Pedido de vista do presidente
do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, suspendeu, nesta
quinta-feira (8), o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 571969, em que se
discute indenização à Viação Aérea Rio-Grandense (Varig), pela União, por danos
sofridos pela empresa em consequência da política de congelamento de tarifas
vigente de outubro de 1985 a janeiro de 1992, instituída pelo Plano Cruzado.
O pedido de vista foi formulado após a relatora do RE, ministra Cármen Lúcia, concluir seu voto favoravelmente à Varig. No processo, União e Ministério Público Federal (MPF) contestavam a condenação, mantida pelo voto da relatora. Ambos questionavam acórdãos (decisões colegiadas) do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que, no julgamento de recursos lá interpostos pela União e pelo MPF, ratificou decisão condenatória da Justiça Federal no Distrito Federal.
No julgamento de hoje, a
secretária-geral de Contencioso da Advocacia-Geral da União (AGU), Grace Maria
Fernandes Mendonça, que atuou em defesa da União, informou que,
atualizada, a indenização pleiteada soma R$ 3,057 bilhões.
Relatora
Em seu voto, a ministra Cármen
Lúcia manifestou entendimento de que o dano causado à Varig pelo congelamento
de tarifas ficou comprovado nas instâncias iniciais em que tramitou o processo,
iniciado em 1993, com uma ação ordinária na Justiça Federal em Brasília. A
ministra acolheu a tese da Varig de que a União, ao não contestar em instâncias
anteriores laudo de perito oficial, que atestava a ocorrência de prejuízo à
companhia aérea em decorrência do congelamento de tarifas, abdicou da
possibilidade de fazê-lo, porque o reexame de provas não é mais cabível em sede
de recurso extraordinário.
A ministra observou que o
governo atuou licitamente dentro de suas prerrogativas de zelar pelo bem-estar
social comum ao editar o plano de estabilização para acabar com a
inflação – que, segundo citou a relatora, alcançou o índice mensal de
22,6% em fevereiro de 1986. Ponderou, entretanto, que, embora esse plano e suas
consequências atingissem toda a população brasileira, no caso específico da
Varig havia a concessão de serviços de transporte aéreo, que implicava o
compromisso de dar à empresa condições de manter o equilíbrio econômico-financeiro
do contrato, rompido com o congelamento de tarifas, sendo cabível a
indenização.
“Para evitar resultados mais
desastrosos ou até mesmo o completo descontrole da ordem econômica e até mesmo
da ordem social e da administração pública, o Estado brasileiro atuou de forma
imperativa e definiu as políticas econômicas e financeiras consubstanciadas em
atos de governo, no espaço próprio das competências dos poderes, no caso o
Executivo, com base no que definido pelo Poder Legislativo”, observou a
ministra.
“Não se está a discutir a
legalidade da decisão política”, observou ela. “Tanto que foram editados os
Decretos-Leis 2.283 e 2.284/86, com objetivo – necessário – de combater a
inflação, resguardando-se a ordem econômico-financeira em benefício de toda a
sociedade”.
Ela reconheceu que foram
medidas emergenciais em busca de atendimento do interesse maior, adotados todos
de forma geral e abstrata. Mas, de acordo com ela, “esses atos administrativos
– e também os legislativos, submetem-se aos ditames constitucionais, como os
princípios da legalidade e da responsabilidade”.
Ainda de acordo com a ministra
Cármen Lúcia, “é inconteste, portanto, que o Estado deve ser responsabilizado
também pela prática de atos lícitos, quando deles decorrerem prejuízos
específicos expressos e demonstrados para particulares, em condições que os
desigualam dos demais exatamente porque teriam uma sobrecarga em relação a
todos os outros cidadãos”.
No caso, segundo ela, a
concessionária de serviço público, caso da Varig, “não teria como não cumprir o
que lhe foi determinado e, ao cumprir, assumir sozinha os danos que se
sucederam, até o comprometimento não apenas dos seus deveres, que não mais
puderam ser cumpridos, como dos seus funcionários, dos aposentados, dos
pensionistas, cujos direitos não puderam ser honrados e que, pela delonga
inclusive desta ação, estão pagando com a própria vida”.
Ao ponderar que a Varig não
tinha como adotar qualquer providência para se esquivar dos danos, a ministra
avaliou que a situação da empresa não era igual à de outras concessionárias ou
de outras empresas.
“Não seria assim,
juridicamente razoável, impor-se a um grupo de pessoas, tanto à empresa quanto
a seus funcionários, aposentados, pensionistas, ônus superiormente suportados
pelas políticas adotadas em relação aos serviços concedidos, deixando os danos
na conta da possibilidade ou necessidade de adoção de políticas públicas, sem a
necessária resposta responsável pelas lesões específicas e comprovadas daí
advindas”, afirmou ela.
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