Valmir Fonseca Azevedo Pereira
Conta a lenda que Davi roía as
unhas nervosamente, na sua modesta morada quando escutou um sussurro.
Sobressaltado, o inato golpeador com funda, inicialmente, ficou à espreita.
Quem estaria batendo em seu casebre às vésperas da luta contra o colossal
Golias?
“Davi, aqui é o jornalísticus”, respondeu o visitante. “Sei que você está agastado, mas é possível
escutar as suas impressões sobre a farsa de amanhã? Nosso boletim está quase
pronto. Só falta ouvir você”.
Davi se encolheu. Já denunciara
tantas vezes que a pugna seria uma tremenda marmelada. Mas, acreditou que
poderia, num derradeiro momento, destilar toda a sua mágoa, confessando para um
ilustre desconhecido as suas apreensões, mas de que serviria, se toda a região
sabia que suas chances eram nulas?
Sem dúvida, vendilhões de sua
tribo haviam apontado a ele, um borra-botas,
como o seu representante na liça. Era a mais pura sacanagem.
Meu Deus, com tanta gente,
logo ele, um miserável aldeão fora apontado pelos sábios (?) da tribo como seu
gladiador? Corria à boca pequena, que a alta cúpula havia sido comprada a troco
de banana pelos filisteus.
Contudo, Davi no desespero da
ruína que se desenhava, desistindo de viver, atendeu ao pedido. Pelo menos,
dependendo da circulação do jornal alguns saberiam da sua verdade. Muito
poucos, pois a maioria usava o tabloide, um pequeno tijolo de argila, apenas
para jogar nos desafetos.
- “Entra jornalísticus, o que queres saber?”
E o perguntador começou “Davi, quais são as suas chances contra o
descomunal Golias”?
- “Nenhuma praguejou Davi”.
- “Mas como, fostes o escolhido, és bom de mira, um campeão do
fundíbulo” (funda para os menos letrados).
Sim, eu era, mas hoje descobri
que a atiradeira certeira, a minha melhor arma, além de proibida, fora furtada
(por genuínus, o guerrilheiro?). Levaram o meu alforje, e até a pedra
que preparei para acertar no quengo
do gigante. Dizem que estão nas mãos de Golias.
- “Se antes as chances eram remotas, sem o meu estilingue será um
verdadeiro massacre”.
Deprimidos, jornalista e
vítima conversaram por horas a fio.
Davi declarava-se um
injustiçado, e o mais terrível, tivera a comprovação de que o conselho de
sábios, um bando de interesseiros, havia se vendido aos seus inimigos, e
escolhido o seu nome como o campeão, só de sacanagem. Aos prantos, Davi
encerrou a entrevista.
Dia seguinte, a pugna, no
jornal, a manchete, Davi afirma,
peremptoriamente, que dará uma surra no Golias.
Na arena, o delírio. Entra
Golias agitando a espada, o escudo e a funda. No outro lado, no portal do seu
oponente Davi, só silêncio.
A multidão urra, quer assistir
à chacina. Mas Davi não aparece. Duas horas de espera. Golias é declarado
vencedor. A multidão vaia, mas aos poucos e desiludida deixa o anfiteatro do Congresso.
Depois do vexame, foi manchete
na época – que, covardemente, Davi fugira. Dizem que para o Brasil.
Moral da fábula: Na briga para a criação da Comissão da Verdade, nós do
contra, estamos que nem o Davi, sem a pedra de arremesso, e pior, sem o nosso
fundíbulo (para os mais letrados, vergonha, coragem, indignação, etc.).
Título e Texto: Gen. Bda Rfm Valmir Fonseca
Azevedo Pereira, Brasília, DF, 20 de setembro de 2011, enviado pelo próprio.
Edição: JP
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