quarta-feira, 8 de março de 2023

O Observador como blog de ficção científica

Paulo Hasse Paixão


No universo alternativo em que vive a rapaziada da redação do Observador, os russos estão a perder a guerra desde que a começaram. E sem munições desde 1945. E sem armas desde que se enfiaram no Afeganistão. Enquanto o Kremlin comanda um exército de amadores que usam pás, pedras e paus com surpreendente eficácia, considerando o número de soldados ucranianos que entretanto mataram à traulitada, Vladimir Putin já morreu de cancro três vezes.

Neste mundo sobrenatural, habitat de toda a ficção a que hoje ainda há quem chame jornalismo, Zelensky estará confortavelmente instalado no Kremlin já no próximo Verão, senhor de todas as estepes a leste do Bairro Alto, depois de uma guerra termonuclear ter extinto, sem impactos ambientais nem erros de precisão, apenas os efetivos das forças armadas russas, os quadros do aparelho burocrático de Moscovo e um ou outro degenerado que tenha dúvidas sobre as virtudes da democracia ucraniana, a urgência existencial levantada pelas alterações climáticas ou a verdade científica das identidades de género.

É natural que gente que nunca leu um livro de História na vida, ou um romance de Tolstoi, se sinta bem a escrever novelas de ficção científica. O desamor dos factos, as incoerências de visão e de filosofia, os delírios ideológicos e os excessos da imaginação, próprios deste género literário quando levado ao baixo critério do cordel, constituem um apelo incontornável para apparatchiks ignorantes e ativistas em desespero de causa.

Apesar de constantemente reportarem que os bombardeamentos sobre a Ucrânia matam inocentes com fartura, os escribas tontos deste blog glorificado informam concomitantemente a sua audiência que a artilharia russa não tem bombas. No Contra, não fazemos ideia sobre o género de cogumelos que são consumidos pelos millenials vegetarianos que lá trabalham, mas não é de excluir a hipótese da alucinação coletiva.

É assim aconselhável escaparmos rapidamente à twilight zone do Observador, e seguirmos, por exemplo, Bruno de Carvalho, um jornalista independente português que está lá, onde a guerra se trava. Para ficamos não só um bocadinho mais conscientes da realidade factual, como percebemos o ponto de degradação ética e psíquica a que chegou a imprensa mainstream.

Ninguém pode em boa verdade dar como ganha esta guerra, seja para que lado for. Há até a trágica hipótese de acabarmos por mergulhar num conflito global, sem vencedores. Mas pensar – e noticiar – que a Rússia combate na Ucrânia uma guerra improvisada, sem orientação estratégica nem apoio logístico e tecnológico, ou que as suas forças militares estão deficientemente armadas ao ponto de combaterem com “pistolas e pás” é, tão só, papaguear propaganda. Muito má propaganda, ainda por cima.

Título, Ilustração e Texto: Paulo Hasse Paixão, ContraCultura, 8-3-2023

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