Colunista da Folha foi atacado por profissionais de imprensa que trabalham no jornal depois de escrever artigo sobre racismo
Cristyan Costa
O antropólogo Antonio Risério [foto] recebeu o apoio de 780 pessoas nesta sexta-feira, 21, depois de ser atacado por jornalistas da Folha de S.Paulo. Os profissionais de imprensa do jornal redigiram uma carta contra Riserio após o antropólogo publicar um artigo sobre racismo reverso.
“Antonio Risério é, no
momento, uma das vozes mais importantes do país, sobretudo por fazer oposição a
uma ideologia intolerante e autoritária”, informaram os apoiadores de Riserio,
no abaixo-assinado. “Manifestamo-nos com um apelo para que sua livre expressão
seja respeitada.”
Adiante, os signatários do
documento ressaltam as habilidades do escritor: “Risério, que escreve há
décadas sobre o assunto, divulga pesquisas a respeito de personalidades reais
da história brasileira que complexificam o modo como entendemos as relações
sociais da época da escravidão”.
A carta a favor de Risério
salienta que o antropólogo provoca um “mal-estar absolutamente necessário” para
que os identitários, relativistas e revanchistas saibam que a oposição existe e
não será dobrada. Entre os que assinam o documento estão Josias Teófilo,
cineasta, e o jornalista Leandro Narloch.
Título e Texto: Cristyan Costa, revista Oeste, 21-1-2022, 12h21
Leia a Carta Aberta de Apoio a
Antonio Risério e Oposição ao Identitarismo, na íntegra:
“Nos últimos quatro meses, o antropólogo baiano Antonio Risério foi alvo de duas reações de parte da classe intelectual nacional por suas obras sobre raça. Em setembro de 2021, seu livro As Sinhás Pretas da Bahia: Suas Escravas, Suas Joias foi resenhado por Leandro Narloch. A resenha atraiu não apenas críticas, mas chamados pela demissão de Narloch, a quem muitos atribuíram o conteúdo do livro. Não há, ao contrário do que dizem esses críticos, nenhum delito moral no livro ou em sua resenha: Risério, que escreve há décadas sobre o assunto, divulga pesquisas a respeito de personalidades reais da história brasileira que complexificam o modo como entendemos as relações sociais da época da escravidão.
Nos escritos de Risério, que é
um dos melhores leitores vivos da nossa cultura, está claro que ele considera a
escravidão uma instituição moralmente repugnante, e que ele busca entender como
seres humanos que não são monstros poderiam ter convivido com ela no passado. É
preciso fôlego para entender como ex-escravos se tornavam senhores de escravos.
Risério tem esse fôlego; seus canceladores, não.
Na segunda polêmica, Risério
publicou na Folha de S. Paulo um artigo a respeito da
universalidade do erro moral que é o racismo, documentando casos em que negros
foram, sim, racistas. Falamos “racismo” segundo a definição clássica, do senso
comum e do bom senso, registrada em dicionários. Um dos projetos intelectuais
do autor, a oposição ao pós-modernismo e à teoria crítica, que fundaram o
identitarismo, o leva a essa condenação. Os identitários querem alterar à
força, unilateralmente e sem consultar os falantes da língua, a definição de
“racismo” de forma a fazê-lo unidirecional e maleável a seus interesses,
alegando que é “relação de poder”.
Esta disputa vai além de uma
mera querela semântica a respeito da definição de uma palavra. É um ataque novo
ao tratamento igual dos indivíduos perante as normas sociais que herdamos do
consenso pós-guerra que nos deu uma Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Risério é uma voz experiente do segundo campo, suas preocupações são mais que
justificadas, e nos posicionamos firmemente contra tentativas de censurá-lo.
O mal-estar que Risério causa
é absolutamente necessário para que os identitários, anti-universalistas,
relativistas e revanchistas saibam que a oposição existe e não será dobrada,
não importa quantas grandes empresas tenham ao seu lado em sua cruzada pela
desigualdade moral. Não se trata de colecionar casos em que negros foram
senhores de escravos ou cometeram racismo contra pessoas não-negras: trata-se
de reafirmar que ninguém é inerentemente bom ou mau por causa da cor, então
ninguém tem carta branca para desumanizar ninguém.
Antonio Risério é no momento
uma das vozes mais importantes do país, sobretudo por fazer oposição a uma
ideologia intolerante e autoritária. Manifestamo-nos com um apelo para que sua
livre expressão seja respeitada.”
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