Tensões na Ucrânia e incertezas no Brasil
puxarão índices
Wellton Máximo
A tempestade que parecia ter ficado para trás ganhou novos capítulos em 2022. Pelo menos no início do ano, a inflação continuará pressionada por uma combinação de fatores domésticos e externos, segundo especialistas e o próprio Banco Central (BC).
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil |
Tensões geopolíticas
internacionais, como a ameaça de conflito militar entre Rússia e Ucrânia, e
fatores internos, como problemas climáticos e as incertezas políticas deste
ano, puxarão os índices de preços pelo menos no primeiro trimestre.
Em parte, o fenômeno da
inflação tem origem externa e aflige inclusive países desenvolvidos. Nos
Estados Unidos, a inflação ao consumidor atingiu 7% em 2021, o nível mais alto
desde 1982.
Na zona do euro, a inflação
chegou a 5%, alcançando o maior valor desde a criação da moeda única no
continente europeu. Esse cenário ocorreu mesmo com o desemprego elevado em
vários países.
A reabertura das economias
após a fase mais aguda das restrições sociais provocada pela pandemia fez o
preço internacional do barril de petróleo subir para US$ 80, quatro vezes acima
do que na fase mais aguda da pandemia, quando a cotação chegou a cair para US$
19.
O problema não ocorreu apenas
com o petróleo. Fontes de energia como carvão e urânio também ficaram mais
caras.
As tensões entre Rússia e
Ucrânia e um bombardeio a caminhões de combustível nos Emirados Árabes Unidos,
perpetrado por rebeldes financiados pelo Irã, agravaram a situação.
Com o barril caminhando para US$ 90, a Petrobras anunciou o primeiro aumento de combustíveis em três meses. O reajuste terá impacto no bolso dos brasileiros nas próximas semanas, com a decisão dos governadores de descongelar o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre os combustíveis.
Outro fator que pressionou a
inflação mundialmente foi o gargalo nas cadeias de produção após a reabertura
da economia em diversos países. Além do aumento da demanda global, a política
de lockdowns em zonas industriais e portuárias da China para conter o avanço da
covid-19 provocou escassez de insumos e de mercadorias importadas.
Produtos industrializados
passaram a ficar mais caros, com filas de duas a três semanas em vários portos
para descarregar mercadorias. Os fretes quadruplicaram ou quintuplicaram,
dependendo do produto.
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Banco
Central
O próprio presidente do Banco
Central, Roberto Campos Neto, reconheceu recentemente os desafios para a
segurar a inflação no início de 2022. Na semana passada, ele admitiu que a seca
no Sul e as enchentes em Minas Gerais e no Nordeste estão afetando a inflação
no início de ano.
“A inflação em 12 meses no
Brasil está perto do pico, mas ainda vemos aumento de preços do petróleo e
altas provocadas por problemas climáticos. Regiões do país com muita chuva ou
seca já tiveram a colheita prejudicada, e isso já afeta o preço da comida”,
disse Campos Neto num evento virtual promovido por um banco.
Para o presidente do BC, a
crise energética global e a desvalorização do real estão contribuindo para que
o Brasil importe inflação de outros países. “Se imaginarmos que a inflação
energética do Brasil estivesse na média dos demais países, a inflação total do
Brasil seria menor que a dos Estados Unidos”, comparou.
Depois de alcançar 10,06% em
2021, o maior nível desde 2015, a inflação oficial pelo Índice Nacional de
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deverá cair pela metade neste ano, mas
permanecerá acima do teto da meta.
Segundo o boletim Focus,
pesquisa com instituições financeiras divulgadas toda semana pelo Banco Central
(BC), a inflação deverá ficar em 5,15% neste ano.
Para 2022, o Conselho
Monetário Nacional (CMN) fixou uma meta de inflação de 3,5%, com margem de
tolerância de 1,5 ponto percentual. O indicador terá de ficar entre 2% e 5%,
para o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, não ser obrigado
a escrever uma carta justificando o estouro da meta, como ocorreu com a
inflação de 2021.
No documento, Campos Neto
disse que a pandemia de covid-19 e a crise hídrica, que diminuiu o nível dos
reservatórios, foram os principais fatores que impulsionaram a inflação no ano
passado. Ele também atribuiu o repique nos preços ao aumento no preço de várias
commodities (bens primários com cotação internacional).
Mesmo com as pressões
internacionais, existem peculiaridades na economia brasileira que influenciam a
inflação. No ano passado, a seca no centro-sul provocou a quebra de safras como
a de milho e cana-de açúcar.
Usado na alimentação de gado,
o milho teve impacto no preço da carne. A redução da colheita de cana afetou o
preço da gasolina, que contém 27% de etanol na composição. O inverno forte em
2021 provocou geadas que queimaram plantações de café. O grão acumula alta de
46% nos últimos seis meses.
Incertezas
O professor de Economia do
Ibmec, Gilberto Braga, aponta outro fator que complicará a inflação neste ano:
a incerteza política e as pressões para aumento de gastos em ano de eleições.
Para ele, a imprevisibilidade gerada pelo processo eleitoral pressionará os
preços, à medida que inibirá investimentos do setor produtivo:
“Acho que a inflação é uma
combinação de fatores internos e externos. Os fatores externos certamente
contribuem, mas os fatores internos são mais relevantes no momento. O fato de
este ser um ano eleitoral aumenta a pressão por mais gastos públicos, diversas
categorias de servidores públicos estão pressionando por reajustes, sem contar
que o Ministério da Economia cedeu parte da gestão do Orçamento à Casa Civil.
Isso gera uma imprevisibilidade que atrasa investimentos, a geração de empregos
e desestimula o empreendedorismo”.
Segundo Braga, a inflação deve
cair por causa dos aumentos de juros promovidos pelo Banco Central, mas isso só
ocorrerá no segundo trimestre. “A inflação deve cair por causa de respostas aos
juros mais altos ainda esperados para o início de 2022. Os índices devem
começar a cair no meio do ano, mas se mantendo em torno de 5% anualizados,
acima do teto da meta”, estima o professor de economia.
Título e Texto: Wellton
Máximo; Edição: Denise Griesinger – Agência Brasil, 26-1-2022, 7h03
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