Carina Bratt
HOUVE UMA época em que não existia uma
doença crônica chamada ‘digital.’ As músicas desse tempo tinham um sabor
diferente. As melodias fluíam dos discos de vinil como água límpida de
nascente. Vez em quando, surgia um engasgo, ou um arranhão. A agulha sobre o
LP, ou (Long Play), empacava numa faixa qualquer fazendo com que a maviosidade
do que se ouvia ficasse capenga, meio que aleijada.
Esse inconveniente atrapalhava a memória do vinil, fazendo com que, em
cada ‘puladinha,’ o som atormentado pelo caroço desse um retrospecto no tempo.
As capas dos álbuns também não ficavam a dever nada. A meu entendimento,
verdadeiras obras de arte, sem falar nas contracapas e nos encartes que traziam
à baila as histórias do artista, as letras do que ouviríamos antes mesmo da
agulha tocar a superfície brilhante.
Os antigos ritmos do rock, o balanço do jazz, e a alma da bossa nova,
bem ainda os cantores dos tempos dos meus avós e de meus pais, se entrelaçavam
em harmonias que definiram gerações. E acredito, ainda agora, nos ensinam
coisas diferentes. As músicas antigas dos meus idos de menina, tinham o poder
de pararem o tempo, de frearem o futuro, de transportarem aqueles que as ouviam
para uma quadra longínqua, onde a simplicidade, o bom gosto, a ternura e a
exaltação ao amor, lembrando –, para (os que tinham ouvidos musicais apurados
–, se deparassem com a chave para a felicidade.
Meu pai amava Nat King Cole. Tinha ao lado da vitrola (ele apelidara o trambolho de ‘Picape e seus negrinhos.’ (Picape o toca-disco e Negrinhos os bolachudos, ou bolachões), uma coleção magnífica com centena de Lps. Em especial, colecionava todos as gravações desse norte americano nascido aos 17 de março de 1919, ou seja, se ainda estivesse vivo, hoje, domingo, Nat estaria apagando um bom número de velinhas. Desde então, lá se foram 105 anos. Papai amava ‘When I Fall In Love’ ou ‘Quando eu me apaixono.’ Conquistou o coração de mamãe cantado para ela (a seu modo), logicamente...
‘...Quando eu me apaixonarSerá para sempre
Ou eu nunca
Me apaixonarei
Em um mundo agitado
Como esse
O amor
Acaba antes
De começar
E tantos beijos
Ao luar
Parecem esfriar
Ao calor do sol
Quando eu der
Meu coração
Será por inteiro
Ou nunca darei
meu coração
E no momento
Eu posso sentir
Que você também,
Se sente
Assim
É quando
Eu me
Apaixonar
Por você...’”
De repente, o inesperado
[As danações de Carina – Extra] Dia da Mulher: essa combatente incansável
Caixinha de música
A Morte nunca bate na porta
Redoma de vidro
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