Entrei no elevador vazio,
apertei a tecla oito e comecei a pensar na vida. Repentinamente teve início um
filme, com duração provável de segundos, mas parecendo durar décadas, pois foi
o que mostrou. Desde a infância feliz, com a vida bastante regrada, cheia de
horários, obrigações, mas muitas diversões, até os dias atuais, já com vários e
queridos netos.
Na época do grupo, depois
chamado de primário e atualmente educação fundamental, todos meus irmãos
corriam para se arrumar e tomar o café antes de irmos caminhando para a escola,
próxima da casa. Nos intervalos das aulas ou no caminho de volta após seu término,
era comum pararmos para, com nossas raras moedas, comprarmos um sorvete de
gelo, conhecido como raspadinha, que nada mais era do que uma barra de gelo
raspada com uma plaina de carpinteiro e o resultado – um farelo de gelo -,
colocado em um copinho e coberto por líquidos com os mais diversos sabores
artificiais.
O material escolar era
organizadamente guardado logo que chegávamos em casa e após um rápido banho
almoçávamos. Depois de um curto período de descanso já vinha o horário de
estudos, quando fazíamos as tarefas de casa determinadas pelos professores.
Mais um curto período de descanso e já nos dirigíamos, a pé, para outras
atividades escolares ou de esportes que, de acordo com a idade e o sexo da
criança, variavam entre as aulas de inglês, balé, violão, piano, judô e
natação.
Só após novas aulas e a
prática de algum esporte é que tínhamos nosso período livre para brincadeiras
com os amigos e amigas, mas aqueles que por qualquer motivo estavam indo mal na
escola, eram proibidos de brincar e enquanto os outros brincavam, eles
frequentavam as aulas particulares de reforço escolar. Ir para o clube só era
permitido depois das lições de casa concluídas e se aquele não fosse dia de
outras aulas ou de alguma atividade esportiva.
As brincadeiras eram de bolinhas
de gude, pega-pega, esconde-esconde, pular amarelinha, e quando já um pouco
maiores, vinham os carrinhos re rolimã. Logo vieram os tradicionais bailes de
debutantes, quando as famílias apresentavam para a sociedade local suas filhas
que estavam completando quinze anos de idade. Virávamos escoteiros,
bandeirantes ou lobinhos, quando nos ensinavam a vida em sociedade e atitudes
básicas de sobrevivência em situações adversas. Desfilávamos nas fanfarras dos
colégios e alguns davam início aí ao aprendizado para tocar um instrumento
musical.
Nos fins de semana corríamos
para sermos os primeiros a entrar nos cinemas, para assim podermos guardar
lugares para os amigos, amigas ou paqueras. Em casa ligávamos a vitrola e
treinávamos a dança dois pra lá e dois pra cá, o twist e o rock’n roll, para
depois dançarmos nas brincadeiras dançantes dos clubes. Os pontos de encontro
dos jovens nos fins de semana eram em alguma lanchonete, panificadora ou
sorveteria, que as meninas frequentavam com os vestidos mais curtinhos e meias
arrastão. Quando alguém conseguia, dali acompanhava uma delas até a porta de
sua casa onde ficava conversando na calçada, até no máximo às dez horas da
noite, quando sua mãe a mandava entrar.
As músicas da época eram
lindíssimas e ainda são as que mais fazem sucesso. Os primeiros veículos que
dirigíamos eram logo levados a uma rua que possuía uma queda repentina de
altitude e quando por lá se passava um pouco mais aceleradamente, o carro
literalmente voava, caindo mais adiante com seus passageiros sentindo um enorme
frio na barriga. Muito magro e alto, usava cabelos longos e calças justas com boca-de-sino,
o máximo para a época.
Vieram as dificuldades de
todos na escolha das profissões futuras, as faculdades – onde as aulas eram
assistidas de paletó e gravata -, os melhores e os piores cursos e
aproveitamentos, as formaturas e as buscas por empregos ou algum tipo de
remuneração profissional. Alguns fizeram melhores escolhas e começam a ser
recompensados por isso. Outros não escolheram tão bem ou não se esforçaram nos
aprendizados e logo percebem que pagarão caro por isso.
Começaram a ser traçados os
futuros de sucesso e de fracasso, principalmente financeiros, mas
independentemente das posições alcançadas ou não, hoje com poucos e já brancos
cabelos, com muitas rugas e cicatrizes, estou mais livre, leve, solto para
perceber que o dinheiro não pode ser nossa única busca e não é o responsável
pela felicidade de muitas pessoas, mas só a maturidade me mostrou isso.
O elevador parou, a porta se
abriu, o sonho acabou e a realidade voltou.
Título, Imagem e Texto: João Bosco
Leal
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