Que tal, nos seus quase 81 anos de idade, o ex-presidente Michel “Fora” Temer? Na mesma linha, foram capazes de ressuscitar o senador Tasso Jereissati
J. R. Guzzo
Uma das ideias fixas
preferidas do noticiário político do momento é descobrir, em algum canto do
Brasil, um “Joe Biden” brasileiro, capaz de arrumar uns 70 milhões de votos, ou
por aí, e derrotar o presidente Jair Bolsonaro nas eleições do ano que vem –
como se um Biden, aquele que está em Washington, já não fosse mais do que
suficiente para as necessidades atuais da humanidade. O que se vai fazer? Biden
virou, para os altos mestres da ciência política, o presidente ideal para
qualquer país do mundo de hoje – procura-se, desesperadamente, um Biden
paraguaio, um Biden esquimó, e por aí vamos. Por que não, nesse caso, um Biden
brasileiro? É onde viemos parar.
Os Bidens made in Brazil, até
agora, incluem alguns dos nomes mais inesperados, ou francamente esquisitos,
que alguém poderia imaginar; na verdade, pelo jeito como vão as coisas, e com
um mínimo de trato, qualquer um pode ser um Biden brasileiro hoje em dia. Por
exemplo: que tal, nos seus quase 81 anos de idade, o ex-presidente Michel “Fora”
Temer? Acredite se quiser, mas ele é um dos personagens citados na galeria de
possíveis candidatos à posição de salvador do Brasil em 2022. Na mesma linha,
foram capazes de ressuscitar um político cearense do qual não se falava
seguramente há anos, talvez nem no Ceará – o senador Tasso Jereissati. E o
atual presidente do Senado Federal, então? A soma total de suas realizações,
até agora, teria sido uma visita do ex-presidente Lula – mas acabou não
rolando.
Sumiram de vista e das listas de Biden brasileiro, como numa miragem, gente como o governador João Doria, o apresentador de televisão Luciano Huck e, por mais surpreendente que possa ter sido a lembrança do seu nome, o ex-futuro presidente reeleito da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, que caiu em exercício findo depois que o seu projeto presidencial virou suco; não deu certo nem na Câmara. Até algum tempo atrás, eram citados entre as grandes esperanças de um Brasil de centro, civilizado e social-democrata. Hoje, coitados, ninguém se lembra mais deles – ficaram para trás, imaginem, até do senador Tasso.
O mais curioso dessa história
toda é que, apesar de continuar a intensa procura pelo nome mágico, o Biden
brasileiro já foi encontrado há pelo menos dois meses inteiros – é o
ex-presidente Lula. Desde o último dia 8 de março, quando o ministro Fachin,
com o apoio em massa do STF, anulou de uma vez só as quatro ações penais contra
Lula, inclusive a sua condenação em terceira e última instância pelos crimes de
corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o ex-presidente passou a ser o
candidato único da oposição a Jair Bolsonaro. É ele e ninguém mais. Podem ficar
procurando, pelo resto da vida, um candidato “contra os extremos” – não vão
encontrar e, aí, o antiextremista vai ser Lula. É a velha história: se não tem
tu, vai tu mesmo.
Tanto faz o que aconteça com
Lula em sua campanha. É 100% certo de que ele será apresentado como um fenômeno
de equilíbrio, moderação e bondade – um Biden para ser elogiado pelo próprio
Joe Biden. Mais cedo ou mais tarde vai cair a ficha indicando que só Lula pode
disputar as eleições de 2022 com chance real de vitória. Desse momento em
diante, todos vão fazer de conta que não há nada de errado em colocar na
Presidência da República um político legalmente condenado pela Justiça como ladrão.
Ele vai ser o homem do “centro”; tudo resolvido.
Lula é a garantia que nada
mudará no Brasil velho que manda na vida pública. É bom para 99% do mundo
político, da elite e de todos aqueles, das empreiteiras de obras às estrelas do
Petrolão, cujo maior sonho é deixar errado tudo o que está errado.
Título e Texto: J. R. Guzzo,
Estado de S. Paulo, via revista Oeste, 16-5-2021, 18h03
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