sábado, 12 de novembro de 2022

A Cimeira do Clima tem péssimo ambiente

É para isso, nos testar, que centenas de trapaceiros estão no Egito. Não haverá maneira de os colar às pirâmides? Para sempre ou até ao fim do mundo, previsto para ontem.


Alberto Gonçalves

Não sei se os “ativistas” do clima usam cola ou se é a ecológica aversão ao banho que facilita a aderência deles às coisas que se põem a jeito. Lá fora, a moda é aparecerem colados a pinturas célebres. Em Portugal, país em que as bugigangas de Joana Vasconcelos e o entulho de Cabrita Reis passam por arte, torna-se complicado vandalizar obras cuja destruição alguém lamente. Vai daí, os “ativistas” preferem colar-se a entradas de edifícios. Em outubro, foi a sede da Galp. Agora, a António Arroio e, logo em seguida, outras escolas de Lisboa.

As crianças em protesto nessas escolas explicam que é inútil estudar para exames num planeta que está condenado. É um raciocínio inquestionável, que legitima cada cidadão a prolongar os empréstimos bancários e meter “baixa” por duzentos ou trezentos meses. Afinal, na melhor das hipóteses o próprio sistema solar acabará em 7 ou 8 mil milhões de anos, mais semana, menos semana. Além disso, não me parece que abdicar dos ensinamentos da António Arroio seja uma perda drástica: os respectivos alunos celebrizaram-se há uns anos quando se manifestaram contra o fascismo enquanto gritavam “vivas” a Marinetti. E hoje berram pelo ambiente enquanto desconhecem o custo ambiental dos pechisbeques que envergam, roupa, telemóvel e cola incluídos.

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É fácil atribuir à idade a ignorância e a cegueira destes “ativistas”. Porém, nada garante que a experiência lhes traga sabedoria. A pequena Greta, que largou os estudos muito antes das crianças da António Arroio, tem crescido a olhos vistos e não deixou de ser ignorante e cega. E não me obriguem a falar do eng. Guterres, que aparenta 98 anos e, à semelhança daqueles excêntricos que vagueiam pelas ruas com um cartaz e uma sineta, continua a alertar diariamente para o Apocalipse que virá amanhã. Ou segunda-feira.

Naturalmente, o secretário-geral da ONU não podia faltar à Cimeira do Clima da ONU, que decorre no Egipto. E, em pleno palco, mostrou aos críticos que se encontra em estado de perfeita lucidez: descortinou num ápice que se enganara no discurso, proeza complicadíssima na medida em que os discursos dele são sempre o mesmo, com ligeiras variações no imaginário cataclísmico. Desta vez, o eng. Guterres não citou o aldeão do “Sexta-Feira 13” (“You’re doomed! Doomed!”) e optou pela “Highway to Hell” dos AC/DC, o que revela que é tão sofisticado na música quanto na retórica. Das muitas canções acerca do fim iminente, eu teria citado o “It’s the End of the World”, da Skeeter Davis (Why does the sun go on shining? /Why does the sea rush to shore? /Don’t they know it’s the end of the world? /’Cause you don’t love me anymore). Gostos, enfim.

O importante é que o eng. Guterres é apenas uma das inúmeras personalidades aflitas com o futuro coletivo que estes dias andam por Sharm el-Sheik. “Andam” é força de expressão: são conduzidos em automóveis altamente poluentes. E, ao invés de bicicletas, chegaram lá por via aérea. De facto, oitocentos jactos fretados ou regulares transportaram as sumidades que ocupam o seu precioso tempo a tentar salvar a Terra de irresponsáveis como nós. Não consegui verificar a habitual participação do reputado climatologista Leonardo DiCaprio, que talvez tenha ficado a refletir na matéria a bordo do seu iate, em cujo tanque cabem 460 mil litros de gasóleo limpinho. Em compensação, confirmam-se as presenças dos climatologistas Joe Biden, Emmanuel Macron, Ursula von der Leyen e Lula da Silva. E, pela televisão, vi com agrado o climatologista António Costa em animada cavaqueira com o climatologista Nicolás Maduro.

O prof. dr. Maduro é, aliás, um perito particularmente avançado na concretização dos objetivos confessos da Cimeira: anular as diferenças entre os países ricos e os países pobres. Na qualidade de déspota local, e na linha do déspota local anterior, a criatura provou que o petróleo não compensa e transformou a Venezuela numa das nações mais miseráveis de ambos os hemisférios. Com tamanho farol a iluminar, não tarda que todos os países sejam iguais – igualmente pobres. Assim haja vontade de pesar as consciências da ralé, punir-lhe os confortos e subtrair-lhe os rendimentos a título de taxas “verdes”. A julgar pelas intervenções na Cimeira, vontade de nos desgraçar não falta.

Notem que, ao longo do artigo, nem por uma vez desvalorizei a influência antropogênica nas alterações climáticas ou questionei a hecatombe que nos prometem desde há décadas. Não preciso: os participantes da Cimeira, que viajam de avião para nos proibir de conduzir o carro, fazem-no constantemente. Alguém acredita que aquela gente acredita no Armagedon com que, após o foie gras, enche a boquinha? Chamar-lhes hipócritas é um eufemismo idêntico a acusar Ted Bundy de misoginia. O clima não os interessa: interessa-lhes o poder. Estes encontros, e o respectivo folclore, são uma exibição de poder, idêntica à das festarolas em que, durante a Covid, as máscaras só eram utilizadas pela criadagem.

Como o vírus, agitar as variações da temperatura e da pluviosidade servem de teste à submissão das populações, que se desejam dóceis e prontas a abdicar da autonomia, da dignidade, da propriedade e da liberdade a troco de uma proteção postiça face a ameaças vagas. É para isso, testar-nos, que centenas de trapaceiros estão no Egipto. Não haverá maneira de os colar às pirâmides? Para sempre ou até ao fim do mundo, previsto para ontem.

Título e Texto: Alberto Gonçalves, Observador, 12-11-2022

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