sábado, 4 de fevereiro de 2023

Democracia inabalada

Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Em nome do combate à desinformação, criou-se no Brasil uma espécie de Ministério da Verdade

Rodrigo Constantino

Começou a nova legislatura. A presidente do Supremo Tribunal Federal fez um discurso firme em defesa da democracia, condenando os atos golpistas do dia 8 de janeiro, e lembrou que não existe democracia sem liberdade de imprensa. Enquanto isso, um colega seu tuitava apenas “democracia inabalada”, e recebia de parte do público as congratulações por sua implacável defesa da democracia. Já o presidente do Congresso Nacional descreveu sua gestão como basicamente impecável. Tudo muito lindo. Se ao menos fosse verdade…

Liberdade de imprensa? Será que isso inclui a perseguição contra o único veículo de comunicação com penetração nas rádios e na televisão, que culminou na demissão de vários comentaristas com viés mais à direita por insuportável pressão do sistema? Temos jornalistas com redes sociais censuradas, com contas bancárias congeladas e até passaportes cancelados, tudo isso pelo “crime de opinião” criado pelo STF. Isso faz parte de uma democracia saudável, por acaso?

Em nome do combate à desinformação, criou-se no Brasil uma espécie de Ministério da Verdade. Em seu discurso como candidato à reeleição, Pacheco disse que as famílias brasileiras não podem ficar sujeitas a mentiras. Ou seja, o presidente do Congresso resolveu o que é verdade ou mentira e defendeu a censura a quem discorda dele logo depois?

Pacheco comemorou sua vitória com figuras como Renan Calheiros, Randolfe Rodrigues, Omar Aziz e companhia. É esse o Brasil democrata, da pacificação, da lei, da honestidade e do bom senso?

Foto: Roque de Sá/Agência Senado
Pacheco, aliás, foi reeleito como presidente do Senado. Houve denúncias de muitas torneiras abertas e prometidas pelo PT aos senadores indecisos, assim como ligações que ministros teriam feito a alguns senadores. Se isso for verdade é um escândalo! Por lei, um juiz deve ser apartidário. Um ministro supremo não pode ter um candidato preferido, muito menos externar isso ou fazer campanha. Muito menos quando se sabe que é o STF que julga tais senadores por conta do foro privilegiado.

Cenoura e bastão: as formas mais eficazes de “persuadir” alguém são o incentivo de prêmios ou a ameaça de punição. Foi isso que aconteceu na eleição para o comando do Senado? Se sim, então não podemos mais falar em democracia. A esperança do brasileiro decente vai se esvaindo a cada dia. O discurso do vitorioso Pacheco mencionou independência entre os Poderes, mas todos já perceberam que o Senado, sob seu controle, virou uma espécie de puxadinho supremo, subserviente aos mandos e desmandos monocráticos dos ministros.

Tanto o senador Rogério Marinho como o senador Eduardo Girão fizeram discursos muito sóbrios e firmes sobre a necessidade de restabelecer no país o Estado de Direito, mas pelo visto os interesses particulares dos senadores indecisos falaram mais alto. Pacheco comemorou sua vitória com figuras como Renan Calheiros, Randolfe Rodrigues, Omar Aziz e companhia. É esse o Brasil democrata, da pacificação, da lei, da honestidade e do bom senso? Não dá para culpar quem vai jogando a toalha e desistindo do país. O mistério é como o Brasil ainda não afundou de vez com essa turma!

Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Na Câmara vimos a bancada de oposição assumir com gritos e placas de Fora Lula, mas a verdade é que a margem de manobra da oposição fica cada vez menor. O instrumento de freio e contrapeso falhou. O fatídico 8 de janeiro deu o pretexto para que o sistema avance ainda mais contra as liberdades. E o sistema é poderoso demais, como ficou claro. Agora é se reagrupar para mitigar os estragos, para tentar salvar o que for possível de nossa democracia cambaleante. Mas não será tarefa trivial.

Afinal, os ícones desse sistema alegam que, graças a eles, a democracia está “inabalada”. Com um pouco mais de esforço e empenho dessa turma, quem sabe o Brasil não chega a um patamar venezuelano de democracia? Lá, não custa lembrar, Lula dizia que há excesso de democracia. Adoraria ser mais otimista, mas minha consciência me obriga a fazer uma análise sincera para meu leitor. E a realidade é que o prognóstico não é nada animador. Apertem os cintos!

Título e Texto: Rodrigo Constantino, Revista Oeste, nº 150, 3-2-2023

Relacionados: 
Culpado é mais lucrativo 
Um governo de más notícias 
Por que Lula quer acabar com a independência do Banco Central? 
O Senado decide ser cúmplice, não vigilante 
Os primeiros efeitos da eleição no Congresso 
Lula volta a atacar a autonomia do Banco Central 
Os 7 do STF... os mandantes do Brasil...

Um comentário:

  1. FOTO LEGENDADA NÚMERO UM, CLICADA NO EXATO MOMENTO EM QUE MAGRELA COMENTAVA COM O SENACANTOR PABLLO VITTAR:
    - Espere só para você ver a cara do povo brasileiro, digo, dos trouxas, quando esta foto vier a público.

    Aparecido Raimundo de Souza
    de Santo Eduardo RJ

    ResponderExcluir

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-