João Bosco Leal
Alguns anos atrás, de um
médico que me salvou de um grande problema com uma cirurgia, ganhei um livro do
filósofo Sêneca, “As relações humanas”. É a transcrição de uma série de cartas
que o autor, já em sua velhice, após ter se retirado da Corte do Império Romano
e vivendo em sua casa de campo entre os anos de 62 e 65 d.C., escreveu a
Lucílio, seu discípulo e amigo.
Em uma delas Sêneca diz: “Sê o
proprietário de todas as tuas horas. Serás menos escravo do amanhã se te
tornares dono do presente. Enquanto a remetemos para mais tarde, a vida passa.
Nada, Lucílio, nos pertence; só o tempo é nosso.”
Penso que, principalmente por
haver escapado de uma doença que atualmente acomete e mata tantas pessoas, sem
sequer ter de fazer nenhum tratamento além da cirurgia, acabei por entender com
mais profundidade o que Sêneca tentava passar a seu aluno.
Todos sempre falamos bastante
sobre o tema “como deveríamos viver”, mas dificilmente levamos a vida de modo a
aproveitar verdadeiramente o que é a única coisa que realmente nos pertence – o
tempo.
Assisti a uma comédia
retratando um empresário de sucesso, sem tempo nenhum para a família que, ao
ouvir da esposa reclamações desse tipo respondia da maneira mais comum a todos:
o que está lhe faltando? Dou a você e às crianças tudo o que me pedem… e tudo o
mais que todos já sabemos sobre esse tipo de argumento.
Quando a esposa lhe dizia que
o que faltava a ela e aos filhos era sua presença, amor, carinho e
companheirismo, sua resposta era a de que não tinha tempo para essas bobagens e
que ela deveria estar sempre agradecida de possuir tudo, do bom e melhor
enquanto milhões gostariam de possuir o que ela tinha.
No filme, logo ao desligar o
telefone o empresário recebeu aquela visita que ninguém quer receber – a
senhora morte -, que lhe informou haver chegado sua hora e que viera buscá-lo.
Apavorado o homem fez todos os
apelos possíveis, dizendo que tinha muitos negócios pendentes que dependiam de
sua decisão, várias reuniões e viagens de negócios agendadas, centenas de
famílias dependentes de suas empresas e tudo o que imaginou possível dizer para
convencer aquela senhora a se esquecer dele, chegando inclusive a tentar
corrompê-la para ganhar mais quarenta anos de vida.
Depois de ouvir que como não
havia aproveitado seu tempo com a família agora sua esposa iria aproveitar a
vida com seu dinheiro, mas com outra pessoa, que a levaria a bailes, cinemas,
teatros e passeios, o homem ficou ainda mais desolado e implorando muito,
ganhou um novo prazo, de mais cinco dias vivo.
Seu desespero com o prazo
diminuto foi enorme e nem se preocupando em desmarcar suas reuniões, ligou para
a esposa pedindo que preparasse imediatamente suas malas e dos filhos, pois
iriam viajar a passeio.
O filme é um exemplo clássico
do que ocorre com todos, que acabam se envolvendo tanto com trabalho, negócios,
sociedade consumista e tentando dar aos seus cada vez mais, acabam perdendo o
mais importante, a convivência nas diferentes fases da vida dos seus.
Nosso desperdício de tempo com
bobagens, coisas insignificantes, observações sem nenhuma importância real,
discussões tolas e brigas desnecessárias, é imensurável. Mais maduros, podemos
perceber, cada vez mais claramente, como perdemos tempo com algo que nada nos
acrescentou e pior, muito nos diminuiu.
Só com um grande susto passamos a dar importância ao que realmente
importa: viver tudo intensamente e com todos que pudermos.
Título, Imagem e Texto: João
Bosco Leal
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