Paulo Hasse Paixão
Em direto/ Russos estão a esgotar munições de artilharia e combatem com "pistolas e pás", diz Defesa britânica https://t.co/RKsk3CSrrm
— Observador (@observadorpt) March 5, 2023
Neste mundo sobrenatural,
habitat de toda a ficção a que hoje ainda há quem chame jornalismo, Zelensky
estará confortavelmente instalado no Kremlin já no próximo Verão, senhor de
todas as estepes a leste do Bairro Alto, depois de uma guerra termonuclear ter
extinto, sem impactos ambientais nem erros de precisão, apenas os efetivos das
forças armadas russas, os quadros do aparelho burocrático de Moscovo e um ou
outro degenerado que tenha dúvidas sobre as virtudes da democracia ucraniana, a
urgência existencial levantada pelas alterações climáticas ou a verdade
científica das identidades de género.
É natural que gente que nunca leu um livro de História na vida, ou um romance de Tolstoi, se sinta bem a escrever novelas de ficção científica. O desamor dos factos, as incoerências de visão e de filosofia, os delírios ideológicos e os excessos da imaginação, próprios deste género literário quando levado ao baixo critério do cordel, constituem um apelo incontornável para apparatchiks ignorantes e ativistas em desespero de causa.
Apesar de constantemente
reportarem que os bombardeamentos sobre a Ucrânia matam inocentes com fartura,
os escribas tontos deste blog glorificado informam concomitantemente a sua
audiência que a artilharia russa não tem bombas. No Contra, não fazemos ideia
sobre o género de cogumelos que são consumidos pelos millenials vegetarianos
que lá trabalham, mas não é de excluir a hipótese da alucinação coletiva.
É assim aconselhável
escaparmos rapidamente à twilight zone do Observador, e
seguirmos, por exemplo, Bruno
de Carvalho, um jornalista independente português que está lá, onde a
guerra se trava. Para ficamos não só um bocadinho mais conscientes da realidade
factual, como percebemos o ponto de degradação ética e psíquica a que chegou a
imprensa mainstream.
Dentro da central nuclear de Energodar, a maior da Europa. Produzia mais de um quinto de toda a electricidade gerada na Ucrânia e metade de toda a energia produzida no país. Está sob controlo das autoridades e forças russas. pic.twitter.com/cicBzcuZLQ
— Bruno Carvalho (@bcarloscarvalho) March 7, 2023
Ninguém pode em boa verdade
dar como ganha esta guerra, seja para que lado for. Há até a trágica hipótese
de acabarmos por mergulhar num conflito global, sem vencedores. Mas pensar – e
noticiar – que a Rússia combate na Ucrânia uma guerra improvisada, sem orientação
estratégica nem apoio logístico e tecnológico, ou que as suas forças militares
estão deficientemente armadas ao ponto de combaterem com “pistolas e pás” é,
tão só, papaguear propaganda. Muito má propaganda, ainda por cima.
Título, Ilustração e Texto: Paulo
Hasse Paixão, ContraCultura,
8-3-2023
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