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Luís Naves
Muitos emigrantes portugueses
na Europa votaram no Chega e temos de perguntar o que se passa com o projeto
europeu. As votações mais expressivas foram na Suíça, Luxemburgo e Brasil, mas
em todos os consulados da UE houve forte inclinação para a formação de
extrema-direita, o que é surpreendente, já que os dois círculos eleitorais da
emigração escolhiam tradicionalmente os dois grandes partidos e havia tendência
para voto útil. Talvez parte da explicação esteja na política interna dos
países, com marés de protestos eleitorais que terão profundo efeito nas
eleições europeias de junho.
A Europa está a mudar
depressa, tem medo da Rússia e desconfia dos EUA, criou um sistema que não é
socialista nem liberal, que avaliou por cima as suas capacidades. Na crise das
dívidas soberanas, a solidariedade dos ricos foi um simulacro. O bar aberto das
migrações, em nome dos "valores europeus", visou conter os aumentos
de salários e prejudicou os mais pobres. A tecnocracia não eleita de Bruxelas
humilhou Estados-membros, teimou em erros, nomeadamente insultando países
terceiros. Parte da classe média empobreceu, os protestos dos trabalhadores
foram ignorados, os serviços públicos degradaram-se, a despesa social diminuiu,
as indústrias partiram para a Ásia, os privilegiados promoveram guerras
culturais identitárias que a população recusava.
A estratégia da guerra da
Ucrânia, subordinada desde o início aos interesses americanos, deu a machadada
final: dependíamos da energia barata vendida a pataco por Moscovo, agora não
temos meios para enfrentar uma Rússia que não se rendeu após as primeiras
sanções. A hipocrisia ocidental é evidente e está em curso uma mudança que
implica enterrar de vez as ilusões federais, embora o pânico dos políticos
continue a impedir qualquer rasto de lucidez.
Os nossos emigrantes na Europa votaram maioritariamente no Chega e alguns observadores interpretam isso como a escolha da ralé pouco esclarecida. Esquecem-se daquilo que escreveram sobre os milhares de compatriotas forçados a emigrar por não terem condições de trabalho compatíveis com os seus altos diplomas académicos.
Basta uma pequena consulta de
sondagens e perspectivas eleitorais para se perceber que os movimentos
conservadores, soberanistas e populistas na Europa estão a crescer em todos os
países, podem tornar-se maioritários na Holanda, Bélgica, França, Áustria (pelo
menos), já conquistaram a Itália, terão votações expressivas na Alemanha,
Finlândia, Suécia, Portugal, Espanha, entre outros. Há diferentes movimentos de
contestação, também de extrema-esquerda ou nacionalistas. São fortes em
Espanha, França, Reino Unido, também em certos países de leste, onde aliás a
esquerda convencional não é socialista, mas pós-comunista, e a direita não é
liberal, mas conservadora e nacionalista. O problema é que os políticos e
jornalistas têm simplificado os termos que usam, põem tudo no mesmo saco dos
deploráveis.
A Europa está a ser construída
sem a participação das populações. Ela será federal, desindustrializada,
politicamente correta, ideologicamente pura, tecnocrática, dominada pelos
grandes países e por uma elite burocrática não eleita. Tem como metas a redução
das emissões de gases com efeito de estufa, transição energética acelerada,
redução da produção agrícola (por isso precisam da Ucrânia) e acesso a massas
de migrantes que permitam manter todos os serviços ultra-baratos. O programa é
impopular, imposto de cima para baixo, estando a alimentar uma rebelião
eleitoral agravada pelos efeitos de uma guerra da Ucrânia que o Ocidente está a
perder.
Todos os dias ouvimos apelos
ao rearmamento da UE e ameaças de envio de tropas, mas o que está em causa é
outra coisa, a reindustrialização com fundos públicos. As ações da Rheinmettal
valiam 62 euros em 2020 e agora valem 478; as da Thales passaram de 74 euros
para 150; a ZBM polaca valorizou 65% só nos últimos doze meses e a BAE Systems
179% em cinco anos. Os fabricantes de armas não têm razões de queixa, o negócio
não anda nada mal.
Título e Texto: Luís Naves, Delito de
Opinião, 21-3-2024
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