Guilherme Fiuza
Brasil em choque: Ciro Gomes
ameaça não ser candidato a presidente ano que vem
É verdade que o momento é difícil e o país tem lidado com provações sem precedentes, mas por essa ninguém podia esperar. Os brasileiros já tiveram que aprender até a viver sem carnaval, mas sem Ciro Gomes candidato o povo fatalmente perderá o rumo de casa.
Pensa bem: quem baterá em
repórter em 2022? Quem xingará os adversários com a mais famosa incontinência
verbal da política brasileira e depois correrá para o colinho das
subcelebridades cariocas, onde boçalidade vira doçura?
Quem dirá que Lula não presta,
mas é meu amigo, mas usou o PT, mas foi usado pelo PT, mas não merecia ser
preso, mas tava preso babaca (valeu, Cid), mas é um grande líder, mas já era,
mas sei lá, votem em mim em vez do Lula, votem em mim em vez do adversário do
Lula, porque eu sou a verdadeira centro-esquerda e a verdadeira centro-direita,
enfim, eu sou o que vocês quiserem que eu seja, eu sou a terceira via de mão
dupla, que pode engrenar uma quarta, se vocês quiserem, ou até mesmo a segunda
via, com firma reconhecida, se a primeira tiver se extraviado.
Como o Brasil vai encarar 2022 sem essa clareza de propósitos que a cada quatro anos faz de Ciro Gomes seu Norte? Seu Nordeste? Seu Centro-Oeste? Seu Sudeste? Seu Sul? E também seu Sudoeste, seu Noroeste e mais que direção você quiser que ele invente, o que nunca foi problema. Um candidato que tem na ponta da língua o número que você quiser – frio ou quente, salgado ou doce, enfim, ao gosto do freguês. Como encarar uma corrida presidencial sem esse patrimônio da coerência nacional?
Analistas de mercado estão
roendo as unhas. Que cenários projetar, sem o fator Xingo Nomes? Os adivinhões
mais marrentos estão acuados como crianças assustadas. Ninguém arrisca previsão
nenhuma. Vendedores de cursos e palestrantes sabichões estão rasgando seus
MBAs. Todos terão que recomeçar do zero se essa bomba se confirmar. Não ouse
dar uma palavra sobre o futuro da Nasdaq se Ciro Gomes sair de cena. O Dow
Jones nem sabe se ainda haverá pregão. Desde o 11 de Setembro não se vê tanta
incerteza.
Mas pode piorar. Imagine se a
renúncia de Ciro Gomes ao cargo de presidenciável profissional contamina Marina
Silva?
Ok, é um cenário cruel demais,
mas agora temos que ser fortes e nos preparar para o pior. Responda com coragem
e sem evasivas: uma eleição presidencial sem Marina Silva e Ciro Gomes pode ser
considerada eleição? Eis uma dúvida jurídica que o time do TSE vai ter que
destrinchar. Pelo menos essa segurança nós temos: o TSE com toda certeza
contratará as melhores subcelebridades militantes para dizer ao público, de
forma eminentemente técnica, se eleição sem Marina Ciro é golpe, micareta ou
sonho de uma noite de verão. Nessas horas, um tribunal confiável é tudo.
Mesmo que o TSE decida pela
legitimidade de uma eleição sem a dupla de presidenciáveis mais famosa do
mundo, ainda restarão dilemas cívicos capazes de macular o processo eleitoral.
Quem vai tirar os brasileiros do SPC? Quem vai oferecer aquela salada verde de
apocalipse climático com democracia de alta intensidade – tudo envernizado por
economistas famosos e ricos que se sacrificam a cada eleição para retocar suas
biografias e aparecer como oráculos da bondade?
Como você pode notar, a
situação é muito preocupante. Vai que além de Marina Ciro, o João Amoedo também
desiste? Aí é melhor cancelar o pleito de uma vez e deixar as urnas eletrônicas
decidirem sozinhas. Como se sabe, elas têm vontade própria.
Título e Texto: Guilherme
Fiuza, Gazeta
do Povo, 7-11-2021, 16h12
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