(Casos curiosos da infância de Dom Duarte de Bragança)
Humberto Pinho da Silva
Andava eu pelos meus dez anos (seriam onze?) quando conheci o Senhor D. Duarte Pio de Bragança.
Frequentava, o principezinho, o segundo ano, turma
A, do Liceu Alexandre Herculano, no Porto. Foi-lhe dado o número quatro.
Era menino robusto, de tez clara, recatado e
retraído; rechonchudinho e coradinho. Um guapo rapaz!
Possuía farta e vistosa cabeleira cor de ouro
velho, que o destacava dos restantes, quase todos moreninhos e cabelos cor de
ébano.
Sentava-se o nosso principezinho na primeira fila,
rente à janela, que abria para o recreio.
Certa ocasião, o príncipe, recebeu de tia,
moradora em país de grandes compositores e altas montanhas, cobertas de alvas
neves no inverno e de lindas flores silvestres, na primavera, relógio de pulso,
cobiçado por muitos.
Estava o mestre a dissertar, quando paira no ar
estranho e irritante sussurro. O que seria?
Estupefacto, interrompe a elucidação, e logo dezenas de curiosos olhinhos espantados, volveram-se para o nosso príncipe.
Ergueu-se o principezinho, e declarou,
concisamente: o relógio era despertador. Inexplicavelmente, sem desejar,
começou a soar. Estava esclarecido o insólito.
Como os principezinhos das histórias de encantar,
possuía, também, objetos mirabolantes, e hábitos estranhos.
Estranhíssimos!!!...
Não queiram lá saber o que aconteceu em fria manhã
de inverno: o menino príncipe enfia a mão na algibeira e retira papel sedoso, e
assoa-se.
“O quê!?”, interrogam-se varados os petizes. “Ele
limpa o nariz a papéis?!...”
O mais afoito investigou o inusitado enigma...
Eram lenços de papel!... Desconhecidos em 1956, em Portugal…
Mas, em dia aziago, aconteceu inesperada tragédia:
Dona Delfina – esposa do jurista Lopes Cardoso –
resolveu realizar íntima festinha. Entre os convidados, contava-se o nosso
principezinho. Comeram e beberam leite achocolatado. Depois solicitaram
autorização para se retirarem.
O grupinho do príncipe era constituído pelo
Daniel, filho mais novo de Lopes Cardoso (meu informador das peripécias aqui
referidas) João Campos, António Baia e Emanuel Caldeira Figueiredo.
Assentaram, os garotinhos, dar curto passeio de
bicicleta. Como os pneus estivessem em baixo, o grupinho, demandaram açodados,
à Rua de Camões (Gaia,) em busca da oficina de José Grilo.
Inesperadamente, surdiu, enfurecido, cachorro que
embirrou com D. Duarte. Aflito, atarantado, aturdido, refugia-se, encafuando-se
numa viatura, com tanta infelicidade, que o vidro da janela estalou em
pedacinhos.
E agora? Agora o pai do príncipe, com dignidade,
reparou o dano.
Certo dia desapareceu o nosso principezinho...
Soube-se que fora para as "Caldinhas".
Passaram-se longas décadas. O diretor do jornal,
onde era redator, encarregou-me de elaborar, entre outras entrevistas,
curtíssima biografia de D. Duarte.
Nessa ocasião o meu principezinho encontrava-se
casado, e era agora o Senhor Duque de Bragança.
Enviou-se-lhe o periódico. Ele e Dona Isabel,
dirigiram-me afetuosa missiva e foto autografada, que conservo religiosamente.
Assim terminam as minhas singelas reminiscências
do principezinho loiro, que em 1956, estudava num liceu portuense, e brincava,
ria e chorava, como qualquer criança portuguesa.
Bons tempos!...
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva,
dezembro de 2022
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