segunda-feira, 8 de maio de 2023

O governo e o STF vão à forra

Não existem, para Lula e o Supremo, adversários políticos, diferenças legítimas de ideias nem a possibilidade de oposição. Quem não está do seu lado, ou não obedece ao que querem, tem de ser destruído

J. R. Guzzo

Câmara dos Deputados, quem diria, é hoje o maior, e talvez o único, órgão de Estado deste país onde há alguma força real, ativa e organizada em favor da liberdade e contra a tirania. Podem esperar, portanto, que seja tratada cada vez mais como um inimigo do consórcio entre Lula, o Supremo Tribunal Federal e o bloco de extremistas que governa hoje o Brasil. Não existem, para eles, adversários políticos, diferenças legítimas de ideias e a possibilidade de oposição. Quem não está do seu lado, ou não obedece ao que querem, tem de ser destruído — e é isso, exatamente, o que estão fazendo à vista de todo o mundo, com prisões ilegais, multas de 1 milhão de reais por hora e uma polícia que a cada dia fica mais parecida com a Gestapo. 

Foto: Ricardo Stuckert/PR

Mostram agora, depois da pior derrota que já sofreram na Câmara, que vão fazer mais. Queriam aprovar um projeto de censura disfarçado em “regras” para a internet. Foi um desastre; tiveram de fugir da votação, após terem exigido “urgência” para ela, quando viram que iam perder feio no plenário. Sua reação automática foi aumentar a repressão. Em vez de reconhecer a existência de opiniões diferentes e a necessidade de mais diálogo, partiram para a vingança. O primeiro a sentir foi Jair Bolsonaro. Tomaram o seu celular. Tomaram o seu passaporte. Podem, se quiserem, jogar o ex-presidente da República na cadeia, sem que ele tenha cometido crime nenhum.

É o que sempre fizeram Lula e o PT: a cada vez que têm uma contrariedade, reagem ficando mais radicais. No caso da derrota da censura, foram ainda mais longe na perseguição ilegal aos inimigos que têm feito, sem parar, desde que foram para o governo, quatro meses atrás. O Ministério da Justiça, desta vez o mais agressivo dos agentes de Lula, inventou uma multa de 1 milhão de reais por hora para punir o Google — a empresa tinha publicado um texto com críticas ao projeto de lei, e o ministro decidiu que não é permitido fazer isso. Por que não, nesse caso, uma multa de 1 trilhão de reais por minuto? Aí sim: as “big techs”, como eles aprenderam a dizer outro dia, iriam ficar morrendo de medo, não é mesmo? Trata-se, antes de tudo, de uma estupidez. 

Não existe no mundo, simplesmente, multa de 1 milhão de reais por hora, ou qualquer coisa parecida — e, seja como for, ninguém vai pagar nada. O Google, é óbvio, tirou o texto do ar, da mesma maneira que tiraria se não tivesse recebido multa nenhuma. Além de estúpido, é ilegal. A “multa” foi aplicada pelo conselho de defesa do consumidor, ou coisa que o valha, e com o apoio do conselho da livre concorrência. Nenhum dos dois é um órgão da justiça; são apenas duas repartições públicas, hoje ocupadas por militantes de esquerda, e não podem dar nem uma multa de trânsito. De mais a mais, não têm nada a ver com o caso.

Deboches da lei deste tamanho é que fazem o Brasil de Lula ir ficando com a cara de país-bandido na comunidade mundial, a cada dia que passa — mas talvez eles queiram mesmo ser algo assim, com sua obsessão em fazer parte do eixo Cuba−Rússia−China, mais as Venezuelas da vida, e romper com o “capitalismo”. Pior que isso é a miséria mental que está na base do seu pensamento — ou do que passa por “pensamento” no conjunto do governo. Onde está escrito, em qualquer lei em vigor no Brasil neste momento, que alguém não pode se manifestar contra um projeto que vai ser votado publicamente no Congresso, como fez o Google? Que crime poderia ser esse? 

O ministro da Justiça também decidiu, sem sentença judicial nenhuma, que o Google tinha de publicar uma postagem a favor da lei da censura. É isso mesmo — não apenas foi proibido de falar contra, mas ficou obrigado a falar a favor. De novo: como, fora de uma ditadura, alguém pode ser forçado a dizer o contrário do que pensa? Uma violência dessas só tem similar nas “confissões espontâneas” de culpa que os perseguidos pela ditadura de Stalin faziam na Rússia comunista, ou no sanatório geral da tirania de Mao Tsé-tung na China.

Quando quis se justificar, o ministro deu uma aula magna de ignorância. Disse que “publicidade” contrária tem de ser compensada com “publicidade” favorável — algo que só acontece, se tem de acontecer em algum caso, por decisão de sentença judicial, frequentemente após anos e anos de discussão. Desde quando o Ministério da Justiça passou a fazer parte do poder judiciário? No governo Lula? O ministério é um órgão da administração federal, apenas isso — não tem, e nunca teve, o poder de julgar sequer uma ação de despejo. Para transformar o péssimo em mais péssimo, a impressão é que o ministro não sabe qual é a diferença entre publicidade e um conjunto de palavras que expressam um ponto de vista, ou transmitem informações. Publicidade é propaganda — é uma ação comercial, que se destina a vender alguma coisa, e por isso qualquer publicação com um mínimo de seriedade faz questão de distinguir, com o máximo de clareza possível, o que é material pago e o que é conteúdo editorial naquilo que leva ao público. Para o ministro, tudo o que está escrito é “publicidade”. 

Eis aí o componente que não muda nunca, nessa história toda da lei da censura e da derrota do governo: falsificação em cima de falsificação, uma atrás da outra, e um ataque permanente às liberdades públicas, aos direitos individuais e às noções elementares de democracia. Talvez nada resuma melhor a marcha do governo Lula rumo à ditadura do que as palavras usadas oficialmente pelo PT para descrever as críticas feitas ao projeto da censura por parte das plataformas de comunicação social: “Ações criminosas”. Aí estamos, sem disfarce algum — para a esquerda brasileira, discordar do governo Lula é um crime.

Só na propaganda de TV para comemorar as “realizações” dos primeiros 100 dias de governo, gastaram 30 milhões de reais. Entende-se, assim, que os chamados “grandes veículos” tenham ficado a favor, e não contra, a lei da censura

Tanto quanto Lula e os extremistas que controlam suas decisões e os atos do seu governo, e frequentemente com mais resultados objetivos, o STF joga o mesmo jogo escuro. A derrota da lei da censura levou a represálias imediatas do Supremo, com mais uma ameaça clara ao Congresso — vocês podem votar o que quiserem, mas quem manda aqui somos nós. Vamos anular as leis que vocês aprovaram, como a do imposto sindical. Vamos continuar proibindo deputados de utilizarem a internet. Vamos executar a censura que vocês se negaram a aprovar. Vamos continuar aplicando multas de 22 milhões de reais a quem entrar aqui com alguma petição incômoda. Vamos continuar prendendo gente — e até vocês mesmos. Por que não? 

Já prendemos um deputado federal, por nove meses, e não aconteceu nada; aliás, ele está preso outra vez. Estão achando que não pode acontecer de novo? Estão achando que o presidente da Câmara vai defender vocês? E o do Senado, então? Um diz: “Sim senhor”. O outro diz: “Sim senhor, mais alguma coisa?” Falta muita gente para prender. Falta muita gente para multar. Perderam, manés. 

O ministro Alexandre Moraes — que há quase quatro meses mantém nos cárceres do STF o ex-secretário de Segurança de Brasília, um homem com sérios problemas de saúde, sem apresentar até agora motivos legais mínimos para a sua manutenção em prisão fechada — foi o primeiro a reagir, após o fiasco da lei da censura na Câmara. Ele já tinha ordenado que os presidentes de diversas empresas que operam na internet prestassem “depoimentos” para “explicar” as postagens que fizeram com críticas ao projeto do governo; como o PT, acha que dar esse tipo de opinião exige “explicações”. Baseou sua decisão em “estudos” de uma universidade do Rio de Janeiro — no caso, um grupo de militantes declarados de esquerda. “Estudos?” Como assim? Desde quando “estudos” universitários são ciência, ou prova de alguma coisa? 

No dia seguinte à decisão da Câmara deu despachos ainda mais dramáticos. Mandou a Polícia Federal fazer uma operação de busca e apreensão na casa do ex-presidente Jair Bolsonaro; ao que parece, estão atrás do seu atestado de vacina, e os dos seus familiares. Tentou apreender o passaporte do ex-presidente, contra o qual não existe nenhuma acusação na justiça, como se fosse um criminoso prestes a fugir do Brasil — justo ele, que acaba de voltar ao país. E apreendeu o seu telefone celular. Não faz o menor sentido, nem uma coisa e nem outra. É apenas um ato flagrante de perseguição política ao estilo praticado na Rússia pela KGB; não há nenhuma possibilidade de se dar uma justificativa legal para nada disso.

Dentro do mesmo frenesi policial, o ministro prendeu o tenente-coronel Mauro Cid [foto], ex-assessor pessoal de Bolsonaro, por uma maçaroca de suspeitas absolutamente vagas a respeito do que seria uma espécie de complô nacional e internacional contra a vacina da covid, ou coisa parecida. Mesmo que houvesse alguma base para se desconfiar da existência de um negócio desses, não há como justificar a prisão — qualquer traficante de drogas, homicida ou estuprador neste país, com um advogado razoável, fica em liberdade durante as investigações dos crimes de que é acusado. 

Qual o perigo que o tenente-coronel (ou o ex-secretário de Brasília) representa para a sociedade brasileira? 

As anotações da Polícia Federal a respeito do caso são ainda mais perturbadoras. “O objetivo do grupo”, dizem os policiais, era “manter coeso o elemento identitário em relação a suas pautas ideológicas” e “sustentar o discurso voltado aos ataques à vacina contra a covid”. Parece escrito por um diretório do PT, ou num comissariado de ditadura — e, mais do que tudo, por que seria um crime ter uma “pauta ideológica”, ou não aprovar a vacina? Se os próprios laboratórios farmacêuticos fazem alerta em cima de alerta sobre as limitações e outros aspectos negativos da vacina anticovid, como explicar que alguém seja preso por suspeitas obscuras de ter sido, talvez, um crítico da vacina? 

Lula e o STF vão adiante, seguros, porque sabem que têm o apoio de muita gente. O primeiro é o das Forças Armadas; é melhor que os deputados contrários ao projeto da censura fiquem longe das calçadas em frente aos quartéis. Sabe-se bem o que aconteceu na última vez em que houve gente por lá, na esperança de obter apoio e consolo. 

Oficiais do Exército Brasileiro mentiram para cidadãos que estavam diante do QG de Brasília, em manifestação legal e pacífica no dia 8 de janeiro — e a 8 quilômetros de distância dos incidentes na Praça dos Três Poderes. 

Conduziram pessoas inocentes para dentro de ônibus, com a promessa que estavam sendo levados para “lugar seguro” — e entregaram todos no campo de concentração da polícia a serviço do STF. 

Lula e o Supremo também contam, há muito tempo, com o apoio da maior parte da mídia e, agora, para facilitar o serviço, com o Tesouro Nacional — só na propaganda de TV para comemorar as “realizações” dos primeiros 100 dias de governo, gastaram 30 milhões de reais. Entende-se, assim, que os chamados “grandes veículos” tenham ficado a favor, e não contra, a lei da censura — um momento realmente prodigioso na história da imprensa nacional. O projeto Lula-STF também desfruta dos aplausos da “sociedade civil” — as OAB que andam por aí, e mais um caminhão de similares. Se a sociedade militar já está assim, imagine-se, então, a sociedade civil. É melhor nem fazer as contas.

Título e Texto: J. R. Guzzo, Revista Oeste, nº 163, 5-5-2023

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