Ferreira Gullar
No caso deste oitavo pacote,
quem compra não é o cidadão, mas o governo. É ele quem se endivida.
Como não me cabe fazer a
análise técnica da política econômica do governo, limito-me a tecer comentários
acerca desta ou daquela medida, quando é o caso.
Esse é o caso do último pacote
anunciado por Dilma Rousseff e Guido Mantega, com pompa e circunstância, no
Palácio do Planalto. É o oitavo pacote, emergencial como os outros, tentando
conter a tendência da economia brasileira à estagnação.
Como disse outro dia, a festa
acabou, o banquete que Lula encontrou pronto tratou de usufruir dele
politicamente o mais que pôde, distribuindo benesses a torto e a direito, sem
se preocupar com o futuro.
Garantiu desse modo a própria
popularidade e elegeu Dilma, que recebeu como herança, além de ministros
corruptos, o encargo de continuar a festa.
Mas, embora não tivessem
percebido, a festa acabara e nenhuma medida havia sido tomada para manter a
mesa farta. É que, para isso, seria necessário que o país crescesse e, para
crescer, seria preciso investir nos setores estruturais. Sucede que isso não é
próprio de governos populistas, uma vez que investimentos, cujos resultados
custam a aparecer, não interessam.
Acontece que o processo
econômico não obedece à vontade de Lula, pois tem suas próprias leis e
exigências. Disso resulta que, esgotado o potencial contido nas medidas do
governo anterior, a economia começou a ratear, quase parando. Dilma acordou e
começou a produzir pacotes.
Como se sabe, os partidos
revolucionários não têm programa de governo, pois acreditam que, como o mal da
sociedade é a burguesia, basta eliminá-la para chegar-se à sociedade perfeita.
Os exemplos não faltam. O PT,
embora não fosse revolucionário de fato, trouxe deles essa herança e, assim, ao
assumir o governo do país, adotou o programa do governo anterior, que havia
combatido ferozmente. Mas ficou nisso: esgotadas as possibilidades do programa
herdado, não tem o que pôr no lugar, a não ser os pacotes emergenciais que se
sucedem.
Outra característica do
governo petista, afora não ter programa, e por isso mesmo, é valer-se da
propaganda para ganhar a opinião pública. Esse é um recurso muito usado pelos
governos populistas, já que, para o povo em geral, quer o pacote dê resultado
ou não, fica a notícia de que o governo está trabalhando, resolvendo os
problemas.
O PAC é exemplo disso: para o
grande público (o eleitor), o governo está "acelerando" o crescimento
do país, mas, na realidade, dos R$ 80 bilhões aprovados no Orçamento deste ano,
só gastou até agora menos de ¼ dele. Sabem por quê?
Porque lhe falta competência
técnica para realizar os projetos. E, se lhe falta, é porque o preenchimento
dos cargos executivos não é determinado por critério técnico, mas político. Não
por acaso, o governo espantosamente admite que cada ministério pertence a
determinado partido, que o usa politicamente.
E, por falar em acaso, foi
exatamente agora, a poucos meses das eleições, que Dilma decidiu lançar seu
oitavo pacote. Mas não foi só por isso. Foi também porque o pacote anterior,
reduzindo os juros para estimular o consumo, não deu certo, porque as famílias
já estão demasiado endividadas. Por isso mesmo, no caso deste oitavo pacote,
quem compra não é o cidadão, mas o governo. É ele quem se endivida. É que
alguém tem que comprar, do contrário o país para.
Aliás, para dizer a verdade,
em todos os países, quem mais compra é mesmo o governo; no nosso, também. Daí
que me pareceu estranho o modo solene como foi anunciado o pacote, em palácio e
com a presença de empresários e prefeitos.
Fiquei sinceramente surpreso
ao ouvir da boca do ministro Guido Mantega que o pacote consistia em comprar
coisas como retroescavadeiras, tratores, caminhões, ambulâncias, que devem ser
compras normais em qualquer governo, por meio de seus ministérios.
Mas quem comprará
retroescavadeiras, desta vez, não será o ministro, mas a própria presidente da
República. Estranho, não? Devo entender, então, que aquilo que deveria ser um
procedimento corriqueiro é agora anunciado como uma extraordinária decisão
presidencial. É isso mesmo ou sou eu que estou entendendo mal?
Título e Texto: Ferreira Gullar, Folha de São Paulo,
08-7-2012
Colaboração: Rafael Picate
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