Humberto Pinho da Silva
Quando era adolescente e andava na escola, meus pais, muitas vezes, diziam-me: "Estuda, para vires a ser alguém!" Mas eu não entendia bem o que era ser "alguém".
Envelheci, passei sarilhos e cadilhos, meditei e
observei a vida, não com olhos de quem a vive, mas como mero espectador, e
conclui: ser "alguém", para muitos, é entrar numa Faculdade. Obter
licenciatura. Alcançar cargo de relevo e auferir milhões.
Entra-se na escola não para se instruir e adquirir
cultura, que possa servir a sociedade, mas para se sobreviver nesse mar
encapelado, que é a coletividade e, se possível, vir a ser… "Alguém".
Logo que se dá os incipientes passos, pretende-se
que o menino seja o melhor e superior aos condiscípulos da escolinha. Assim se
inicia, na escola, a ser "alguém".
Se, por infelicidade, fraqueza de memória ou
estranha psicose, fracassa, começa a ser… "Ninguém".
No correr dos anos o "Alguém" forma-se, obtêm o pomposo título de "doutor", não para servir, mas para ser servido. Alguns, ainda alimentam o desejo (sádico?) de mandarem e humilharem os "Ninguém" Há, felizmente, muitas honrosas exceções.
Outros, não obtendo o grau académico, mas por
herdarem sobrenome ou título nobiliárquico, julgam-se superiores, e portam-se,
igualmente, como alguns doutores.
O velho Conde de Campo Belo, Homem de grande
cultura, que tertuliava no Café Ceuta (Porto) aconselhava, deste modo, o filho,
estudante universitário: "Lembra-te que a fidalguia não traz privilégios,
mas sim, obrigações".
Obrigações, bem pesadas, de levar vida honrada e
conduta exemplar, respeitando, desse modo, a memória de ilustres antepassados.
D. João de Castro, recomendava ao filho ao
enviá-lo em socorro a Dio: "Fazei por merecer o apelido que herdaste,
recordando-vos que o nascimento em todos é igual, as obras fazem os homens
diferentes".
Ninguém, de bom senso, se deve considerar
superior: pelo apelido, pelo grau académico ou pelo título de nobreza ou ainda
pelos bens que possui. Todos nascemos do mesmo modo e parecemos da mesma forma.
Todos precisamos uns dos outros, e com o rodar dos
anos, após a morte, todos se igualam. Todos se tornam desconhecidos, até para
os descendentes, passam a ser meros antepassados, sem nome, como disse Cecília
Meireles.
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva,
maio de 2023
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