O caso do ex-ministro Pedro
Novais é de um patrimonialismo bizarro: uma pessoa que acha que o Estado deve
pagar o salário do motorista, da governanta, e as contas de festas em motel. É
também revelador de que a corrupção e os equívocos da maneira de governar o
Brasil estão virando um problema de grandes proporções. A corrupção é também um
problema econômico.
A corrupção vai erodindo a
confiança nas instituições, a qualidade do gasto público e a eficiência
econômica. Quem quiser fornecer hoje para o Estado brasileiro — inclusive nas
estatais — tem que ter na sua administração grupos especializados em saber como
chegar a quantia certa à pessoa certa. Desta forma, toda a economia vai sendo
contaminada: as empresas corrompem e se deixam corromper. Elas se organizam não
pela eficiência, pelo baixo custo, pela qualidade na prestação do serviço, mas
por fazer tráfico de influência e conceder mimos aos tomadores de decisão —
como o jatinho, o helicóptero.
Não faz sucesso na empresa
fornecedora de bens e serviços para o governo quem tenha uma ideia inovadora,
mas sim quem sabe como ir lentamente quebrando as barreiras para construir
laços com a autoridade de plantão. Numa empresa que queira vencer uma
concorrência para uma obra ou um contrato no governo será mais valorizado o
funcionário que sabe carregar e depositar a pasta do que quem se esforça para,
no seu ofício, construir uma proposta realmente eficiente e de baixo custo.
O custo da corrupção é maior
do que parece. Há um custo visível que se pode avaliar pelos constantes
aditivos aos contratos, pelos pagamentos por obras não feitas, pelos
recebimentos de dinheiro flagrados em tenebrosas gravações. Há também um custo
intangível que é o de minar qualquer esforço pela eficiência nas empresas
fornecedoras. E vamos entender que o governo é o maior comprador em qualquer
país, portanto, sua capacidade de disseminação das más práticas é enorme. Se,
ao contrário, a regra passa a ser a transparência, o controle dos gastos, a
prestação de contas ao contribuinte haverá o efeito de propagar as boas
práticas.
Em nove meses de governo, a
presidente demitiu quatro dos cinco ministros que caíram, após uma série de
denúncias. Novais não tem nada de novo, exceto estar na segunda fila da foto
presidencial, depois de um quase strike na primeira fila. E se não houvesse as
denúncias? Os ministros e os outros que deixaram seus cargos continuariam
neles? Para que servem mesmo órgãos como a Controladoria-Geral ou a Comissão de
Ética Pública se não forem para prevenir de alguma forma. Bastava uma olhadinha
no currículo — ou prontuário — de alguns. Isso já pouparia uma parte do
constrangimento da população e do governante.
Há casos que explodem após a
revelação de um fato inesperado. No caso de Pedro Novais a presidente Dilma
Rousseff poderia ter evitado o desgaste que viveu nos últimos dias. Era óbvio
que ele não era o ministro certo. A revelação do envio da conta do motel para
ser paga com o dinheiro da Câmara dos Deputados estourou antes da posse. Teria
sido um ótimo motivo para a presidente não nomear um ministro que nunca
demonstrou estar preparado para o desafio que está diante de nós no Turismo. O
país tem grandes eventos em seu calendário e um gigantesco déficit na balança
do turismo. Não apenas porque o dólar favorece as viagens internacionais dos
brasileiros, mas porque o Brasil tem deficiências conhecidas em atrair e manter
turistas estrangeiros que venham ao país. No ano passado, a Argentina teve
aumento de 22% de turistas estrangeiros, nós, apenas 7,5%. A Grécia recebe um
fluxo três vezes maior do que o nosso. O setor está claramente mal estruturado.
Mesmo sendo importante o setor
não deveria ter ministério. País nenhum precisa de 38 ministérios e ficar
aguardando a criação de mais um a qualquer momento. Não se resolve problemas criando
instâncias burocráticas que são oferecidas aos políticos como protetorados. Os
problemas são resolvidos quando há uma boa equipe de funcionários determinados
a encontrar as soluções.
E por que mesmo é que o
Turismo é propriedade do ex-presidente José Sarney? É um acinte ao país que
este tenha sido o critério para escolha do novo ministro: o estado de
nascimento. Nada contra o belo Maranhão; tudo contra o seu controle eterno por
integrantes da oligarquia que, além de todos os seus defeitos, de congelar o
estado num dos mais baixos níveis de desenvolvimento humano, tem por hábito
nomear nulidades administrativas para cargos importantes. Se ainda fosse uma
oligarquia de resultados, mas nem isso é.
Será que a presidente se dá
conta de que esse ‘toma lá’, sem sequer haver um ‘dá cá’, em termos de
compromisso na qualidade da gestão pelos nomeados, vai envelhecendo o governo
antes da hora? O sentimento do contribuinte brasileiro é de exaustão com tanto
caso de corrupção, com tanto imposto para pagar, com tanta ineficiência na
oferta de serviços por parte do Estado.
Dessa exaustão pode sair uma força que modernize o Brasil. Ou não. O
cidadão e a cidadã podem simplesmente não acreditar mais que valha a pena
gastar tanto para manter essa estrutura de poder cara, corrompida e cada vez
menos comprometida com o seu propósito original. Governos servem aos cidadãos e
não o contrário. Em nome do povo o governo democrático é constituído. Isso
parece que anda esquecido em Brasília.
Título e Texto: Miriam Leitão, O Globo,
16-09-2011
Grite na Cinelândia, dia 20 de setembro, terça-feira, a partir das 17h
O pessoal do Movimento ACORDO JÁ! marcou o ponto de encontro nas escadas da Biblioteca Nacional
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