Instituto Butantan, Incor e Fiocruz fazem
testes para desenvolver uma forma de combater o novo coronavírus e conter a
pandemia
Brenda Marques
Pesquisadores brasileiros de
diferentes instituições estão empenhados em produzir uma vacina nacional contra
o novo coronavírus, o que garantiria agilidade no combate à pandemia e
independência de outros países. Para isso, são testados desde o vírus causador
da gripe até o mecanismo usado por bactérias para enganar o sistema imune.
Essa, inclusive, é a
estratégia em que o Instituto Butantan concentra seus esforços. Quando estão em
ação no organismo, as bactérias liberam vesículas feitas de suas membranas
externas. Essa ação confunde o sistema imunológico do corpo humano.
"A gente quer acoplar a
proteína do coronavírus na superfície dessas vesículas, assim, estamos fingindo
ser o vírus", esclarece Luciana Cerqueira Leite, pesquisadora do
Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Instituto Butantan.
De acordo com Luciana, essa
pequena partícula, produzida em laboratório a partir da cultura de dois tipos
de bactéria - uma para fabricar a vesícula e outra a proteína igual ao do
coronavírus -, possibilita aumentar 100 vezes a produção de anticorpos e também
é capaz de estimular a ação de células de defesa.
"Nós já fizemos todo esse
processo para a produção da vacina contra a esquistossomose [que já está em
testes clínicos], então metade [da produção] já está concluída", afirma.
Após a fabricação, a vacina
será testada em camundongos, a fim de verificar sua segurança e eficácia. A
expectativa é que essa fase tenha início em um intervalo de seis meses a um
ano.
A tática de pesquisadores
da USP
Essa etapa já foi alcançada
pela equipe coordenada pelo professor Jorge Kalil, do InCor (Instituto do
Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP). Eles também
apostam em uma imitação do novo coronavírus.
Mas, nesse caso, a simulação é
feita com o uso de VLPs (virus-like particles, em inglês), moléculas que se
assemelham ao vírus, mas não possuem material genético para a replicação viral.
A vacina ainda será aplicada
em camundongos transgênicos. Eles serão modificados com o receptor ACE-2, a
enzima que o coronavírus usa para entrar na célula. Kalil deu mais detalhes
sobre cada etapa em entrevista ao R7.
Em conversa com a Rádio USP, o
professor destacou que existe um caminho "razoável" a ser percorrido
para ir dos testes em camundongos aos testes em humanos.
"Tem vários testes em
animais que serão feitos, para provar que a ideia funciona, ou seja, que os
animais desenvolvem anticorpos neutralizantes. Para depois, ver a toxicidade e
segurança", descreve.
Eficácia em humanos
Após verificar esses aspectos
em animais, é preciso fazer o escalonamento, que significa produzir grande
quantidade da vacina em boas práticas de laboratório para que ela seja testada
nas pessoas. De acordo com Kalil, esse processo pode durar, no mínimo, um ano e
meio.
O plano é realizar duas fases
de testes em humanos: uma para verificar se a vacina é tóxica e outra para
saber qual o regime de vacinação mais apropriado para desencadear respostas do
sistema imunológico, ou seja, para o corpo começar a combater sozinho o novo
coronavírus.
Caso essa etapa seja
bem-sucedida, a vacina começará a ser produzida em larga escala e distribuída
para o mercado. "Talvez leve dois anos, dois anos e meio", estima
Kalil.
Vacina para gripe e
coronavírus
A equipe coordenada por Kalil
troca informações com a da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) de Minas
Gerais, que trabalha na produção de uma vacina bivalente: capaz de combater o novo coronavírus e o influenza, que causa a gripe.
“Nós modificamos geneticamente
o vírus da gripe, que é o vírus influenza, para que ele produza tanto as
proteínas do vírus da gripe quanto uma proteína que nós chamamos de imunogênica,
uma proteína que induz resposta imune, no caso ao Sars-CoV-2. Esperamos que uma
pessoa vacinada com esse vírus tenha uma proteção contra a covid-19 e também à
influenza”, explica o pesquisador Alexandre Vieira Machado
Os testes em camundongos devem
ser finalizados só no meio do ano que vem. Os próximos passos percorrem as
mesmas etapas já descritas por Kalil, mas devem ter como cobaia os hamsters.
Corrida mundial
A pesquisadora Luciana
ressalta que os países que estão mais avançados na busca por uma vacina já
tinham uma experiência prévia adquirida em razão de outras epidemias, como a
Sars (Síndrome Respiratória Aguda Severa) e a Mers (Síndrome Respiratória do
Oriente Médio), também causadas por outros coronavírus.
"Seria interessante que
assim que uma vacina for aprovada, essa tecnologia fosse distribuída [a outros
países] para ampliar a capacidade de produção", afirma a pesquisadora.
"Aqui temos capacidade de produção, mas isso envolve muitas negociações
internacionais, o que dificulta o processo", pondera.
Kalil, por sua vez, defende
que a melhor saída é produzir uma vacina brasileira. "Essa vacina, se nós
não tivermos a nossa, se for feita na Inglaterra, primeiro eles vão vacinar os
ingleses, depois americanos, depois europeus, depois chineses... Para nós
termos acesso a essa vacina, vai demorar", analisa.
Título e Texto: Brenda
Marques, R7,
2-6-2020, 11h48
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