas estimular, jamais!, a união homoafetiva”.
– “Luciana, o Brasil tem 200 milhões de habitantes. Se começarmos a estimular isso aí, daqui a pouco vai reduzir para 100 [milhões]. Vai para Paulista, anda lá e vê. É feio o negócio, né?”
– “esses que têm esses problemas, que sejam atendidos no plano afetivo, psicológico, mas bem longe da gente, porque aqui não dá”.
Observem que ele nem mesmo diz
que pretende mudar a legislação se eleito — coisa que nunca será. Apenas
assegura que, se presidente fosse, não estimularia a união homoafetiva. Cadê o
crime? Fidelix também entende que sexo tem como fim a procriação. Eu acho que
ele está errado, mas me parece que tem direito a uma opinião, não é mesmo?
Fidelix também tece considerações sobre as funções do, como ele diz, “aparelho
excretor”. E daí? Revejam o vídeo. Os presentes riram de escárnio. Ninguém
reagiu como se ele estivesse cometendo um crime. E, de fato, não estava.
Mas aí entra em cena a
militância gay. Olhem, até acho admirável a prontidão dessa turma. Não há grupo
no Brasil tão organizado e tão presente na imprensa. Teve início o processo de
demonização de Fidelix. Os presidenciáveis, que se calaram quando ele disse as
suas sandices, foram unânimes, depois, em condená-lo. A campanha de Marina
Silva diz que estuda até mesmo recorrer à Justiça. Ou por outra: tenta usar a
questão para se livrar da pecha de homofóbica que lhe pespegou o PT. Dito ainda
de outro modo: os marineiros acham que Fidelix pode ser a sua Marina da hora.
Dilma vai se encontrar hoje com lideranças do movimento LGBT. Eduardo Jorge,
que defende a descriminalização do aborto e das drogas, já entrou com uma
representação contra Fidelix. A OAB pede a cassação da candidatura do homem por
homofobia.
Não dá! A fala de Fidelix é
imbecil, sim, mas é criminosa? Gostaria de ler a argumentação da OAB e saber em
que lei se ampara, especialmente porque Fidelix disse que, se eleito, deixaria
tudo como está.
Acho esse um péssimo caminho
da militância — de gays ou quaisquer outras. Vejam o quanto a causa avançou
nesses anos, inclusive com o reconhecimento da união civil contra a letra da
Constituição — fato inédito na nossa história e na história das democracias. E
ninguém precisou ser levado aos tribunais por crime de opinião para que isso
acontecesse.
Sim, ouçam de novo ou releiam
a fala de Levy. Dizer uma bobagem tem de ser diferente de praticar um crime.
Uma fala como essa não geraria celeuma em nenhuma democracia do mundo, mesmo
naquelas severamente patrulhadas pelos politicamente corretos. A razão é
simples: a liberdade de expressão é um valor intocável. A menos que seja usada
para incitar a prática de crimes. Não me parece que seja o caso deste senhor.
De resto, que país este, não?
A candidata-presidente, que, segundo os institutos de pesquisa, está na faixa
dos 40% dos votos no primeiro turno e lidera a disputa para o segundo, pede que
a ONU sente com terroristas facinorosos para negociar. A OAB se calou. Não deve
ter visto nada de errado. O candidato do traço, que tem muito folclore e
nenhuma história, emite uma opinião infeliz, e todos avançam contra ele
tentando tirar uma casquinha.
Não contem comigo para criminalizar
opiniões. Até que alguém me prove o contrário com a Constituição nas mãos, um
brasileiro é livre para fazer digressões sobre o aparelho excretor ou para
dizer que, se eleito, não promoverá o casamento gay. Já o presidente da
República Federativa do Brasil NÃO É livre para pregar a negociação com
terroristas. Sabem por quê? O mesmo Artigo 5º que assegura a liberdade de
expressão — e lá não está escrito que as pessoas são livres apenas para dizer
coisas certas e com as quais concordamos — repudia o terrorismo.
Uma OAB covarde recorre à
Justiça contra o nanico Levy Fidelix. Uma OAB que fosse corajosa teria
recorrido à Justiça contra a gigante Dilma Rousseff. Eu ainda acho que
progressista mesmo é enfrentar os fortes, não fazer fama contra os fracos.
*
*
PS:
Eu estou debatendo aqui estado de direito, patrulha politicamente correta,
liberdade de expressão, liberdade de opinião etc. Quaisquer intervenções que
fujam desse paradigma não serão publicadas. Militância gay ou militância
antigay devem buscar os canais adequados para se expressar. Não é o meu blog.
Não arbitro sobre a sexualidade de ninguém. Cada um na sua, desde que não seja
sexo forçado, com crianças ou com pessoas que não podem fazer suas
próprias escolhas. Também excluiria os bichos. Apoio casamento gay e adoção de
crianças por pares homossexuais. Eu não apoio é censura, patrulha, agressão ao
Estado de direito, covardia e oportunismo.
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