sábado, 25 de setembro de 2021

Feito para dar errado

O método de Paulo Freire, na verdade, não é uma proposta de ensino — é um manifesto político do começo ao fim

J. R. Guzzo

Foto: Acervo IPF/Divulgação

A esquerda nacional tentou com grande empenho nos últimos dias, embora com bem pouco sucesso de público, ressuscitar para o Brasil de 2021 um desses ídolos culturais, mais um, que ela fabrica regularmente de tempos em tempos e exige que sejam venerados pelo país inteiro como se fossem os Doze Apóstolos, ou a Santíssima Trindade, ou ambos ao mesmo tempo. Nunca importa, realmente, o que o sujeito fez — sua obra, seu talento ou os resultados concretos da sua atividade. Só interessa, para os agentes culturais do “campo progressista”, a devoção à figura escolhida para o papel de santo. É como na religião, e como em quase tudo o que a esquerda promove. Não pergunte nada; ajoelhe-se e reze. Nessa balada, vão socando em cima do público, com embalagem de herói, as figuras criadas por sua imaginação. A levar a sério o que sai na mídia, nas classes intelectuais e nos “projetos de luta” de ONGs à caça de verbas, são grandes vultos da nossa história. Vai ver de perto e é tudo uísque paraguaio.

Em nenhum momento ficou claro por que, em termos práticos, ele deveria ser louvado

Você está cansado de saber quem são eles todos, pois os comandantes da nossa cultura vêm enfiando o nome de cada um na sua cabeça desde o curso primário — Oscar Niemeyer, o geógrafo Milton Santos, Zumbi dos Palmares e mais do mesmo. Na ofensiva feita agora, o escolhido foi o professor Paulo Freire; decidiram que o Brasil todo teria de prestar homenagem a ele pelo centenário do seu nascimento. O retratinho de Freire apareceu na página de abertura do Google. Uma juíza do Rio de Janeiro proibiu que fossem feitos “atentados contra a dignidade” do professor — pelo que deu para entender, é ilegal discordar do seu “método” de educação, embora a Constituição Federal permita, ao que parece, a exposição de mais de uma ideia sobre o tema. Os “formadores de opinião” lotaram as redes sociais e as mesas-redondas de televisão com uma maciça ofensiva de cânticos em louvor a Freire. Em nenhum momento ficou claro por que, em termos práticos, ele deveria ser louvado — o que, no fim das contas, o homem fez de útil para a educação brasileira, ou para qualquer outra coisa? Nada que alguém tenha conseguido saber até hoje. Mas, como acontece com todos os heróis da esquerda nacional, isso é um detalhezinho à toa; basta dizer que o sujeito é um dos educadores “mais importantes” do país, e mesmo do mundo, e pronto. Importante por quê? Não interessa.

Paulo Freire, segundo o evangelho da esquerda brasileira, é um educador essencial para a alfabetização e para os demais campos da atividade didática neste país. De acordo com os nossos arquiduques culturais, ele criou um “método” de educação — o “método Paulo Freire”, que, por aquilo que nos dizem, é o mais decisivo avanço da cultura humana desde a invenção da escrita. Quando se olha a coisa de perto, porém, não é nada disso. O método de Freire, na verdade, não é uma proposta de ensino — é um manifesto político do começo ao fim. Não se destina, não para valer, a transmitir aos estudantes, de alguma forma mais eficiente que outras, conhecimentos de português básico, de ciência ou das quatro operações matemáticas; serve apenas para socar na cabeça das crianças e adolescentes as crenças políticas do autor. 

Não é preciso ser nenhum Sherlock Homes para descobrir, em 30 segundos, que crenças são essas — as que pregam um mundo coletivista, com o Estado mandando em tudo, e mais todo o bonde das invenções tidas como “socialistas” ou “comunistas”. Os professores, por essa visão, não têm de ensinar nada; devem ser “agentes de transformação política”. O “método Paulo Freire” não se destina a ensinar os alunos a ler, escrever ou contar. Seu objetivo é formar servidores obedientes à “ditadura popular-proletária-camponesa”, etc. que existe no mundo mental e nos desejos do autor. É um mundo em que Che Guevara é citado como “exemplo de amor” e a família é descrita como um sistema de “opressão”.

Paulo Freire não faz parte das possibilidades de solução para problema algum

O “método Paulo Freire” jamais foi adotado por nenhum país desenvolvido, ou que tenha um mínimo de sucesso no seu sistema educacional. Serve para um país pobre, então? Menos ainda — com esses é que não funciona mesmo. É muito significativo que o Brasil, um dos países mais atrasados do mundo em sua educação pública, seja também o que concentra o maior número, ou a quase totalidade, dos admiradores do método. (É claro que todos eles, através dos sindicatos de professores, foram os defensores mais extremados do fechamento das escolas brasileiras durante mais de um ano, por conta da covid. Querem o “método Paulo Freire”. Mas não querem dar aula.) O fato, no fim de todas as contas, é que se trata de um mecanismo desenhado, nos seus mínimos detalhes, para dar errado a cada vez que alguém tenta aplicar alguma coisa que se prescreve ali. Freire chamava suas propostas de “pedagogia do oprimido”. Com certeza, na vida como ela é, tornou-se a pedagogia do fracasso. Como diria Theodore Dalrymple: se dessem a Paulo Freire, ou aos educadores brasileiros de esquerda, a administração do Oceano Pacífico, no dia seguinte já iria estar faltando água salgada no mundo.

Como em todos os casos dessa família, o grande ou o único argumento de defesa do universo intelectual brasileiro é dizer que fulano ou sicrano “desfrutam de reconhecimento internacional”. E daí? Nada é mais barato, hoje em dia, do que ter reconhecimento internacional. O único argumento que realmente interessa em toda essa discussão são os resultados concretos — e os resultados concretos do “método” são um triplo zero. Paulo Freire não faz parte das possibilidades de solução para problema algum. Faz parte, isso sim, da tragédia permanente da educação no Brasil.

Título e Texto: J. R. Guzzo, revista OESTE, nº 79, 24-9-2021

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